Melhor técnico do mundo, Rafael Cordeiro quer academia no Brasil
Paranaense fala sobre início da carreira, sua participação em filme nos EUA, livro de Anderson Silva e conta bastidores do Pride
Por Adriano Albuquerque e Marcelo Russio
Fortaleza
13 comentários
Quem olha para o paranaense Rafael Cordeiro, sempre de sorriso aberto e
solícito com fãs e jornalistas de todo o mundo, não pode imaginar a
história desse ex-lutador de 40 anos, treinador de MMA desde 1999 eleito
o melhor do mundo em 2012. Discípulo da tradicional Chute Boxe,
pendurou as luvas em 1999 e, tempos depois, encarou o desafio de ir para
os EUA montar a sua própria academia, a Kings MMA, que hoje possui oito
atletas no UFC. Com uma longa história no MMA nacional, como atleta e
treinador, foi o mentor de Wanderlei Silva em sua época áurea no Pride, e
hoje treina Fabrício Werdum, um dos melhores pesos-pesados do mundo,
entre tantos outros lutadores.
Em uma conversa de quase uma hora com a equipe do Combate.com no hotel
em que estavam hospedados os atletas e membros das equipes que
participaram do TUF Brasil 2 Finale, em Fortaleza, Rafael Cordeiro falou
sobre sua trajetória no mundo da luta, a participação no filme "Here
comes the Boom" com seu aluno, o ator Kevin James, relembrou bastidores
do Pride, não fugiu de temas polêmicos como o uso de TRT entre os
atletas de MMA e o livro de Anderson Silva, no qual o campeão dos médios
do UFC deu a sua versão sobre seus tempos de Chute Boxe e revelou
planos de abrir franquias da Kings MMA no Brasil.
Rafael Cordeiro projeta franquias da Kings MMA no Brasil (Foto: Adriano Albuquerque)
Confira a íntegra da entrevista:
INÍCIO NAS ARTES MARCIAIS
- Comecei nas artes marciais em 1986, treinando tae-kwon-do em
Curitiba, com o mestre Daniel Lee, em uma academia perto de onde eu
estudava. Daniel Lee era um professor muito famoso na época, com uma
flexibilidade e capacidade de chute muito grandes, e eu tinha 11 ou 12
anos. Fiquei por quase dois anos lá. Um dia passei em frente à Chute
Boxe e vi um exército chutando colchonete, dando joelhada, e eu nunca
tinha visto aquilo. Decidi que queria treinar aquilo, e passei a treinar
lá em 1987. Não parei nunca mais.
CHEGADA AO VALE TUDO
- Nosso primeiro vale tudo surgiu em um atrito que teve entre o Pelé e o
pessoal da capoeira. Eles desafiaram a nossa academia para fazer a luta
e a gente não tinha noção do que era o vale tudo. Pra gente era briga, a
gente era muito garoto, brigava bastante mesmo, então estava em casa.
Seria mais uma briguinha só. Depois passamos a treinar muito o
muay-thai, o bloqueio de entradas, pra não deixar os caras nos botarem
pra baixo, até porque naquela época em Curitiba não havia um professor
somente de jiu-jitsu para MMA. Então nós mesmos passamos a desenvolver
uma técnica que nos permitisse anular as tentativas de quem quisesse nos
botar pra baixo. E aí surgiu a nossa técnica, que vem sendo lapidada
até hoje. O mais importante, desde aquela época, era a disposição para
lutar, que todos nós tínhamos. Só adaptamos a técnica para o MMA.
