Roger Gracie: 'Bem treinado, tenho condição de ganhar de qualquer um'
Atual grande nome do jiu-jítsu no mundo, lutador brasileiro ainda se adapta
ao MMA e reprova as críticas de Thiago Silva à sua família: 'É uma pena'
Por Ivan Raupp e Klima Pessanha
Rio de Janeiro
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Criadora do jiu-jítsu, a família Gracie sempre lançou atletas que se
tornaram ícones das artes marciais. De Carlos e Hélio, passando por
Carlson, Rickson e Royce, o mais recente expoente desse clã é
Roger Gracie.
Aos 31 anos, ele já é decacampeão mundial na arte suave, mas a busca
por novos desafios o fez entrar, em 2006, em um processo de migração
gradual para o MMA que dura até agora. O ponto final está próximo, e
culminaria com a
ida de Roger para o UFC, maior organização de artes marciais mistas do mundo, como o
SPORTV.COM já havia adiantado. E, se depender da confiança do peso-médio do Strikeforce, Anderson Silva que se cuide:
- Acho que se você perguntar para todo lutador se ele tem chance de ser
campeão, ele vai falar que quer ser campeão e tem chance de ganhar.
Acredito muito em mim e acho que, bem treinado, tenho condição de ganhar
de qualquer um. A gente está no esporte para dar o máximo de si, para
competir contra os melhores - disse ele, em entrevista exclusiva.
Roger Gracie em frente à praia de Ipanema, no Rio de Janeiro (Foto: Ivan Raupp / Globoesporte.com)
Do alto de seu 1,94m, Roger recebeu a reportagem do
SPORTV.COM
para um bate-papo à beira da praia de Ipanema. Com jeito calmo e a voz
baixa, falou sobre a adaptação à categoria dos médios, o aprendizado com
a derrota para King Mo, e as recentes críticas do meio-pesado do UFC
Thiago Silva à sua família, dizendo que ela manipula o jiu-jítsu. Roger lamentou:
- É uma pena que um atleta do nível dele não consiga enxergar coisas
que são claras na frente dele. A família tem uma história muito grande,
praticamente inventou o vale-tudo no mundo. Então, por a gente estar
envolvido com isso há tanto tempo, sempre existem pessoas que falam
contra. É impossível você achar uma coisa que seja 100% a favor de todo
mundo.
O próximo compromisso de Roger Gracie, que tem cinco vitórias e um
revés no MMA, é contra o americano Anthony Smith. O Strikeforce ainda
não anunciou de forma oficial, mas tudo indica que o evento de 12
janeiro, em Oklahoma, será o último da história da organização. Depois
disso, a expectativa é que o decacampeão faça o sobrenome Gracie voltar a
figurar no UFC, criado por Rorion e inicialmente estrelado por Royce. A
seguir, leia a entrevista na íntegra:
SPORTV.COM: Qual o intuito de vir para o Brasil neste fim de ano? Teve a ver com a chance de poder treinar na Team Nogueira?
ROGER GRACIE: Na real eu vim para o Brasil 100% de férias, né?
Eu já tinha programado, já tinha comprado passagem até há um tempo, já
estava tudo esquematizado de vir com minha família (esposa e filho) de
férias. Então, 15 dias antes de eu viajar, meu empresário entrou em
contato comigo e falou que o Strikeforce tinha ligado para perguntar se
eu queria lutar em janeiro, no último evento. Conversamos e chegamos à
conclusão que talvez seria legal participar deste último evento do
Strikeforce. Vai ser uma luta interessante contra o Anthony Smith. Aí
começou a mudança de planos. Fui conversar com a esposa: "Amor, senta
aí. As férias não ver ser bem assim (risos)..." Mas foi tudo bem. Aqui
tem minha família, minhas irmãs, consigo dar uma curtida. E aqui tem a
Team Nogueira. Acho que se não houvesse eles aqui eu teria que ter
cancelado a minha vinda para cá e iria para os Estados Unidos. Como eu
já sabia que eles tinham um centro de treinamento e os irmãos Nogueira
estão treinando... Minotouro vai lutar em fevereiro, está em um ritmo
forte de treino, Pezão está por aqui também, então existem vários
atletas.
A derrota me ensinou em
diversos aspectos. Primeiro, me acordou na parte em pé, apontou vários erros que tive na luta.
Erro estratégico, a forma como
me preparei psicologicamente
para aquela luta..."
Roger Gracie, sobre nocaute para King Mo
Achou algum parceiro da altura do Anthony Smith (1,93m) para treinar?
A gente tenta buscar o mais próximo possível. Alguém igual a ele é
difícil (risos). Tem uns caras altos ali, não sei se da mesma altura,
mas são parecidos.
