A véspera da partida mais esperada do Campeonato Brasileiro para o
torcedor botafoguense foi marcada por uma entrevista coletiva bastante
franca com Seedorf, no Engenhão. Na tarde desta terça-feira, vários
assuntos foram abordados pelo camisa 10, que em momento algum ficou em
cima do muro ou fugiu das indagações. As críticas sobre a arbitragem e o
calendário do futebol do país chamaram a atenção. Com o foco no duelo
contra o Cruzeiro, o holandês minimizou o teor decisivo ao afirmar que
são três pontos em jogo, como em qualquer outro confronto.
Seedorf inclusive agradeceu quando o assunto árbitros veio à tona. Para
o jogador, os homens do apito estão deixando de marcar infrações quando
ele é o protagonista no lance. Sobre a maratona de jogos adotada no
Brasil, o meia classificou como desumano o esforço feitos por alguns
times que recentemente chegaram a jogar tanto na terça, quanto na
quinta-feira de uma mesma semana.
Sem fugir de nenhum tema, Seedorf atacou a arbitragem brasileiro em coletiva (Foto: Globoesporte.com)
Até a Copa do Mundo de 2014 entrou na pauta. Deixado de lado nas duas
últimas edições pela seleção holandesa, em 2006 e 2010, o ídolo
botafoguense fez questão de afirmar que não deixou de vestir a camisa da
Holanda por vontade própria. Ele não soube explicar as razões de ter
ficado fora, por isso prefere voltar as suas atenções ao Botafogo para
esquecer as mágoas com a sua equipe nacional.
Duelo com cara de final?
Nosso objetivo é de chegar ao fim do ano em primeiro lugar. Sabemos que
é um jogo maravilhoso, entre os dois primeiros colocados. Tem esse
valor. Mas são três pontos como todos os jogos. Então vamos enfrentar
esse jogo como todos os outros, com uma atenção pela frente por ser o
líder, por estar lá em cima junto com a gente por mérito. Será uma
partida muito boa para jogar e também para ver. Estamos fazendo o mesmo
trabalho. É apenas externamente que pensam assim (como uma final).
Ninguém da comissão técnica pensa que é o jogo decisivo do campeonato.
Não é. É mais um jogo, e nós vamos ao menos tentar manter a diferença de
quatro pontos. Depois vamos continuar somando.
Elenco do Cruzeiro
Não estou aqui para analisar o Cruzeiro. Já passou metade do
campeonato, e todo mundo conseguiu ver esse time. Tem um elenco
importante, muitos jogadores, peças de trocas. Respeita muito por terem
construídos resultados
Perseguido pela arbitragem?
Sinto uma diferença de desde que cheguei aqui até essas últimas oito
rodadas. Está difícil apitarem faltas para mim. Nos últimos quatro
jogos, por exemplo, levei sempre mais pancada sem bola e não conseguia
me proteger. Eles (marcadores) entram de maneira excessivamente forte, e
não sei por que a arbitragem mudou a postura. Não sou um jogador de
cair. Contra o Corinthians, com um pênalti feito, fiquei em pé. Se puder
ficar em pé, eu fico. No último jogo (contra o Santos), teve uma falta
claríssima que o cara caiu em cima de mim, e disseram que me joguei. Os
árbitros têm que rever, porque não estou vendo justiça nos meus lances.
Estou também recebendo mais amarelos do que nos quatro anos em que
joguei no Milan. Três foram justos porque foram faltas parando
contra-ataque. Os outros são discutíveis. Todo jogo estou falando com
eles, perguntando “por que isso?”, e não estou entendendo. Se não pular
ou me proteger, fica complicado. Os jogadores estão vendo que não estão
marcando falta, aí vêm com tudo. Não é um arbitro só, são todos. Espero
que essa tendência pare, estou sinceramente muito irritado com isso.
Estou mais preocupado com a entrada do jogador, porque eles sabem que é o
Seedorf que está lá e (os árbitros) não vão apitar.
Não consigo nem reclamar, porque eles (árbitros) me olham de uma
maneira diferente. Se eu falo alguma coisa, eles já sacam o cartão.
Então eu fico quieto, tomando pancada, o que tira o valor do meu jogo.
Espero que mude, senão vou ter que cair, como gostam aqui. Cair, pedir
cartão, essa coisa toda".
Seedorf, sobre reclamação contra a arbitragem
Ex-colega de Milan como exemplo
Disseran que com o Ronaldinho (Gaúcho) foi assim também. Quando é falta
tem que ser marcada, não é porque é sobre o Ronaldinho ou o Seedorf que
não vai marcar. Ele também sempre quer ficar em pé, mas tem horas que
não dá. Jogadores como ele e como eu têm que ser protegidos mesmo. Se o
zagueiro puder para os jogadores com violência, aí fica difícil. Gosto
quando jogam duro comigo, até já falei isso, mas somente quando vêm para
cima da bola.
Estou bastante movido por essa falta de justiça. Nunca falei porque
achava que ia piorar as coisas. Não consigo nem reclamar, porque eles
(árbitros) me olham de uma maneira diferente. Se eu falo alguma coisa,
eles já sacam o cartão. Então fico quieto, tomando pancada, o que tira o
valor do meu jogo. Espero que mude, senão vou ter que cair, como gostam
aqui. Cair, pedir cartão, essa coisa toda.
