Em nome do amor, Cicinho supera problemas com o alcoolismo
Lateral do Sport fala sobre a dependência que atrapalhou sua carreira e diz ter encontrado o caminho da 'cura' na fé e no amor pela mulher, Marri
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Em menos de seis anos, o garoto revelado pelo Botafogo-SP chegava ao estrelato: titular da Seleção Brasileira e do 'galático' Real Madrid. A trajetória vencedora agiu como uma cortina escondendo os problemas que perseguiram o jogador até pouco: o alcoolismo. Vício que fez Cicinho pensar em largar o futebol.
- Eu me deixei levar pela fama, o sucesso. Deixei o dinheiro subir para minha cabeça e me achava capaz de tudo. Passei dos limites.
Babilônia mineira
Do Botafogo-SP, Cicinho se transferiu para o Atlético-MG, onde chegou com a missão de substituir Mancini. Foi bem em campo, mas vacilou fora dele, e acabou sendo emprestado ao Botafogo-RJ.
- Eu só queria andar com os jogadores mais velhos e me lembro que o presidente (Alexandre Kalil) me dizia: "Vai sair com os mais velhos? Garoto,se liga senão eu vou colocar você para fora."
A mudança para Belo Horizonte trouxe um turbilhão de novidades à vida de Cicinho.
A popularidade e o dinheiro deram ao jogador o falso poder de achar que era capaz de tudo.
- Eu ganhava R$ 800 no Botafogo-SP e fui para o Atlético-MG para ganhar R$ 7.800.
Achava que estava rico, pegava R$ 1.000 e mandava para os meus pais. E o resto do dinheiro eu torrava em balada e festa.
No clube mineiro, também teve problemas com o então técnico Levir Culpi. Depois de uma passagem apagada pelo Botafogo, voltou ao Galo e reencontrou o bom futebol. Mas após uma briga na Justiça com o clube mineiro, se transferiu para o São Paulo.
Do Tricolor à amarelinha
No São Paulo, Cicinho brilhou. Conquistou o Paulista, a Libertadores e o Mundial, em 2005. O tricolor foi uma ponte para a Seleção, onde foi campeão da Copa das Confederações em 2005. E e no ano seguinte fez parte do grupo que disputou o Mundial da Alemanha. Com a amarelinha foram 15 jogos, um gol marcado e o sentimento de que poderia ter feito ainda mais, se não fosse o gosto pela bebida.
- Se eu tivesse sido profissional, estaria brigando para ir à Seleção, mas não quis brigar por isso e entreguei de mãos beijadas a vaga.
Ego galático
A conquista do Mundial pelo São Paulo e da Copa das Confederações pelo Brasil crendeciaram Cicinho a se transferir para o Real Madrid, que tinha no elenco astros como Beckham, Ronaldo, Roberto Carlos e Zinedine Zidane. Cicinho vinha bem no Real até sofrer uma séria lesão no joelho, que o afastou dos gramados por seis meses. A chegada a um dos maiores clubes do planeta inflou o ego do jogador, que se sentiu ainda mais 'dono do mundo'.
- Quando o avião subiu para Madri, minha cabeça foi junto, o sucesso subiu igual a um foguete. Eu queria ser dono de tudo. Por exemplo, eu chegava numa choperia e mandava o cara abrir para mim dizendo que eu ía beber tudo lá.
Após voltar da cirurgia, Cicinho acabou perdendo espaço no Real e foi vendido ao Roma da Itália, onde passou a receber um salário maior do que tinha no clube merengue. Na Itália, Cicinho teve a companhia de Adriano, mas garante não ter compartilhado os excessos fora de campo com o atacante.
- Aquela lesão mexeu com a minha cabeça. Eu senti o baque. Fui fazer minha recuperação na minha cidade (Pradopólis) e ia para a fisioterapia pela manhã, à tarde e logo depois emendava num churrasco - lembrou.
Sofrimento da família
Já cheguei ao ponto de, no melhor hotel da minha cidade, enquanto o
cara fazia o meu check-in , às três da manhã, eu fazia xixi no saguão do
hotel"
Cicinho
- Eu fazia da casa dos meus pais um ambiente para as minhas festas. Lembro que minha mãe fez um aniversário e eu chamei um monte de amigos meus. Havia umas 200 pessoas na festa, e minha mãe não conhecia metade daquela gente.
Mesmo em sua cidade natal, convivendo com as pessoas que o conheciam desde a infância, Cicinho continuava desrespeitando os limites.
- Já cheguei ao ponto de, no melhor hotel da minha cidade, enquanto o cara fazia o meu check-in , às três da manhã, eu fazia xixi no saguão do hotel - se recordou, com um sorriso amarelo no rosto.
A bebida distanciou Cicinho também do filho Heitor, hoje com cinco anos. Cicinho carrega no braço direito o nome do primogênito tatuado, e por muito tempo esse foi o contato mais próximo que permanecia com ele.
- Eu tentava 'comprar' o amor do meu filho com presentes. Ele me chamava para jogar bola e eu falava que estava jogando baralho, tomando uma cerveja. Eu deixei muito a desejar com meus pais e meu filho.
A profecia do pastor
O mesmo roteiro do Real Madrid se repetiu no Roma. Cicinho começou bem pelo clube italiano, mas caiu de rendimento, e em 2010 chegou a ser emprestado para o São Paulo. De volta à velha casa, o lateral não apresentou nem uma vaga lembrança do futebol da primeira passagem.
- Eu faltei com o São Paulo na minha segunda passagem. Queria nada com nada.
- Havia um pastor aqui do Recife chamado Daniel que orou por mim e disse que eu ia voltar a jogar futebol no Sport. Dias depois, o pessoal aqui do clube entrou em contato comigo.
Resgatado por Marri
(Foto: Tiago Medeiros/Globoesporte.com)
A amizade permaneceu, e, depois de resistir bastante, Marri cedeu aos flertes de Cicinho. O namoro começou, e a desconfiança veio a reboque.
- Eu passei um 'bocado' com ele também. Quando nos reencontramos, ele estava numa das piores fases, bebia todos os dias e as pessoas vinham até mim e diziam que ele estava aprontando. Eu falava: "Meu Deus, eu não estou com esse garoto para ser traída" - recordou.
Em Marri, Cicinho encontrou o caminho para largar a bebida, mas redescobriu uma paixão antiga: o futebol. Os dois se casaram em junho deste ano e dias depois o jogador assinava contrato com o Sport. Felizes, os dois curtem a lua de mel no Recife.
- O amor que ela sente por mim, que eu sinto por ela, fez com que eu retomasse o amor que eu sinto pela minha vida. E assim eu percebi que não posso desperdiçar o que Deus me deu, o dom de jogar futebol. Estou muito feliz no Sport, num clube que me acolheu numa cidade maravilhosa, e quero fazer história aqui como o Magrão, que é um ídolo do clube - disse Cicinho.
- O Cicinho representa o amor para mim, e o amor é a base, a função de tudo. Ele pode contar comigo pro que der e vier - garantiu Marri
Aos 32 anos, Cicinho é titular do Sport, está livre do álcool,se reaproximou do filho, já pensa em encomendar outro e tem curtido o 'dia' do Recife ao lado de sua 'salvadora'. Na vitória do amor, Cicinho também saiu vencedor.
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