Raias olímpicas da vela: mesmo com pouco lixo, preocupação para 2016
GloboEsporte.com navega na Baía de Guanabara com Juliana Mota, velejadora e estudante de engenharia ambiental, que não crê em solução até os Jogos Olímpicos
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Dez dias antes do Aquece Rio, evento-teste da
vela para os Jogos Olímpicos de 2016, o GloboEsporte.com navegou pelas águas da
Baía de Guanabara para conferir de perto a situação das raias olímpicas que a partir do
próximo domingo vão receber 320 atletas de 34 países (veja no vídeo ao lado). A
dupla da classe Nacra 17, formada por Juliana Mota, que também é estudante de engenharia
ambiental, e João Siemsen, acompanhou a reportagem durante o percurso pelos locais considerados mais
problemáticos pelos atletas: as raias do Pão de Açúcar e da Escola Naval (veja o mapa abaixo).
Na
manhã da quinta-feira da semana passada, dia 23 de julho, a
previsão era de bastante vento, o que traria muita sujeira. Expectativa
que acabou não se confirmando. Na maior parte tempo, a superfície estava
limpa. Na raia da Escola Naval, porém, uma linha de maré trouxe uma quantidade de lixo suficiente
para atrapalhar uma regata.
(Foto: Reprodução/Rio 2016)
- Hoje foi uma questão de sorte ou azar, depende do ponto de vista. É muito sazonal, depende muito das marés. Vimos pouco lixo, mas depois encontramos uma linha de maré com lixo. Mas a gente está muito mal-acostumado a achar que só porque não tem lixo superficial ou quando vê um ecobarco, que a qualidade da água está boa. Não está. Na verdade, o problema maior é a questão do esgoto que a gente não vê nem no tratamento. É uma questão, digamos, brasileira. De ser tudo imediato, paliativo - disse Juliana, de 26 anos.
Por outro lado, de acordo com o Instituto Estadual do Meio Ambiente (Inea), em relação à
qualidade da água, as raias olímpicas estão dentro dos padrões exigidos
pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente. O monitoramento, feito duas
vezes por mês, indica que este ano o nível de coliformes fecais esteve
acima do permitido apenas em maio, em decorrência de chuvas (veja o gráfico no fim da matéria).
-
Nos pontos de prova, na maioria das vezes estão 100% do padrão
estabelecido há um bom tempo. A probabilidade de contrair algum tipo de
doença é praticamente nula. Há um troca de água muito grande. É distinto
da costa oeste, que está ruim - disse Leonardo Daemond, gerente de
qualidade das águas do Inea.
As cidades continuam crescendo muito, sem nenhuma estrutura. Os poucos projetos que existem, na prática, estão muito devagar.
Juliana Mota
A velejadora não acredita que a meta de despoluição da baía em 80%, estipulada pelo governo estadual como legado dos Jogos, seja cumprida. Mesmo que, de acordo com o secretário da casa civil, Leonardo Espínola, o objetivo, na verdade, seja tratar a mesma porcentagem do esgoto através de ecobarreiras, ecobarcos, Unidades de Tratamento de Rio (UTRs) e Centro de Tratamento de Resíduos.
- O esgoto pode até ter sido
tratado, eu duvido muito. Mas a poluição não se resolve assim. Leva
tempo. Não adianta fazer todas as ligações de esgoto agora e tratar
tudo. A água poluída já está aí. E o lodo no fundo também - explicou
Juliana.
A estudante de engenharia ambiental
enumerou os fatores que causam a sujeira na Baía de Guanabara. Primeiro,
a boca de saída para o mar é muito pequena. Segundo, as saídas dos rios
para o mar, chamadas de estuários, estão fechadas ou semifechadas, e
dessa forma acumulam matéria orgânica. Processo acelerado pela
urbanização ao redor.
- As cidades continuam crescendo muito, sem nenhuma
estrutura. Os poucos projetos que existem, na prática, estão muito devagar.
Então, com certeza para 2016 não dá mais. Quem sabe se de repente, com a
visibilidade da poluição, a gente consiga mais para frente. Nossos filhos, quem
sabe... – disse Juliana, de 26 anos.
Os dois velejadores relacionam problemas de saúde
à qualidade da água. Juliana nota que machucados seus demoram a curar, e
João costuma ficar doente em épocas de chuva. Sobre problemas com lixo,
ele se lembra da ocasião em que bateram em
uma porta quando velejavam a 40km/h. Tiveram que voltar à terra
rebocados. Medidas paliativas e o fato de as Olimpíadas serem realizadas
em
uma época de poucas chuvas poderão evitar problemas, na opinião de
João. Para Juliana, o risco de uma regata olímpica ser comprometida vai
depender das marés, mesmo com os ecobarcos, que recolhem o lixo
flutuante das águas. - Essas medidas podem talvez evitar alguns transtornos. Mas se a maré estiver forte, ou depois da chuva, isso não vai ser suficiente. É torcer para que o problema não seja grande, principalmente se alguém ficar doente. Essa seria a pior questão - afirmou Juliana, que já se deparou com uma cabeça de porco na água, mas também teve a agradável surpresa de ver arraias e golfinhos.
- Essa situação é um incômodo porque você perde a
visibilidade do esporte, fica uma imagem ruim. Mas ao mesmo tempo é bom porque
para nós velejadores a grande importância da Olimpíada é o legado. E o legado
mais importante para nós é a limpeza da Baía de Guanabara. Todos os cariocas querem isso. Essa conexão
conosco foi importante.
Para melhorar as condições de navegação durante o evento-teste para 2016, o Inea acertou uma parceria com 12 empresas privadas
que vão emprestar equipamentos e embarcações para um mutirão de
limpeza. A medida é necessária para evitar que fortes chuvas, que
aumentam o fluxo das águas dos rios que desaguam na Baía, o carreguem de
lixo flutuante.
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