Fabrício Werdum e Rafael Cordeiro em treino na Kings MMA (Foto: Divulgação)
MUDANÇA PARA OS EUA
- Minha chegada aos EUA foi difícil. Eu saí de Curitiba, da Chute Boxe,
com 350 alunos em um ponto nobre de Curitiba, na Praça do Japão. Saí de
lá com apartamento, academia, vida estabelecida, para começar
praticamente do zero, com a minha esposa, as minhas filhas e dois
faixas-pretas que me acompanharam. O primeiro ano foi muito difícil. Fui
para lá com uma ideia que surgiu em Curitiba de montar um CT da Chute
Boxe lá. Tínhamos um investidor certo, mas que na última hora deu pra
trás. Eu sabia que o mercado americano, que já era grande, estava
começando a ficar imenso, e era o momento. Tive que começar na humildade
tudo de novo, com uma academia pequena, em um espaço mínimo. Logo no
primeiro ano eu montei a Kings MMA, sabendo tudo o que iria passar para
voltar a ser grande. Tive coragem pra poder fazer isso. Agora tenho a
autonomia de fazer as coisas do jeito que eu acho certo. Não que não
tivesse isso na Chute Boxe, mas lá era diferente, porque ela é do mestre
Rudimar Fedrigo. Ele é o fundador e eu queria ter a possibilidade de
fazer a minha academia. Hoje tenho oito lutadores dentro do UFC. Cheguei
nos EUA sem nada, sem falar inglês, só com a disposição de dar aula. Eu
até tinha um nome por causa do Pride, mas o Pride ainda não era tão
conhecido lá. Algumas pessoas me conheciam, mas não havia uma
referência.
A KINGS MMA E O PROJETO DE FRANQUIAS NO BRASIL
- Não podia imaginar que chegaríamos tão longe com a Kings MMA. Comecei
treinando na Chute Boxe, que era muito forte, fui aluno, instrutor,
competidor, representei a academia, terminei invicto no muay-thai em
quase 30 lutas. Depois virei mestre, montei minha própria escola, que
foi indicada a melhor do ano, eu fui escolhido o melhor técnico do ano.
Acho que estou cumprindo dentro das artes marciais todos os pontos para
chegar aonde cheguei, e quero chegar muito mais longe ainda. Meu sonho é
abrir várias escolas Kings MMA no Brasil para difundir o nosso
conhecimento e a nossa metodologia de ensino. Se Deus quiser, isso logo
vai acontecer. Quero abrir as academias em forma de franquia, claro, mas
tendo dentro de cada uma professores faixas-pretas meus. Não vender a
marca para quem não tenha passado pelo que eu acho importante. Não posso
prostituir aquilo que eu construí. Eu sou da galera da velha guarda,
cresci num ambiente de porrada mesmo, não tinha essa. Crescemos fortes
nesse sentido. Não posso vender o nome para um cara que não tenha esse
espírito forte que foi formado. Formei vários faixas-pretas na carreira.
Quando montar o sistema de franquias no Brasil, será com professores
oriundos dessa filosofia. Hoje a Kings MMA tem oito atletas que fazem a
diferença dentro do UFC. O Werdum está na boca de disputar o cinturão. O
Jake Ellenberger logo também deve estar, o Ian McCall começou a treinar
conosco agora, Mark Muñoz, Rafael dos Anjos... É uma gama muito grande
de atletas. Hoje os EUA são uma grande meca. É como a Chute Boxe era no
tempo do Pride.
PARCERIA COM FABRÍCIO WERDUM
- Logo no primeiro ano nos EUA o Fabrício Werdum me acompanhou. Ele me
ligou e disse que queria ir comigo pra lá, pra ficar mais próximo da
família, porque ele morava em Porto Alegre e ia toda semana para
Curitiba para treinar. Tenho muito orgulho do Werdum, que é um seguidor
fiel, fez uma bela transição do jiu-jítsu para o MMA e é merecedor de
todo tipo de vitória que aconteça na vida dele. Acho que o Werdum está
muito próximo de disputar o cinturão do UFC, sempre respeitando demais o
Minotauro, que nem tem o que falar. Pra você ver, eu dou aula dentro da
Black House nos EUA. Temos um bom relacionamento. Cabe a mim realizar o
sonho do Werdum de disputar o título. O sonho dele virou o nosso sonho,
e não vamos medir esforços para que isso aconteça. É o desejo de chegar
ao que é mais sagrado na luta, que é o cinturão. Quem disser que não
quer lutar pelo cinturão mente. Todo mundo quer o cinturão. Se não
pensar assim, não merece estar no UFC.
