'Para nossa alegria': Ramires promete até clipe se conquistar a Champions
Eufórico por gol contra o Barça, volante do Chelsea diz que ficha ainda não caiu, comemora elogios de Mano e brinca sobre vídeo de 'sósia' na internet
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- Foi algo que me deixou mais tranquilo. Me perguntavam muito o que tinha acontecido e eu sempre falava a mesma coisa, que não tinha acontecido nada. Foi bom que ele explicou, deixou tudo claro. Não tenho nem mais o que dizer, ele falou tudo.
- Se acontecer, até eu faço o clipe.
Confira toda a entrevista com Ramires:
GLOBOESPORTE.COM: Você deve ter visto na internet as brincadeiras que fazem com você e o cantor do vídeo “Para nossa alegria”, que virou febre no Brasil. Aprova? Acha parecido?
Eu vi, mas parecido eu não acho, não (risos). Até falei com minha esposa que pegaram uma foto minha lá do Benfica, de cabelo grande, todo mal cuidado (risos). Mas eu acho legal, é uma brincadeira válida. Há várias outras piadas na internet. Eu vejo o vídeo e fico dando muita risada. Para nossa alegria, vamos ganhar a Champions. Se acontecer, até eu faço o clipe. Se é para divertir, está tranquilo. O que eu só não gosto é a falta de respeito, alguns comentários de mau gosto que já vi, tanto comigo quanto com o garoto. Meio racistas. Não há espaço para isso.
Você já sofreu algum caso de racismo em campo?
Em Portugal, alguns torcedores já fizeram som de macaco, mas não todos. No Brasil, é mais difícil, somos muito misturados. Aqui fora, foram atos isolados e de torcida. Em campo, eu só vivi isso uma vez e, por incrível que pareça, no Cruzeiro. E o cara que falou para mim era negro também. É uma coisa que nos deixa indignados. Logo depois, fiz um gol e ele era zagueiro. Dei a resposta em campo.
Já caiu a ficha da grandiosidade do que você fez no Camp Nou?
Como eu falei após o jogo, fomos lá para tentar fazer história. E conseguimos. Jogando com 10 homens, contra o melhor time do mundo, e todos nós entramos para história. Eu fui premiado com aquele gol, que foi um golaço. Dois dias depois, a ficha ainda não caiu. Aos poucos que vou vendo que realmente passamos, estamos na final. Agora que está caindo também que estou fora (suspenso). À medida que a final vai se aproximando, tudo isso vai ficando mais forte. Só no dia mesmo que vou parar e ver: “Poxa, estou fora”.
Após o jogo contra o Barça, os jogadores que deram entrevista foram unânimes ao falarem que seu gol foi o que fez a diferença. Como foi essa celebração entre vocês, a reação?
Comemoramos muito no vestiário, todo mundo se abraçando, vivendo aquela emoção. Nós já acreditávamos antes, mas ficou muito complicado quando Terry foi expulso. Ali vimos que as coisas podiam não acontecer bem. O Barcelona abriu 2 a 0 e, realmente, o gol saiu na hora certa. Eu fiz o gol e o juiz acabou o primeiro tempo. Estava até conversando com o Raul Meirelles e dissemos que tudo aconteceu na hora certa.
Se o primeiro tempo acaba 2 a 0 tudo seria muito mais complicado...
em Londres (Foto: Fellipe Arnold/Globoesporte.com)
Queria que você falasse também dos poucos segundos que você teve entre receber o passe do Lampard e concluir. Da onde vem a decisão, a frieza de dar o toque por cima do Valdés?
É tudo muito rápido. O passe do Lampard foi espetacular. Eu nem precisei tocar na bola para dominar, ajeitar, nada. O único toque que eu dei foi para finalizar. Quando eu olhei, vi o Valdés saindo e tinha algum defensor chegando. Se eu tento dominar para pensar, não faria o gol. Minha única opção era aquela. Acabei pegando bem e...
Muita gente comentou que foi um gol justamente com a marca do Messi nessa temporada.
É verdade. Falam muito da minha frieza e justamente por ter sido um gol como o Messi costuma fazer, dentro do estádio dele, contra ele e que o eliminou da Champions. Falam que foi o destino. Aí, entra um monte de coisa. O gol realmente foi muito bonito.
Você frisou muito após os dois jogos a questão do respeito ao Chelsea. O fato de muita gente já esperar uma final entre Real Madrid e Barcelona deu ainda mais motivação e coragem para que vocês entrassem em campo?
