Morte trágica do filho blindou Vitor Miranda: "Nada pode me abalar"
Igor
faleceu no dia em que completava 4 anos, após se afogar na piscina.
"Tenho bagagem e estrutura suficientes para aguentar qualquer pedreira",
diz finalista do TUF
Por Ivan Raupp e Adriano AlbuquerqueSão Paulo
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É normal vermos lutadores que saíram da miséria, venceram na vida e são exemplos de superação. No caso de
Vitor Miranda, essa superação não foi exatamente
em cima
da pobreza, apesar de ele já ter passado por dificuldades financeiras. O
episódio vivido por ele é bem mais grave do que isso: lidar
com a morte
de um filho. Em 2011, quando Vitor tentava a sorte como lutador nos
EUA, o menino Igor, filho dele com Paula Miranda, afogou-se na piscina
da casa onde eles moravam, ficou em coma por três dias e morreu no dia
em que faria seu quarto aniversário. A tristeza quase acabou com a vida
do casal. Juntos, os dois se uniram ainda mais e acharam forças para se
levantar. Com muito custo, conseguiram. Hoje, o finalista da categoria
peso-pesado (até 120kg) do The Ultimate Fighter Brasil 3 olha para trás e
vê um buraco enorme. Mas um buraco que o ajudou a se fortalecer e a se
blindar diante de novas dificuldades que possam surgir. Afinal, que dor
pode ser maior do que a da perda de um filho?
- Não sei se isso
aconteceria naturalmente, mas sinto que me deu um estalo no senso de
urgência. Amadureci muito rápido. Talvez eu precisasse de mais dois ou
três anos para amadurecer, mas eu estava pronto. Física e tecnicamente,
sempre fui um cara disciplinado. Então, assim que voltei a treinar na
Team Nogueira, fiquei preparado e evoluí muito rápido. A motivação é muito maior. Quando
olho para trás,
só preciso de cinco minutos para pensar por que quero isso. Vem muita
coisa à minha cabeça, e tenho muita coisa para conquistar e muito
incentivo para ser o melhor que eu puder. Essa tragédia serviu para
isso, para eu ver que nada pode me abalar. Nenhuma dificuldade é tão
grande que possa ser maior do que a que eu passei. Agora estou mais
forte do que nunca para ir o mais longe possível. Tenho bagagem e
estrutura suficientes para aguentar qualquer pedreira - disse Vitor ao
GloboEsporte.com.
A esposa Paula, o filho Igor e Vitor Miranda em foto antiga (Foto: Arquivo Pessoal)
A tragédia foi um divisor de águas na carreira de Vitor Miranda. No começo, ele pensou em desistir. Depois, ainda
mais forte
mentalmente até mesmo em relação a antes do episódio, encontrou-se como
atleta. E ele credita boa parte do sucesso aos irmãos Rodrigo Minotauro
e Rogério Minotouro, que o ajudaram num momento difícil:
-
Realmente a minha carreira começou a deslanchar mais depois dessa
tragédia no sentido de que tive sorte de conhecer os amigos da Team
Nogueira. Os caras são f***.
Quando olho para trás, só preciso de cinco minutos para pensar por que
quero isso. Vem muita coisa à minha cabeça, e tenho muita coisa para
conquistar e muito incentivo para ser o melhor que eu puder
Vitor Miranda
A história de Vitor Miranda no mundo
das lutas começou tarde, quando tinha 21 anos e ingressou no muay thai após desistir de ser jogador
profissional de basquete.
Morando em Joinville-SC, foi acumulando bons resultados na modalidade.
Um dia foi apresentado por Assuério Silva a Pedro Rizzo, de quem virou
sparring de muay thai. Rizzo treinava na Nova União, e quando o K-1
(torneio de trocação) perdeu força, o líder da equipe, Dedé Pederneiras,
influenciou Vitor a ir para o MMA, onde poderia
ganhar mais dinheiro. Ele foi, mas na sua cidade não havia estrutura suficiente para focar nesse esporte.
Em 2010, Vitor foi para o Rio de
Janeiro com
a esposa, Paula, e o filho, Igor, que tinha 2 anos na época. No começo,
ficou sem equipe definida e se sustentou dando aulas. No fim do ano foi
convidado por André Benkei para fazer parte de um time nos EUA e
aceitou. Um mês depois, o time se desfez. O dono da academia, então,
convidou Vitor para morar em sua casa, em Boca Ratón (na Flórida), e dar
aulas, focando aos poucos na luta. Ficou três meses sozinho
no exterior, e depois a esposa e o filho foram morar junto. Em um
dia de junho,
Vitor foi para a academia trabalhar, e Paula estava fazendo comida
dentro da casa. Igor, que faria 4 anos quatro dias depois, caiu na
piscina e se afogou. Ficou em coma por três dias. No quarto, não
resistiu e acabou falecendo. Após a tragédia, apareceu a ajuda de um
grande amigo, o peso-pesado Antônio Pezão, que também morava na Flórida.