Fabricio Werdum conversa com Rafael Cordeiro: (Foto: Getty Images)
+ Combate.com: confira as últimas notícias do mundo do MMA
A ÉPOCA DO PRIDE
- O Pride tem uma diferença grotesca pro UFC. Tinha aquela coisa do
Japão, da filosofia das artes marciais, eles dão ênfase à academia que o
lutador representa, ao treinador. Eles faziam um filme, resgatavam a
história de cada atleta na arte marcial. Nos EUA o atleta é tratado como
produto, e no Japão ele é um discípulo de um templo que se destacou na
sua arte marcial. É uma história sendo contada. Foi uma coisa
sensacional. Eles gostavam de ver a luta do ponto de vista de ver a
técnica fluir. Eles torcem para os dois lutadores. Se um atleta faz um
movimento bonito, eles aclamam. Fico triste do Japão não ter evoluído
nessa parte técnica. Eles ficaram para trás, lamentavelmente. Não sei
dizer o que houve, mas eles pararam. Na época da Chute Boxe nós perdemos
para alguns japoneses que eram duros, muito bons de chão. Acho que o
tempo que eles ficaram sem competir fora do Japão fez diferença. Lutar
nos EUA é diferente. Lá é a Fórmula-1. Tudo acontece muito rápido, e se
não evoluir, você dança. O que eu senti nos EUA e que não tinha no Japão
era a necessidade de se ter um produto. O lutador é um produto, e tem
que mostrar o que ele tem. Tem um pessoal por trás dele, mas ele é o
cara. Acho que essa foi uma grande diferença.
LUTA INESQUECÍVEL
- Fui 50 vezes para o Japão e vivemos várias coisas lá, mas a segunda
luta do Wanderlei contra o Rampage foi muito forte. Aquela luta foi uma
coisa incrível. O primeiro round terminou com o Rampage por cima do
Wanderlei, botando pressão no chão, aquela loucura toda. Na volta, foi
aquele nocaute espetacular. Foi uma luta muito marcante, por ter sido um
bicampeonato, pela história, quase um filme. Os caras se empurrando, o
Wanderlei subindo ao ringue, desafiando e gritando "Eu sou o campeão!"
Não tinha nada programado. O Wanderlei, louco como ele é, subiu lá e fez
aquilo. Nesse dia, eu lembro que o Rampage ia saindo, e o Wanderlei
subiu, pegou o microfone e falou que era o campeão. Os caras foram
rápidos em fazer uma camiseta com a foto da cena. Usaram aquilo da
melhor maneira para contar a história da luta. O Pride tinha dinheiro,
eles produziam bem o show. Se não tivesse acabado o dinheiro deles, nós
estaríamos lá até hoje. Não sei se faltou mais intercâmbio para os
japoneses, depois, evoluírem. Eu dou aula para bastante japoneses, como
Caoru Uno, Kid Yamamoto, Mizuno Hirota... Antigamente tinha 15 bons
japoneses no mínimo, e hoje não, o que é triste, porque se chegamos
aonde chegamos hoje, foi muito por causa do Japão, pela exposição que
eles nos proporcionaram.
Segundo duelo entre Wanderlei Silva e Rampage no Pride marcou Rafael Cordeiro (Foto: Getty Images)
CHEGADA DO MERCADO AMERICANO
- Naquela época o Japão dominava por ter muito dinheiro, investiam
muito e mantinham as estrelas lá por muito tempo. Foram mais de 50
eventos entre Pride e Pride Bushido. Nesse período, o americano estava
se preparando fisicamente nos EUA. Eles se tornaram mais atletas, com a
preparação física forte do wrestling. Hoje todo mundo faz preparação
física, mas eles faziam desde sempre, principalmente os wrestlers, que
treinam desde os quatro anos de idade. Nesse período do Pride, os
americanos estavam vivos, mas sem tanta oportunidade de se integrarem ao
Japão como os brasileiros, e vinham trabalhando fisicamente. Nós não
víamos o que acontecia nos EUA porque o foco era o Japão, mas eles
estavam bem preparados. Aquela luta do Shogun contra o Forrest Griffin,
que foi o nosso batizado no UFC, ninguém esperava o que aconteceu. A
gente achava que o Shogun ia matar aquele cara, porque ele estava
treinando demais. Mas a parte atlética do Griffin fez a diferença. Não
foi nem a técnica. Os americanos ganharam na parte física. Se você for
ver, os caras que entraram no UFC vindos do Pride morriam no gás
rapidamente, não estávamos acostumados com aquela exigência física. O
ringue de cordas te dava pausas durante as lutas. O octógono, não. Ele
não te dá tempo para parar e voltar para o meio, respirar. É luta o
tempo todo.