Mexe, mexe. Isso mexe muito com o jogador. É até engraçado olhar na cara de quem falou um monte de coisa. Disseram que íamos tomar de cinco, seis, dez, que seria um vareio. Isso mexeu muito comigo. Uma semana antes, só se ouvia isso. Eu só pensava: “Calma, não é assim”. Tínhamos nossa história. Fizemos grandes jogos contra o Napoli, contra o Benfica fora de casa. Falaram que o Benfica merecia passar, mas nós jogamos bem em Lisboa. Tudo isso vai acumulando. Sabíamos que ganhar no Camp Nou seria difícil, mas em casa não perderíamos de jeito nenhum. Toda essa história mexeu com os jogadores, vi isso no vestiário. Quando não tem muita conversa, brincadeira, cada um ouve sua música, olha na cara do outro, é porque a coisa está diferente.
E esse monte de coisa que falam sobre o estilo que vocês adotaram para enfrentar o Barça? Escreveram que era o antifutebol, injustiça, e por aí vai...
Quando você recebeu a notícia da saída do Guardiola, chegou a pensar: “Caramba, fomos responsáveis pelo fim de uma era”?
É até difícil de acreditar. Mas são ciclos, futebol é assim. Era muito tempo com o mesmo treinador, mesmos jogadores, ganharam tudo que podiam e não podiam... Acho que realmente há um limite. Saiu na hora que achou que devia, fez muito pelo clube.
Falando um pouco do seu momento individual, tudo tem dado muito certo. Casa nova, contrato novo, Chelsea em duas finais...
Estou bem feliz. Vivo a melhor fase da minha carreira. Ampliei meu contrato por mais três anos, tenho suporte, tenho o carinho da torcida, do clube, o respeito... Isso tudo é muito importante.
Sua renovação aconteceu um dia após a saída do André Villas-Boas, que sempre apostou muito em você. Esse reconhecimento te deu mais tranquilidade para alcançar essa boa fase?
O próprio André foi muito importante nisso. Ele pediu bastante para que o clube renovasse comigo, até para segurar, pois depois podia ficar mais difícil. Acabou que foi bom para todo mundo. Renovaram, estou jogando bem e se não fosse assim tudo poderia ficar mais complicado agora. Fiquei triste pela saída do André, mas foi um cara que colaborou muito para tudo isso.
O Di Matteo trabalhava com ele, então tudo faz parte do mesmo trabalho. Estávamos em uma fase tão ruim, que tudo dava errado. Jogador sem confiança é a pior coisa que tem. Enfrentávamos time pequeno e não tocávamos na bola, era só chutão. Nem parecia o Chelsea. Éramos dominados, ninguém queria a bola. Depois, começamos a vencer os jogos em um momento que não tínhamos opção e a confiança voltou. Contra o Napoli, por exemplo, era vencer ou vencer. Tínhamos dois campeonatos para salvar a temporada e estamos em duas finais.
Você acha que o Di Matteo está sabendo levar melhor o grupo do que ele, que chegou a colocar muito dos medalhões no banco?
O fato de alguns jogadores terem ficado no banco deixou tudo meio complicado. Ninguém gosta de ficar no banco. Com a saída do André, todo mundo voltou a querer dar uma resposta, mostrar que podia. É complicado dizer foi isso ou aquilo. Acho que foi uma fase mesmo. A alegria nos treinamentos é a mesma de antes, mas nos jogos as coisas não aconteciam.
Fala-se muito que o grupo do Chelsea é complicado de trabalhar. O próprio Felipão, logo após a saída do André, falou que só quem vive o clube sabe o que realmente acontece. Há realmente problemas, panela?
É a mesma coisa de eu sair do clube amanhã e querer falar um monte de coisa. Por que não falam quando estão aqui? São coisas que só vêm para complicar. Toda vez que acontece algum problema, é a mesma história. Dentro do clube, todo mundo se fala. Futebol é fogo, em qualquer lugar é a mesma coisa: o cara vai, joga, faz o que tem que fazer, mas há quem não se goste, não se fale, é normal em todo ambiente de trabalho. O problema é que o Chelsea foi rotulado dessa forma e sempre falam a mesma coisa. Agora, que estamos bem, ninguém fala nada, mas deixa entrar em crise, perder...
E a vida em Londres? Você se mudou recentemente, já está na cidade há quase dois anos. Está completamente adaptado?
O clima eu já estou adaptado. Na verdade, é difícil falar disso. Quando esfria mesmo, não dá para falar em adaptação (risos). Sai de chinelo na neve para você ver... (risos). Mas estamos se ajeitando. Trocamos apartamento por casa, meu filho está crescendo, precisa de mais espaço. As coisas estão caminhando muito bem profissional e pessoalmente.
Já fala o idioma bem? Está mais seguro? Soube que você está fazendo aula...
(Foto: Fellipe Arnold / Globoesporte.com)
Mudando de assunto, o Mano Menezes falou recentemente que você é um cara que não precisa ser testado para Seleção. Depois de tanto tempo sem ser convocado, isso te tranquilizou?