Mas você treinou com o Stefan Struve (que tem 2,13m)
recentemente. Ele até chegou a dizer que se sentiu um faixa-branca
treinando com você.
Ele é grande, é alto. Treinei com ele no chão. Ele faz jiu-jítsu há
muito tempo, mas é faixa-marrom, não chegou à preta ainda. Então, de
repente lá no lugar onde ele mora (Holanda) ele não está acostumado a
treinar com pessoas de alto nível no jiu-jítsu. Já sou faixa-preta há
dez anos, é algo totalmente diferente. Para quem não conhece... Acho que
ele não tinha treinado com alguém do meu nível no jiu-jítsu ainda,
então ficou um pouco chocado.
Você já sabia que ia lutar contra o Smith quando foi treinar com o Struve? Isso ajudou na preparação?Não
sabia ainda. Fui só para treinar, passar dois dias e conhecer o Melvin
Manhoef, que também é ligado ao Joinha (Jorge Guimarães, seu
empresário). O Joinha vive falando para eu ir lá treinar com o Melvin.
Ele também ia lutar (no KSW 21), mas um dia antes de eu chegar ele
machucou o pé. Acabou que nem aproveitei tanto o treino, mas deu para
dar uma treinada.
Em uma entrevista recente ao SPORTV.COM, você disse que até
poderia voltar ao peso-meio-pesado se sentisse dificuldade na perda de
peso para chegar ao limite dos médios. Mas desta vez você aceitou a luta
muito em cima da hora. Como está o processo?Está meio
sofrido (risos). Estou sofrendo bastante já em relação à dieta. Meu peso
já estava meio alto, fiquei meio relaxado lá em Londres, fui pego meio
de surpresa. Fim de ano, eu não estava com plano nenhum de lutar, estava
comendo bastante... Então, estou descendo bastante, vou perder um peso
significante aí. Agora estou com 98kg, tenho um mês para perder 14kg.
Este é um momento crítico, tenho que seguir o programa 100% para não
deixar acontecer o que aconteceu em minha última luta, quando eu estava
12kg acima (do limite dos médios) quatro dias antes. Isso influenciou
muito na minha performance. Ganhei, foi uma luta boa para mim, mas eu
cansei. Já estava cansado antes de entrar no ringue. Isso mudou toda a
minha estratégia. Antes de entrar na luta eu já sabia que não poderia
acelerar muito o ritmo. Se ela fosse movimentada, teria que dar uma
segurada no ritmo, porque se ele (Keith Jardine) viesse com um ritmo
muito forte eu dificilmente aguentaria muito o terceiro round. Mas
consegui controlar a luta, fomos para o chão em umas posições boas e ele
cansou também, provavelmente por ter tentado sair ali de baixo. No
último round ficou meio que uma luta de xadrez ali. Nos dois primeiros
rounds, quando eu estava com gás, consegui levar a luta na boa. Agora,
acho que vai depender disso: cada semana, tenho que perder 2kg até lá.
Se deixar acumular todo quilo que não perco, vai ser mais sofrimento no
fim. Isso pode afetar o meu rendimento na hora da luta. Se isso
continuar acontecendo, vou ter de mudar de categoria, pois não posso
prejudicar o meu rendimento.
Roger, Melvin Manhoef e Stefan Struve
treinando juntos (Foto: Reprodução / Twitter)
Muita gente diz que o peso-médio é a categoria menos disputada do UFC. Você acha que pode dar uma movimentada na divisão?É
uma pergunta meio difícil de responder. Acho que se você perguntar para
todo lutador se ele tem chance de ser campeão, ele vai falar que quer
ser campeão e tem chance de ganhar. Acredito muito em mim e acho que,
bem treinado, tenho condição de ganhar de qualquer um. A gente está no
esporte para dar o máximo de si, para competir contra os melhores. Esta
categoria está há muito tempo sem troca de campeão porque o Anderson
Silva está há muito tempo dominando. Existem atletas muito duros, mas
durante as lutas ele (Anderson) mostra que está muito à frente de muita
gente. Luta é luta. Ele pode continuar ganhando para sempre, pode perder
na próxima... É difícil prever. Ele tem uma predominância muito grande,
mas se houver, de repente, uma chance de eu enfrentá-lo, é claro que,
na minha cabeça, só estou lutando porque acho que posso ser campeão e
que posso ganhar de todo mundo. Vai vir uma carga boa de lutadores aí, o
(Ronaldo) Jacaré, o (Luke) Rockhold...