LUTA CONTRA RUMINA SATO
- Rumina Sato quase me quebrou o joelho. Naquela época, em 1999, eu
estava voando na Chute Boxe, nem queria saber quem era o cara. "Rumina
Sato? Demorou, vamos lá! Ver vídeo? Que nada! O que ele faz? É
finalizador? Aqui não! Vou quebrar esse japa!" Você vê o que é a
prepotência e a arrogância. Deveria ter estudado, me preparado... Enfim,
eu estava aquecendo para entrar e no telão passaram os meus highlights,
e depois vieram os dele. Ele aparecia dando armlock voador e tudo, e eu
pensei: "Aqui ele não faz isso de jeito nenhum!" Eu era faixa roxa de
jiu-jítsu, e fui muito no coração. Achava que ia sair na mão, matar as
tentativas de queda e arrebentar ele. Comecei a luta indo pra cima, ele
foi na minha perna e estourou o meu joelho. Faltavam 11 dias para o meu
casamento. Cheguei com o joelho inchado e o pastor mandando ajoelhar
para casar. Eu fiquei com um joelho direito no chão e o esquerdo
erguido. Essa é a lembrança que eu tenho do meu casamento. O Rumina Sato
participou do meu casamento (risos).
WANDERLEI X SAKURABA
- Sempre foi uma honra lutar contra o Sakuraba porque ele sempre foi
muito respeitoso. Uma coisa legal na primeira luta foi a coletiva de
imprensa. Todos os repórteres japoneses lá, muito diferente de como é
nos EUA. Aquele silêncio, todos de terno e o Wanderlei com aquela cara
de psicopata do lado dele (risos). O Sakuraba nem olhava pro Wanderlei,
só para os jornalistas. Ele respondendo as perguntas dizendo que
esperava fazer uma excelente luta, Wanderlei é um grande atleta, aquelas
palminhas contidas dos japoneses, aquele negócio todo. Aí vem a mesma
pergunta pro Wanderlei. Ele vira e responde: "Quero dizer que estou
muito bem preparado, e quero uma ambulância na porta do estádio."
Traduziram pro Sakuraba, e ele fez aquela cara de surpresa, arregalou o
olho e tudo. Todo mundo fez aquele "Oh!". Eu não acreditei que ele falou
isso. E dito e feito. Na segunda luta, a mesma coisa. O Sakuraba
dizendo que esperava fazer uma boa luta, igualzinho. O Wanderlei me
manda essa: "Espero fazer uma boa luta e quero dizer que, quando ele
chegar em casa, a mulher dele vai achar que ele é visita." Os caras
traduziram isso, e o nosso manager, o Kawasaki, disse pra gente não
falar isso, porque ele tem duas filhas (risos). Eles achavam que o
Wanderlei ia matar o Sakuraba. O japonês tem uma inocência e uma pureza
muito grandes. Eles queriam que um japonês ganhasse do Wanderlei, mas
enquanto não surgia um, que o Wanderlei vencesse.
Combates entre Wanderlei Silva e Kazushi Sakuraba também entraram pra história (Foto: Reprodução)
LIVRO DE ANDERSON SILVA
- Os fatos que o Anderson retratou no livro dele aconteceram há 21
anos. Ele mostrou ali um sentimento que estava guardado. Foi uma
surpresa para todos, mas é algo que cabe a ele. Se ele ficou na academia
depois de tudo o que aconteceu, é sinal que tudo o que ele aprendeu ali
valeu para o resto da vida. Nas entrevistas, 21 anos depois, ele diz
que, vindo de onde ele veio, ele está acostumado a pressão. Até hoje ele
salienta que a passagem dele pela Chute Boxe fez diferença.