Para mim, foi ótimo isso. Foi algo que me deixou mais tranquilo. Me perguntavam muito o que tinha acontecido e eu sempre falava a mesma coisa, que não tinha acontecido nada. Foi bom que ele explicou, deixou tudo claro. Não tenho nem mais o que dizer, ele falou tudo.
Mesmo tendo uma Copa do Mundo no currículo, esse momento atual é o ápice da sua carreira?
Com certeza. Se conseguir o título da Champions então, só vencer uma Copa do Mundo para superar. Jogar no Chelsea já é difícil, ainda mais ser destaque em um time com tantas estrelas, ser bem falado, estar em evidência. É um momento bem bacana, um ano que vai ficar muito marcado. Para fechar com chave de ouro, só faltam os títulos e a volta para Seleção.
Você disse que lembra muito os momentos do jogo com o Barça. Tudo isso que tem acontecido na sua carreira te faz voltar também no tempo, desde Barra do Piraí até hoje?
É algo que sempre aconteceu comigo. Desde quando fui campeão mineiro com o Cruzeiro, depois português no Benfica, tudo que tem acontecido agora. Eu paro e penso em como tudo foi rápido, tudo aconteceu em apenas sete anos. Minha história profissional é bem bonita. Em 2004, no meio do ano, eu estava lá na minha cidade, descalço, jogando bola com a molecada, e agora estou aqui, em uma final de Champions. É um filme que passa na minha cabeça a cada conquista (veja abaixo a jogada para o gol de Drogba no Chelsea 1 x 0 Barcelona).
Como que foi essa trajetória de Piraí até o Chelsea? Qual foi o momento mais difícil?
Hoje em dia, 17 anos já é uma idade avançada para começar no futebol. Você pensou em desistir?
Quando fui para o Joinville, já estava trabalhando. Era servente de pedreiro, às vezes aparecia alguma coisa para capinar... Tinha que ganhar um dinheiro para ajudar. Minha avó tinha falecido e meu irmão ajudava no gás, meu tio pagava a luz, era tudo dividido. Eu tinha que ajudar. Meu irmão comprava roupa para nós dois. Ele é mais forte que eu e comprava roupa pequena para eu usar, ficava tudo apertado nele. Meu irmão foi praticamente meu pai. Quando ele ia ver meus jogos e eu o via na arquibancada, queria fazer de tudo para ele ter orgulho.
Você já falou algumas vezes da sua avó Tereza, como era a relação de vocês? Você pensa muito nela em momentos como o que tem vivido agora?
Já falei com minha esposa: “Quem eu queria que estivesse aqui, agora, vendo tudo isso era minha avó”. Ver esse sucesso todo, a vida que posso dar para minha família... Queria que ela curtisse um pouquinho disso, até pelo que passamos juntos. Minha esposa disse que onde quer que esteja ela está vendo tudo, mas eu a queria aqui. Ela foi minha mãe praticamente. Me educou, me criou... Meus Deus, vó Teresa era tudo! Ela teve derrame, parou o lado esquerdo, não conseguiu se recuperar e eu que cuidei dela. Tinha que trocar fralda, dar atenção. Eu estudava de manhã e voltava correndo para ajudá-la. Já ia para escola preocupado com isso. Lembro que quando minha avó faleceu eu estava sonhando justamente com ela. Acordei e só escutei meus tios com cuidado falando: “A mãe faleceu”. Levantei, fui para sala e todo mundo ficou espantado. Eu desabei. Tinha perdido o chão. Mesmo ela de cama, éramos muito próximos. Tudo que ela pedisse, eu fazia. Às vezes, ela só chamava para brincar, para me ver por perto. Minha infância toda, ela cuidou de mim. Então, eu tinha que fazer aquilo por ela, retribuir, mostrar meu amor.
Tanta dedicação que você mostra em campo vem desse exemplo de luta que ela te deu?
Com certeza. Quando você nasce em um bairro mais pobre, tem vários caminhos para seguir. Os mais fáceis são das drogas, prostituição... Eu tinha essas opções, mas não foi assim que fui criado. Tive uma educação, mesmo sendo de família humilde. Aprendi que se quero uma coisa, tenho que trabalhar para conseguir. Se não tiver dinheiro, jamais vou roubar para ter. Foi assim que ela me ensinou. Se tem, tem. Se não tem, não tem. E assim vou levando. É a lição que vou passar para meu filho. Ter simplicidade e humildade é o caminho. Sempre vou lembrar minhas origens.
Voltando a falar da Champions, já apontam o Bayern como favorito por jogar em casa, mas vocês já provaram que duvidar do Chelsea não é muito prudente, né?
Pois é, mas é até bom não apostarem muito na gente. Se for para vencer assim, podem falar o que quiserem. É questão de respeito. Isso deixa o jogador mais mordido. Vamos respeitar o Bayern e esperamos o mesmo. Eliminamos grandes adversários e estamos na final por merecimento. Vamos com cuidado e pé no chão.
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