- Quando ele faleceu, primeiro a gente ficou dois meses sem conseguir
sair de casa,
sem pensar em nada. Fiquei dois meses "internado". A gente passou uma
semana no hospital. Quando saiu de lá, teve o enterro, e não tinha como
voltar para a casa onde aconteceu o acidente, minha mulher não
conseguiria. Aí o Pezão arrumou o quarto da filha dele para nós. A gente
ficou lá três meses. O Pezão é outro cara para quem devo a vida. Num
momento onde eu não tinha dinheiro nem nada, os caras sustentaram a
gente - disse.
Vitor Miranda enfrenta Cara de Sapato na final do TUF Brasil 3, neste sábado (Foto: Ivan Raupp)
Aos
poucos o casal começou a pensar no que fazer na sequência. E Vitor se
motivou a não desistir para não deixar que tudo fosse em vão. Foi o que
ele fez, e voltou a treinar após três meses. Exatamente nessa época,
teve que voltar ao Brasil para tentar
resolver problemas com seu
visto americano
- o de turismo havia expirado. Foi para Curitiba, na casa do cunhado, e
treinou com Cristiano Marcello por dois meses na CM System. Veio o
primeiro TUF Brasil, e Vitor tentou a sorte, mas sequer chegou à parte
das entrevistas e não passou na seletiva. Mais um baque, que o fez
pensar em parar novamente. Precisava de sucesso o mais rápido possível.
- Eu estava sentado no
hall do hotel
onde teve a seletiva, chorando, aí um funcionário da Team Nogueira, que
havia levado alguns atletas, falou comigo: "Vitor, não desanima. Estou
aqui em nome do Rodrigo (Minotauro) e do Rogério (Minotouro) para te
convidar a fazer parte da equipe. O Pezão, na época em que me ajudou, já
tinha falado de mim para o Minotauro. E eu tinha passado uma semana
ajudando o Minotauro para a luta contra o Frank Mir, e ele gostou do meu
treino. Cheguei em Curitiba e na mesma hora fiz as malas para morar no
Rio.
A gravidez foi difícil, principalmente quando ela descobriu que era uma
menina, porque ela (a esposa, Paula) queria outro menino. No fim das contas, a gente viu
como foi importante ser uma menina, para não ter comparações
Vitor, sobre a filha Nina Vitória
De
volta à Cidade Maravilhosa, Vitor primeiro passou um tempo na casa de
um primo, no Flamengo. Os irmãos Nogueira o ajudaram ainda mais,
alugando um apartamento para o casal, bancando alimentação e até
comprando móveis. Aos poucos esse investimento foi diminuindo, e Vitor
foi melhorando sua situação financeira. No início de 2013, Minotauro o
convidou para ser seu treinador auxiliar no TUF Brasil 2, onde pôde
mostrar muito de sua técnica. E no fim do ano, Vitor foi aprovado para o
TUF Brasil 3, na categoria dos pesados. Venceu a luta das eliminatórias
e entrou na casa. Em meio à sua participação, nasceu Nina Vitória, que
está com quatro meses de vida, e que foi importante para o
"renascimento" principalmente da esposa.
- A gravidez foi
difícil, principalmente quando ela descobriu que era uma menina, porque
ela queria outro menino. No fim das contas, a gente viu como foi
importante ser uma menina, para não ter comparações. Se fosse um menino,
talvez a Paula ficasse comparando como ele seria, como o Igor era. É
outro amor, outra criança, outra personalidade. O mais importante que
fez minha mulher reviver é o amor de filho, que ninguém pode substituir.
Eu não posso substituir, nem os pais dela, nem os amigos, nem ninguém.
Ela tinha que ter um filho de novo para receber esse amor de filho e dar
o amor de mãe. Ela sente muito ainda, tem muitos momentos tristes, mas
renasceu. É outra vida - declarou.
Na noite deste sábado, Vitor
Miranda poderá dar um presente a Nina Vitória, à esposa, a ele próprio e
até mesmo à memória do filho Igor. Após nocautear em seus dois duelos
na casa, o lutador se classificou para enfrentar Antônio Carlos Júnior, o
"Cara de Sapato", na final peso-pesado do TUF Brasil 3, onde o vencedor
será declarado campeão do reality show e ganhará um contrato com o UFC,
o que simbolizaria a realização de um sonho e mais uma nova etapa na
vida dele. O evento terá transmissão ao vivo do canal Combate, e o
Combate.com acompanha tudo em Tempo Real.