Independente do que aconteceu, o resultado foi um cara com a mente de
aço, pronto para o que vier pela frente. Não fiquei surpreso, porque as
pessoas não são o que você quer que elas sejam. O Anderson é um grande
atleta, sensacional, tenho um bom relacionamento com ele. Éramos muito
jovens na época. Cada um foi para o seu lado, mas o saldo daquela época
foi um espírito forte e que deu resultado. Se ele chegou até onde chegou
hoje, é porque a base do espírito dele foi preparado para qualquer tipo
de batalha, dentro ou fora do ringue. Eu saí da Chute Boxe faz três
anos, e nunca diria para você que uma vez um cara me deu um chute, outra
vez um cara me deu um soco. Era o sistema da academia, antigamente era
assim. Eu tomei tanta porrada lá, que se for falar faço dois livros
(risos). Um monte de gente me bateu na academia. O sistema era assim. Na
verdade eu nem li, mas me decepcionei com o que eu ouvi, claro. Nem
quis ler. Você convive com uma pessoa por tantos anos e um dia a pessoa
vem e solta um negócio desses? Qual o sentido disso? Então era algo
falso? Se você é casado e separa, tempos depois vem dizer que não
gostava da sua mulher, que traía ela? Então não era uma coisa
verdadeira. Eu nunca dependi do Anderson, sempre tive muitos atletas,
trabalhei bastante. Decepção mesmo é quando você depende totalmente da
pessoa e ela te dá uma dessa. Quando você não depende, a pessoa
simplesmente mostra um lado dela que é dela, e que ninguém vai mudar.
Isso é dele. Hoje a gente treina, ele vai à minha academia. Acredito que
não haja nenhuma mágoa, porque se ele me procura até hoje, é sinal que o
que eu ensinei deu resultado.
BRIGAS EM NOME DA HONRA DA ACADEMIA
- Desde a era Gracie, várias coisas foram importantes para o esporte
chegar aonde chegou. Não vamos ser hipócritas aqui. Os Gracie defendiam a
honra deles, e nós, da Chute Boxe, defendíamos a nossa honra também. Se
fosse para brigar, nós brigávamos mesmo, porque era ahonra da academia,
dos nossos amigos, dos nossos mestres. Na época em tinha 17, 18 anos,
hoje estou com 40. Há 22 anos nós defendíamos a honra da academia, Era
matar ou morrer no sentido de homem-bomba. Nós nos jogávamos de cabeça e
fazíamos qualquer coisa pela academia. Isso foi importante. Não digo
que se tenha que fazer balbúrdia. A gente não entrava arrepiando hotel
(risos). O que acontecia era de homem para homem, para resolver um
atrito da forma de antigamente. Hoje é ridículo fazer uma coisa dessas,
mas na época era assim. Não só na nossa academia como em todas as
outras. A Chute Boxe tinha um foco grande em cima dela, porque era muito
grande. Nós nunca tivemos muito medo da verdade, o sulista é muito
sincero e muito franco. A gente via muito cara vaselina, que nas
competições de abraçava e se beijava, e por trás falava mal do outro.
Nós, não. Não abraçávamos nem beijávamos ninguém. Era a Chute Boxe, o
nosso time e pronto, pra evitar essa imagem de falsidade. Todas essas
brigas e confusões que aconteceram no passado foram necessárias para o
esporte chegar aonde chegou. Não era bonito, mas era a honra da academia
que tinha que ser protegida. Olhando para trás, vendo o lado romântico,
era bonito de ver o amor que existia. Não tinha dinheiro. Era a honra
da academia, do seu professor. A galera era robô daquilo, era um
exército. Foi necessário para se criar a metodologia de fidelidade à
escola.
LUTADORES X FANFARRÕES
- Vou te dar o exemplo do Besouro. Um atleta excelente, grande lutador,
que trabalha de motoboy. Pela experiência dele e pelos combates que já
fez, deveria estar em uma situação melhor. Poderia só viver da luta, mas
infelizmente ainda não pode. A gente que é de verdade sabe quem é de
verdade e quem é de mentira, como diz a música. A gente sabe quem
precisa e quem vive esse sonho. Como em qualquer outro emprego, vai ter
os fanfarrões e os verdadeiros. Tem aquela galera que precisa e luta por
R$ 50, e mata ou morre por esse dinheiro, porque sabe que esses R$ 50
podem virar R$ 100 e, um dia, quem sabe, pode estar ganhando um milhão.
Mas o sacrifício vem dos que não são os fanfarrões do esporte.