Acho que haveria algum tipo de empecilho por você e o Anderson serem empresariados pela mesma pessoa (Joinha)?Acho
que iriam dificultar ao máximo (a realização da luta), ninguém nunca
quer. Até porque às vezes vou para Los Angeles para treinar, a gente
(ele e Anderson) acaba treinando junto. Então é chato você ter que lutar
contra alguém do mesmo time, com quem treina junto. Como ele (Joinha)
empresaria os dois, acho que vai tentar evitar o máximo possível. Mas é
uma coisa que ele falou - não em relação a mim e o Anderson Silva -, e
sim em relação aos atletas que gerencia... Também têm o Lyoto e o
Glover, que treinam juntos, são dois meio-pesados... Se chegar ao ponto
que tem que lutar pelo cinturão, então não tem jeito. No meu caso, acho
que só lutaria contra o Anderson se fosse pelo título. Enfim, nem sei
por quanto tempo ele vai lutar também, muita gente diz que ele já está
perto de aposentar. Espero que continue lutando, ele é um cara
fenomenal.
Várias pessoas da minha família me apoiaram. Me apoiam até
hoje, me incentivam. Claro que alguns vieram falar para mim
que achavam que eu não devia lutar porque as regras hoje em
dia mudaram muito, não eram como antigamente"
Sobre o apoio da família para migrar pro MMA
Acertando com o UFC, sua ideia é continuar morando em Londres?Acho
que sim. Criei raízes muito fortes lá. Minha mulher, meu filho está no
colégio, minha academia... Enquanto eu conseguir ter treinos de alto
nível morando lá, vou continuar. Se de repente eu achar que estou sendo
prejudicado, que tenho que sair para continuar sendo um atleta de ponta,
aí eu acho que sairia. Tenho minha academia lá, não tenho ninguém que
possa cuidar dela. Não posso deixar meus negócios na mão de ninguém,
pelo menos no momento. Até agora, eu consegui morar lá e treinar
perfeitamente. Mas se chegar a um ponto em que eu ache que não dá para
me manter como um atleta de ponta, aí ou eu desisto e me aposento ou vou
para outro lugar.
O que te faz mais falta lá em Londres em relação aos treinos?A
parte de MMA é a que mais me faz falta, pois minha academia é de
jiu-jítsu, estou lá há vários anos, e tem um pessoal com quem eu consigo
treinar de quimono por lá, meus alunos, o Bráulio (Estima, campeão
mundial de jiu-jítsu)... Mas de MMA é difícil porque não tenho nenhum
atleta profissional treinando comigo lá. Até tento reunir uns caras para
treinar lá, às vezes consigo, mas não é uma coisa constante. Não
consigo achar uma academia boa de wrestling para treinar também. Boxe
tem, preparação física também consigo coisas boas. Só que atletas de MMA
de alto nível como aqui... A Team Nogueira tem os irmãos Nogueira, o
Pezão, uma boa quantidade de atletas que competem MMA. Vou para Los
Angeles e tem o Lyoto, o Glover... Vou para Nova York e tem o Renzo com
os meus primos... Nesse nível, (Londres) não chega nem perto.
A derrota para o King Mo foi importante para você ver que tinha que treinar ainda mais a parte em pé?Acho
que uma derrota só é derrota quando você não aprende com aquilo que
aconteceu. Se você aprender com uma derrota, pode transformar aquilo em
uma vitória. É claro que ninguém gosta de perder, nunca mais quero ser
nocauteado na vida. É algo que não gostei e não quero que aconteça de
novo. Mas tento tirar o maior proveito daquela luta. A derrota me
ensinou em diversos aspectos. Primeiro, me acordou na parte em pé,
apontou vários erros que tive na luta. Erro estratégico, a forma como me
preparei psicologicamente para aquela luta... Me deu uma acordada boa,
tenho que tirar o melhor proveito.
Declarado vencedor por decisão unânime contra
Keith Jardine no Strikeforce (Foto: Getty Images)
Qual a sua maior motivação no MMA hoje em dia? É para mostrar a eficiência do jiu-jítsu, é financeira ou tem mais alguma outra?Acho
que é um pouco de tudo. Eu sempre soube, desde moleque, quando comecei a
treinar o jiu-jítsu mais a sério e estabeleci que o jiu-jítsu seria a
minha vida, que era um caminho de todo Gracie (que luta) sempre se
dedicar à parte de pano, competir o máximo que der, se aprimorar na
parte técnica. E uma vez que ganhou a faixa preta, que essa pessoa está
pronta, o próximo passo seria o MMA. Acho que para todas as pessoas da
minha família, esse foi o caminho que todos eles fizeram. Eu já tinha
isso muito dentro de mim, que já iria acontecer. Então vivo muito hoje
em dia em função disso. Primeiro por eu ter o sobrenome Gracie, acho
que, não por obrigação, mas acho que é como se fosse um dever eu
representar a minha família perante a luta. Já competi bastante no
jiu-jítsu, pretendo competir mais ainda, mas é meio que um dever. Luto
MMA porque acho que devo, por causa dessa trajetória que escolhi por
mim.