Calendário do futebol brasileiro
Tem de ser revisto, com certeza. Temos bastante coisa para rever no
Brasil. É desumano, ninguém aguenta. Por isso tem tanto infortúnio,
tanta gente machucando. O trabalho que fazemos no Botafogo é muito
importante, mas o calendário não favorece o espetáculo. Já foi falado
por vários jogadores, vários reclamam disso. As viagens também são
bastante desgastantes. O que São Paulo e Santos, entre outros, fizeram
na última semana... Não vou falar porque depois pode trazer problema.
Mas é complicado, jogar de novo em dois dias é pedir para ter problemas.
Se não é diretamente que afeta às equipes, vem mais para frente.
Lance com goleiro do Corinthians virou argumento de defesa do meia (Foto: André Durão/Globoesporte.com)
Copa do Mundo e mágoa com seleção holandesa
Claro que posso jogar (em 2014). Estou jogando aqui no Brasil. Perdi
dois Mundiais, minha relação com a seleção holandesa é uma coisa bem
particular. Em 2006 e 2010 eu queria participar, só que levaram outros
jogadores que atuavam em times pequenos na Holanda. Claro que fiquei
muito triste naquela época. Eu não podia fazer mais do que fazia no
Milan, e não posso fazer mais do que estou fazendo aqui. Meu objetivo é
aqui no Botafogo, e o resto é problema deles. Nunca falei que não queria
jogar mais pela seleção. Mas tenho um desafio muito grande agora no
Botafogo, que está me dando tudo o que preciso.
Treinadores europeus olham pouco para o Brasil?
Não sei, mas também não quero me colocar junto com o Petkovic (apontado
pela imprensa como eferência de estrangeiro bem-sucedido, mas que não
teve oportunidades na seleção da Sérvia). Eu estava jogando no Milan, em
2006 estava no topo, em 2010 também. Foram quatro anos sem ser
convocado, então tinha uma coisa por trás que não sei. Politica, não sei
o que é. Técnico, cada um tem sua explicação. Não é a mesma situação.
Meu caso foi particular, mas estou tranquilo, já aceitei, passou já. Não
me deram a possibilidade de mostrar o valor em alguns momentos. Quero
inclusive mandar um abraço ao Petkovic, que é um grande amigo, uma
grande pessoa (jogaram juntos por uma temporada no Real Madrid).
Claro que posso jogar (em 2014). Estou jogando aqui no Brasil. Perdi
dois Mundiais, minha relação com a seleção holandesa é uma coisa bem
particular. (...) Nunca falei que não queria jogar mais pela seleção
(...) Foram quatro anos sem ser convocado, então tinha uma coisa por
trás que não sei. Politica, não sei o que é."
Seedorf, sobre mágoa com seleção da Holanda
Retorno de Lodeiro e peças no elenco
Ele foi embora? (risos). Lodeiro é importante para nós como todos os
outros são. Todos têm de se sentir importantes, o próprio Gegê que
entrou bem também, todos que vão entrando têm que sentir. Quem joga
menos sempre faz a diferença. Treina com determinação, fica pronto,
entra e dá conta do recado. Para o Lodeiro foi importante descansar. Ele
jogou pelo Uruguai 45 minutos, voltou e jogou aqui contra o
Corinthians. No fim, a suspensão foi boa para ele voltar com energia.
Sistema defensivo e entrada de André Bahia
A defesa são os onze jogadores que jogam. Ataque também são onze (neste
momento, Seedorf é perguntado sobre a saída de Dória e a entrada de
André Bahia, criticado por parte da torcida após gol contra feito contra
o Goiás) Não lembro de ele ter sido contestado pela torcida. Não dá
para falar pela torcida. A torcida não falou nada, ele foi elogiado pelo
que fez. Que zagueiro nunca fez gol contra? Bahia é um grande jogador
do nosso elenco. Joga menos, mas não tem um treino que ele não vá bem.
Fez um grande jogo contra o Goiás, mas acontece. Errei um gol também
outro dia, não dá para ficar falando até hoje. Toda vez que ele entrou
foi bem, é um dos jogadores mais importante do nosso elenco.
Campeonato equilibrado por cima ou por baixo?
Acho que no Brasil tem mais técnica que em qualquer outra parte do
mundo. O (jogador) brasileiro é técnica. Você fala nele e pensa nisso,
não em gente que só corre. O Campeonato Brasileiro é principalmente
técnico. Na Inglaterra é difícil, na Espanha tem técnica também, mas é
diferente, com tática um pouco mais importante. Na Itália é tudo muito
tático. Não significa também que não tenha outros aspectos. Na Europa
vale muito menos isso, e aqui você vai numa jogada e é driblado pelo
zagueiro. Ele vem, dá o drible e faz um passe, isso é mais difícil de
ver na Europa. Os laterais têm capacidade para fazer pressão, menos que
na Europa. Lá não existe essa capacidade, a diferença é a tática. Acho
que o Brasil tem um campeonato muito difícil, disputado e equilibrado,
diferente dos outros países.
(*) Thiago Benevenutte, estagiário, sob supervisão de Bernardo Eyng