Complexo esportivo de Seedorf afasta crianças da violência no Suriname

Fundação do jogador organiza liga para jovens entre 9 e 15 anos em local que conta um pouco da trajetória do craque do Botafogo no futebol

Por Janir Júnior Direto de Paramaribo, Suriname

Clarence Seedorf não cabe apenas no termo “jogador de futebol”. Empresário, exemplo e homem de família seriam outras definições de um neto de escravo que cedo deixou o Suriname, formou sua carreira na Europa e, já consagrado ao redor do mundo, montou uma fundação em seu país natal para construir alicerces que não deixam as crianças desmoronarem na violência. A Champions for Children, fundada em 2005 por Seedorf, não apenas alimenta sonhos de meninos, mas também oferece estrutura para formar futuros jogadores de futebol. E, acima de tudo, seres humanos dignos.
A cerca de uma hora da capital Paramaribo, foi construído o Clarence Seedorf Sport Complex, um amplo espaço para crianças treinarem futebol e também disputarem campeonatos. No local, é realizada a Para Junior League, torneio disputado por meninos que sonham chamar atenção e romper as fronteiras do Suriname.

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O investimento inicial de Seedorf para construção e organização da liga - fundada no dia 27 de outubro de 2007 - foi de 250 mil euros (R$ 620 mil). Composto por 32 times tendo jogadores com idades entre 9 e 15 anos, o projeto tem como objetivo "promover a integridade e o fair-play" entre os jovens, dando-lhes uma alternativa à vida nas ruas.

Camisas e fotos: carreira de Seedorf está contada em um dos salões (Foto: Janir Jr / Globoesporte.com)

Qualquer menino que entra no complexo respira ares que servem de inspiração para seguir a carreira de jogador de futebol. Nas paredes de um salão decorado com bandeirinhas do Suriname, está retratada um pouco da carreira de Seedorf: camisas dos times que defendeu, da seleção holandesa, fotos com o jogador atuando, troféus e parte da história do meia do Botafogo, clube que pode ter sua camisa em breve no local.
Os vestiários foram batizados com nomes de clubes que Seedorf já defendeu, como Real Madrid e Sampdoria.
- Através do futebol, tentamos ensinar pequenas coisas para viver, respeitar um ao outro. Eles aprendem técnicas do futebol, mas o essencial é ensinar um pouco de tudo para usarem em suas vidas. É isso que tentamos passar para as crianças. São pequenas coisas. Tentamos educar, retirando das ruas para não fazerem coisas que não devem. Não roubar, fumar, beber... Eles vêm jogar futebol. É difícil monitorar tudo isso, pois não as vemos todos os dias. Mas acreditamos no que fazemos aqui, é um estímulo para serem crianças melhores – explicou Xaviera Jessurun, diretora-geral do centro, que mantém comunicação permanente com Seedorf através de telefonemas, e-mails, teleconferência e alguns encontros esporádicos.
Xaviera é o toque feminino, mas com pulso firme para gerenciar o complexo. E também comenta a relação e possíveis intercâmbios com o Brasil:
- Temos planos de expandir. Se não crescer essa propriedade (do Suriname) fisicamente, construir outro prédio. Nós trabalhamos com crianças do Brasil, jogadores do Brasil. Clarence é muito bom de fazer conexões com clubes para beneficiar sua causa em todo o mundo. Queremos dar chance para todos. Sempre estamos olhando para todas as oportunidades de trabalhar junto com quem quer que seja. Se acontecer com o Brasil, será bom para nós. Eu penso que os surinameses e todos os brasileiros que estão aqui vão trabalhar juntos.

A fundação Champions for Children se caracteriza por seu foco na educação, e não apenas em ajuda de emergência. Na lista de diretrizes, está escrito: “construção de escolas, centros esportivos e instalações nas quais as crianças podem adquirir uma educação e desenvolver o seu potencial”. O dinheiro arrecadado com empresas e investimentos do próprio jogador é destinado a projetos que prestam assistência sanitária, educação esportiva, escolaridade e formação profissional.
Seedorf é também um dos cinco Nelson Mandela Campeões do Legacy, em reconhecimento aos seus esforços filantrópicos. A postura do meia fora de campo, não só com os projetos, mas pelo comportamento, serve de exemplo. Casado com a brasileira Luviana e pai de quatro filhos, Seedorf não bebe, leva vida regrada, tem engajamento social e cultural, fala seis idiomas e demonstra conhecimento de política e da história de diferentes países que vivem situações precárias.

Seedorf  usa sua imagem para ajudar crianças
(Foto: Janir Júnior / Globoesporte.com)

- Testemunhar a fome que estrangulava a Etiópia na década de 80, quando eu era apenas uma criança, teve um efeito profundo em mim e despertou meu desejo de dar forma ao meu destino. Vendo o sofrimento em todo o mundo, eu fiz um voto na minha juventude para ajudar as pessoas e fazer uma contribuição ao meu mundo de todas as maneiras que puder. Melhorar a qualidade de vida através da saúde, educação e esportes é a minha visão - declarou Seedorf, em uma das apresentações de suas ações sociais.
Liga visava a Copa de 2014
A Para Junior League foi criada no contexto de "Suriname 2014", uma campanha apoiada por Seedorf para a seleção do país conseguir formar jogadores e chegar à Copa do Mundo de 2014, que será disputada no Brasil. A equipe nacional, porém, já foi eliminada das Eliminatórias. Os surinameses nunca disputaram uma Copa.
- É apenas o começo para muitos projetos que virão. Meu sonho sempre foi dar a volta neste mundo e olhar especialmente para as crianças. Ao apoiar a educação através do esporte, podemos ajudar a construir um futuro melhor e ensinar habilidades para a vida e os valores autênticos da comunidade - escreveu Seedorf no documento oficial da Champions for Children ao lançar a liga de futebol do Suriname.
Série especial conta um pouco mais sobre o Suriname
Desde esta quarta-feira, a série do GLOBOESPORTE.COM conta a trajetória de Seedorf no Suriname, berço do principal reforço do Botafogo para o Campeonato Brasileiro. Até domingo, você vai saber mais sobre a história do país, seus costumes, a paixão pelo futebol e os projetos que Clarence apoia no país.