Você recebeu apoio da família quando migrou para o MMA?Várias
pessoas da minha família me apoiaram. Me apoiam até hoje, me
incentivam. Claro que alguns vieram falar para mim que achavam que eu
não devia lutar porque as regras hoje em dia mudaram muito, não eram
como antigamente - uma coisa sem tempo, para você provar a eficiência do
jiu-jítsu. O que é verdade, as regras hoje em dia desfavorecem muito o
lutador de chão. Acho que não existe mais aquela essência de provar qual
a melhor arte marcial porque virou quase que um esporte, não a
soberania do melhor lutador do mundo. É quem consegue combinar aquilo
tudo, o fator físico, é jogar com as regras. Tem várias outras coisas
ali que podem fazer uma pessoa ganhar que talvez, se mudassem as regras,
como uma luta sem tempo, com certeza mudariam muitos campões. É muito
pela adaptação das regras. Mas acho que, de uma certa foram, eu estou
jovem, estou 100% saudável. É um prazer, eu gosto de treinar, desse
sentimento de ter que competir, de ter de enfrentar um outro adversário,
tudo isso me motiva a lutar também.
A Kyra está chegando em um momento em que ela ou vai agora e se dedica ou então começa a
ficar tarde demais. Porque não é uma coisa simples"
Sobre a ida de Kyra Gracie para o MMA
Muita gente diz que você e o Rickson foram os melhores lutadores de jiu-jítsu que existiram até hoje. Você concorda com isso?Acho
difícil falar que eu e o Rickson fomos os melhores. Ainda mais porque
na minha família são várias gerações. Cada geração, vamos dizer assim,
teve o campeão da família, ou que naquela época foi considerado o melhor
lutador da família. Começou com meu avô Carlos, depois vieram os
irmãos, o Jorge, teve o Hélio, que saiu à frente. Depois do Hélio teve o
Carlson. Depois do Carlson, o Rolls. Do Rolls, o Rickson. Daí, muitos
hoje em dia falam que sou eu. Acho que não dá para comparar uma geração
com a outra, seria uma coisa impossível. A época, o jiu-jítsu, as
regras, o mecanismo que a pessoa tinha naquele momento ali para
competir... Os desafios vão mudando, o jiu-jítsu vai evoluindo, as
coisas mudam muito. Então, seria até injusto com outros atletas até, não
só com os da minha família, falar que somos os melhores de uma coisa
que não dá para comprovar com as gerações anteriores. Cada um teve a sua
época, o seu momento.
Dos atletas que estão competindo no jiu-jítsu hoje, quem que ainda não estreou no MMA poderia se dar bem?(Pausa
para pensar) Olha... Para falar a verdade, é difícil, cara. Porque há
vários atletas aí que, pelo que fazem de melhor no jiu-jítsu, se fizerem
esse tipo de jogo no MMA, não daria muito certo. Porque hoje o
jiu-jítsu tem muito o fator da guarda, de você ganhar por uma
raspagem... Você tem essa guarda 50-50, que tem muita gente usando...
Esse tipo de coisa no MMA... Quando você coloca que pode socar, chutar,
essas coisas não vão funcionar muito, não. Eles são grandes atletas para
chegar aonde estão e conseguirem se adaptar, o que acho que todos
conseguem, podem ser grandes lutadores de MMA também. Mas, se ficarem
muito viciados naquele jogo de guarda, preocupados em segurar manga, no
momento em que você coloca as regras de MMA nada disso vai funcionar.
Isso já aconteceu com alguns, né? Não conseguiram se tornar grandes
nomes no MMA. Ganharam algumas lutas, certamente são atletas muito bons,
mas não conseguiram ser no MMA o que foram no jiu-jítsu.
Além de você, outro nome importante do jiu-jítsu que está
começando bem a carreira no MMA é o Gilbert Durinho. Que outros
lutadores você citaria?O Durinho, com certeza. O Demian
Maia mudou de categoria agora, tem boas chances de ser campeão. Acho que
o Bráulio (Estima), que já fez a primeira luta de MMA. Ele está
querendo lutar mais e pensa até em se mudar para Miami para se dedicar
exclusivamente aos treinamentos de MMA. Bráulio é um grande atleta, de
todos eles é com quem eu treino mais (Bráulio também mora na
Inglaterra), é o que eu mais conheço o jogo. Acho que o jiu-jítsu dele é
fenomenal e, se conseguir se dedicar mesmo, pode ser um grande nome no
MMA.
