Do fracasso à glória: o que o futebol alemão pode ensinar aos brasileiros
Investimento forte na base, um treinador com mentalidade diferente e abertura à influência estrangeira... Como a Alemanha se reergueu após seguidos fracassos
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Dez anos depois de ganharem o tricampeonato mundial na Itália, os alemães viviam uma crise no futebol, escancarada com a eliminação precoce na Eurocopa de 2000. Com duas derrotas, nenhuma vitória e apenas dois gols marcados – um na Holanda, outro na Bélgica –, a Alemanha, então campeã europeia, amargou a lanterna de um grupo que tinha ainda Portugal, Romênia e Inglaterra.
Foi o ponto de partida para que o fracasso em campo virasse coisa séria no país, e o governo decidiu: a seleção tricampeã do mundo, que vinha de dois fracassos em Copas (eliminação nas quartas de final para a Bulgária, em 1994, e Croácia, em 1998), deveria voltar a ser uma potência em uma década.
Olhar para as futuras gerações
Outras medidas além das quatro linhas foram adotadas pelos organizadores do futebol alemão.
– Mais 46 academias e 29 escolas alemãs foram designadas a formar atletas de ponta. Assim, os alunos recebem uma educação completamente normal, tem total acesso à universidade e ainda se beneficiam com o futebol como parte do currículo. Todos os jogadores das seleções de base, do sub-15 em diante, se beneficiam do mesmo nível de apoio nos bastidores, incluindo um psicólogo esportivo, um preparados físico, assim como médicos de primeira linha e fisioterapeutas – completou Niersbach.
Uma nova postura em campo
A campanha além das expectativas na Coreia e no Japão pode ter gerado uma animação momentânea, mas que cairia por terra dois anos depois. Na Eurocopa de 2004, a equipe comandada por Rudi Völler voltaria a fracassar na primeira fase, após perder para República Tcheca e empatar com Holanda e Letônia. E aí foi dado mais um passo para a renovação alemã: o ex-atacante e ídolo local Jürgen Klinsmann assumiu o comando da equipe e levou Joachim Löw como seu assistente.
O jornalista Ralf Itzel, correspondente alemão no Brasil, diz que Klinsmann e Löw, o atual treinador da equipe, têm estilos distintos, mas ambos contribuíram de forma fundamental para esta mudança. Ele revela ainda uma medida curiosa adotada pelo ex-treinador.
– Klinsmann sempre foi o motivador, mais extrovertido, enquanto o Löw era o cara da tática, que observava os adversários. Foi o Klinsmann quem inventou essa história de uniforme vermelho por achar que precisávamos ser mais agressivos. Nunca houve esse vermelho nos uniformes na Alemanha. Se hoje temos esse vermelho e preto, foi uma coisa dele.
influência estrangeira
– Estávamos pensando exatamente como vocês brasileiros pensam hoje: que não precisávamos aprender nada. E fomos jogando cada vez pior, pior e pior – disse o ex-jogador alemão Paul Breitner, campeão do mundo em 1974.
Com uma dose de humildade, a avalanche que foi a partida desta terça-feira no Mineirão pode trazer alguns ensinamentos para os brasileiros. Até porque a Alemanha de 2000 e 2004 tinha muitas semelhanças com o Brasil de 2014. Além da falta de resultados, a seleção brasileira tem uma grande deficiência para revelar grandes jogadores, apesar da facilidade histórica de criar talentos para o mundo.
Os problemas da base vão além. Dos jogadores que começaram a partida contra a Alemanha, David Luiz, Dante, Luiz Gustavo e Hulk tornaram-se conhecidos primeiro no exterior, antes de serem "descobertos" pelos brasileiros. Para não falar de Pepe, Deco, Diego Costa, Thiago Motta e outros que deixaram o futebol brasileiro precocemente e se naturalizaram para defender as cores de grandes seleções europeias.
Os alemães não têm vergonha em reconhecer que, durante o período de crise, foram até países vizinhos para "copiar" fórmulas vencedoras. Na França, na Holanda e na Espanha, os treinadores encontraram modelos de sucesso que poderiam ser importados para o futebol local. Na visão de Ralf Itzel, a inspiração em escolas estrangeiras pode ser muito bem-vinda.
Ainda assim, há quem acredite que não é tão simples assim apenas copiar o modelo alemão, por questões culturais, como o avalia jornalista germânico Kai Schiller, do “Hamburger Abendblatt”.
– As culturas são muito diferentes, e é difícil de comparar. O Brasil tem tantos jogadores bons que nunca teve problema para construir uma seleção. Neste Mundial, parece que teve dificuldades para encontrar bons jogadores na frente.
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