Rafael Cordeiro se decepcionou com relatos de Anderson Silva em seu livro (Foto: Reprodução/Twitter)
PARTICIPAÇÃO NO FILME "HERE COMES THE BOOM"
- Eu dou aula particular para o Kevin James há muito tempo. Ele mora em
Encino, perto de Hollywood, e é meu aluno. Um dia ele me disse que
precisava emagrecer porque ia fazer um filme em que eu seria um lutador,
e falou para eu me preparar porque eu iria lutar no fime também. Até
brincou que iríamos lutar no filme, e ele descontaria tudo o que eu bati
nele nas aulas. E surgiu dali a ideia. Foi muito bom, porque no filme
ele fez questão de botar o meu nome como Rafael Cordeiro mesmo, para dar
moral. Todos tinham pseudônimos, mas o meu nome era o real. Fiquei
gravando uma semana no frio de Boston. E eu e o cara da luta final fomos
os únicos que fizeram três rounds com ele. Todos os outros acabaram
antes, mas comigo ele fez questão de fazer uma cena que dura dois ou
três minutos, que é muita coisa. O Kevin é muito forte. Gordinho, mas
bate duro. Já me deu knockdown em treino (risos). Saí na mão com ele na
aula, e ele acertou uma que eu tive que colar na perna dele. Pensei:
"Meu Deus, senti!" (risos). O cara tem 120kg, e eu tenho 85kg. Mas isso é
normal, somos professor e aluno. Um dia ele baixou a cabeça e largou o
braço. Só lembro de estar agarrado nas pernas dele, querendo saber aonde
estava (risos).
ENTRADA DO MMA REAL NO CINEMA
Esses dias eu estava vendo um filme do Arnold Schwarzenegger, que está
com quase 70 anos de idade. Na cena final ele sai na mão com o bandido,
entrando com uma baiana, botando o cara pra baixo, o cara dando um
armlock nele, ele defendendo direitinho, levantando e dando um pilão no
cara, o cara indo pra um triângulo. Eu vi que, ali se quebrou uma grande
barreira. As coreografias de filmes a gente sabe que não existem. Mas
filmes como "Here comes the boom", que mostram a realidade, fizeram a
diferença. Depois do lançamento do filme, teve muito mais alunos na
academia, porque finalmente viram a realidade da arte marcial, com
octógono, juiz, público, tudo.
MMA FEMININO
- Acho que o MMA é um esporte que, como todos os outros, merece ter a
participação feminina. Temos várias atletas na academia, a Jessica
Penne, que foi campeã do Invicta, muito dura. A Cris Cyborg vai fazer
treinos com a gente. Não sou machista nesse sentido. Quanto mais
mulheres, crianças praticarem, mais o esporte vai crescer. Se quisermos
fazer do esporte o número um do mundo, temos que incentivar as mulheres a
participar. Tem um monte de meninas aí que luta melhor que muito homem.
As meninas do UFC tem mostrado mais técnica e vontade que muito cara
não mostra.
Cris Cyborg vai treinar com Rafael Cordeiro na Kings MMA (Foto: Esther Lin / STRIKEFORCE)
POLÊMICA SOBRE O TRT
- Acho que fica muito desigual. Um atleta que tem condições de se
abastecer de substâncias que uma grande maioria não pode, faz a coisa
ser injusta. A regra tem que ser igual para todos. Pode não haver a
mesma igualdade técnica, mas física, sim. Fazendo TRT você está burlando
a lei. Cada um pensa de um jeito, mas quanto mais parelhas ficarem as
coisas, melhor. Não vejo com bons olhos isso porque aquele que não tem
condições acabam ficando em desvantagem em relação aos que conseguem se
abastecer da ilegalidade. Muitos atletas usam, e nunca vai se saber qual
o limite do que foi usado. Dizem que tem uma taxa X, mas a gente sabe
que não é assim. A partir do momento que está liberado, tem cara que vai
se encher dos produtos e vai chegar diferente na luta. É mais justo que
não haja.
TUF Brasil 2 Finale
8 de junho de 2013, em Fortaleza
CARD PRINCIPAL
Rodrigo Minotauro x Fabricio Werdum
William Patolino x Léo Santos
Thiago Silva x Rafael Feijão
Erick Silva x Jason High
Daniel Sarafian x Eddie Mendez
Rony Jason x Mike Wilkinson
CARD PRELIMINAR
Raphael Assunção x Vaughan Lee
Godofredo Pepey x Felipe Arantes
Ildemar Marajó x Leandro Buscapé
Rodrigo Damm x Mizuto Hirota
Caio Magalhães x Karlos Vemola
Antônio Braga Neto x Anthony Smith