Como um legítimo carioca na praia de Ipanema (Foto: Ivan Raupp / Globoesporte.com)
Falando ainda em jiu-jítsu no MMA, você sempre teve uma
finalização muito forte que é o estrangulamento da montada utilizando o
quimono. Como foi essa sua adaptação ao MMA?Você tem que se
adaptar um pouco às regras. Primeiro você tem que se adapatar ao fato
de não ter quimono. Não existe pegada. Meu estrangulamento favorito, que
é o estrangulamento da montada, já não existe mais quando você tira o
quimono. E quando você coloca que vale a parte mais agressiva do
striking, de você poder socar, dar cotovelada e tudo mais, muda mais
ainda. Então, é aquele fato de você ter de adaptar, de conseguir pegar o
que o momento está te dando. Mas ao mesmo tempo você dificilmente fica
muito tempo na montada, porque no MMA não tem gola para finalizar, mas
tem soco. Ninguém quer ficar deitado tomando soco na cara (risos).
Então, todo mundo vira de costas. E a finalização das costas também é
uma das que mais gosto. Acho que dá para compensar um pouco por esse
lado.
A luta contra o Keith Jardine, quando você usou bem as cotoveladas da montada, foi um bom exemplo dessa adaptação?Eu
não queria ficar socando muito, porque socar cansa e eu sabia que já
estava meio cansado. Se eu ficasse socando, socando, socando, seria uma
faca de dois gumes. Ou ele seria nocauteado ou eu teria gastado toda
minha energia, e, se ele saísse dali, eu não teria mais. As cotoveladas
são golpes bastante traumáticos e por isso achei que ele ia dar mais as
costas. Ele até deu, mas acabou que ele sangrou bastante, ficou muito
escorregadio, e o sangue acabou indo contra mim. Nunca pratiquei
cotovelada da montada, mas é uma coisa que você sabe que existe. Não é
uma coisa que você precisa aprimorar uma supertécnica para dar
cotovelada por cima. Se os dois estão em pé, você precisa de uma técnica
apurada para poder acertar, tem o lance da distância, da movimentação.
Na montada, não tem movimentação, o cara está parado e não pode sair.
Thiago Silva: virou desafeto? (Foto: Getty Images)
Recentemente, o Thiago Silva fez uma crítica aos Gracie,
dizendo que a família tem uma "falsa reputação", monopoliza o jiu-jítsu e
prejudica "atletas que treinam duro e se dedicam de verdade". O que
você tem a dizer sobre isso?
É uma pena que um atleta do nível dele não consiga enxergar coisas que
são claras na frente dele. A família tem uma história muito grande,
praticamente inventou o vale-tudo no mundo. Então, por a gente estar
envolvido com isso há tanto tempo, sempre existem pessoas que falam
contra. É impossível você achar uma coisa que seja 100% a favor de todo
mundo. Sempre existem pessoas contra, que não gostaram de uma atitude,
de um resultado, de alguma coisa, e acabam culpando a família. Uma coisa
dessa não vale nem um comentário meu. São tantas coisas que minha
família já fez, e faz até hoje, que não dá nem para responder esse tipo
de comentário.
É uma motivação a mais para o Joe Silva casar um Roger Gracie x Thiago Silva no UFC?Ele é médio?
Meio-pesado.Quem sabe? (risos) Se eu resolver mudar de categoria...
O que você acha de ver a sua prima Kyra no MMA? Você teve
apoio, mas sabemos que a família está um pouco dividida em relação a
ela.A Kyra está chegando em um momento em que ela ou vai
agora e se dedica ou então começa a ficar tarde demais. Porque não é uma
coisa simples. Não é que ela vai acertar uma luta e treinar para ela
por dois meses. Não é uma luta de jiu-jítsu ou de jiu-jítsu sem quimono,
é uma modalidade totalmente diferente. Ela nunca lutou nessa regra, ela
nunca trocou soco e chute com ninguém. Então, tem muita coisa ali que
sai do que ela está acostumada. Simplesmente se preparar dois meses para
uma luta dessa é muito pouco. É suficiente fisicamente. Tem gente que
leva oito ou dez semanas para se preparar fisicamente para uma luta. Mas
acho que tecnicamente, ainda mais para ela que nunca fez... Ou ela está
mirando desde já e já começou o treinamento dela para isso ou daqui a
pouco vai ser tarde demais.