Torcedores do Corinthians libertados na Bolívia chegam a São Paulo
Justiça boliviana solta últimos cinco torcedores que
estavam presos em Oruro enquanto eram investigados pela morte de um
garoto de 14 anos
Por Maria Clara Ciasca
São Paulo
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Cleuter Barreto Barros, no desembarque em
Guarulhos (Foto: Maria Clara Ciasca )
Após 156 dias presos na Penitenciária de San Pedro, em Oruro, os cinco
corintianos libertados na última sexta-feira, pela Justiça da Bolívia,
chegaram a São Paulo no início da tarde, no Aeroporto de Cumbica, em
Guarulhos. São eles: Cleuter Barreto Barros, Leandro Silva de Oliveira,
José Carlos da Silva Júnior, Marco Aurélio Nefreire e Reginaldo Coelho.
Eles e
outros sete, libertados em junho,
eram acusados da morte do garoto Kevin Espada, atingido por um
sinalizador marítimo durante jogo entre Corinthians e San José, no dia
20 de fevereiro, pela primeira fase da Libertadores. A defesa dos 12
sempre alegou que eram todos inocentes. Um menor, de 17 anos,
assumiu a autoria do disparo em depoimento à Vara da Infância e da Juventude de Guarulhos, onde vive, e também no Consulado da Bolívia em São Paulo, mas ainda aguarda o julgamento do caso em liberdade.
O menor H.A.M., que assumiu a autoria do disparo, queria ir ao
aeroporto receber os torecedores, mas foi impedido pela direção da
Gaviões para 'ser preservado'
– É o dia mais feliz da minha vida – disse Cleuter, cuja família é de
Manaus, e, por isso, não encontrou ninguém a sua espera no aeroporto,
apenas alguns amigos da torcida organizada a qual pertence.
– É uma felicidade maior do que quando o Corinthians ganhou a final da
Libertadores. O juiz ficava enrolando, enrolando... era para a gente
sair há um tempo, mas nunca saía – emendou.
De acordo com Adauto de Oliveira, diretor da Gaviões, o menor H.A.M.,
que assumiu a autoria do disparo, queria ir ao aeroporto receber o
torcedores, mas acabou sendo impedido pela organizada. Coincidentemente,
ele tem um irmão chamado Kevin.
– Ele queria vir pra cá, mas achamos melhor preservá-lo. É um menino
super do bem, de grande futuro, mas que errou. Demos um puxão de orelha
por ele ter sido irresponsável no uso do sinalizador – disse o diretor
da Gaviões.
– A gente queria fazer uma festa pela chegada deles, mas somos
solidarios à causa. Ficou uma tristeza muito grande pela morte do menino
– emendou.
Marco Aurélio Nefreire, no desembarque no aeroporto de Guarulhos (Foto: Maria Clara Ciasca )
Um dos mais emocionados era Marco Aurélio. Preso na Bolívia, ele não
viu Pedro Henrique nascer. Conheceu o filho neste sábado, no aeroporto.
É felicidade maior do que quando o Corinthians ganhou a
Libertadores"
Cleuter Barros, torcedor que estava peso
– Queria agradecer todo mundo que nos ajudou, o Corinthians, a
Embaixada, a torcida, até o pessoal na bolivia. Sabíamos que não
tínhamos culpa, nossa consciência estava tranquila. A felicidade é bem
maior que a de um titulo. Sabia que ele (Pedro Henrique) estava pra
nascer, na noite que nasceu não consegui dormir. Felicidade por ser
saudável, mas tristeza por nao ter acompanhado – disse Marco Aurélio,
chorando.
No aeroporto de Guarulhos, cerca de 50 pessoas, entre torcedores e
familiares, aguardavam ansiosamente para reencontrar os torcedores. Nos
minutos de espera, muito batuque, gritos de "o pesadelo acabou" e
esperança de que o triste episódio sirva de lição.
– Foi uma aflição muito grande porque toda hora achávamos que eles
seriam libertados, mas sempre acontecia alguma coisa e não dava certo.
Espero que agora ele se acalme um pouco, vá em menos jogos e fique mais
com a família – afirmou Adriana Torres, prima de José Carlos da Silva
Júnior.
Júnior, torcedor do Corinthians libertado na
Bolívia (Foto: Maria Clara Ciasca)
Júnior, como é conhecido entre os familiares, falou rapidamente sobre o
período preso em Oruro e disse que não conseguiu dormir desde que
recebeu a informação que poderia retornar ao Brasil.
– Aprendi a valorizar as coisas, a minha família e minha namorada. Nem dormi quando soube que ia sair – disse.
'Bolívia, nunca mais'
Tadeu Macedo Andrade, um dos sete que foram soltos em junho, fez
questão de ir ao aeroporto acompanhar a chegada dos outros cinco.
– Hoje minha felicidade está completa, por saber que todo aquele
sofrimento finalmente acabou, e eles vão poder almoçar com a familia –
disse Tadeu.
– Acabou o processo. Estávamos lá para a investigação, não vai ter
julgamento, está todo mundo absolvido, acabou tudo – emendou.
Tadeu disse que o grupo não pensa em processar a Justiça boliviana.
– Os países chegaram a um acordo para a gente ser solto, é diplomacia, então só quero encerrar tudo isso – disse Tadeu.
– A rotina voltou ao normal, já estou trabalhando e fui a todos os
jogos em São Paulo. Ainda não viajei porque minha família não quer, mas
daqui a um tempo vou voltar a ir nos jogos fora. Só não volto mais para a
Bolivia, nunca mais – emendou.
Reginaldo, um dos torcedores libertados (Foto: Maria Clara Ciasca)
Entenda o processo
O grupo estava detido devido à morte de Kevin Douglas Beltrán Espada,
garoto boliviano de 14 anos vitimado por um sinalizador atirado na
partida entre San José e Timão, na estreia alvinegra na Taça
Libertadores da América, no dia 20 de fevereiro. No total, foram 12
presos. Sete deles foram liberados no dia 6 de junho, por falta de
provas.
Em 24 de julho, Davi Gebara Neto, advogado da Gaviões da Fiel,
principal torcida organizada do Corinthians, anunciou a liberação dos
cinco torcedores que ainda permaneciam presos em Oruro. Entretanto, eles
permaneceram na Bolívia por cerca de uma semana, pois a Justiça
concedeu um período para que a família de Kevin e o San José pudessem
recorrer da decisão.
Tadeu Macedo, um dos que haviam sido libertados
antes, foi ao aeroporto (Foto: Maria Clara Ciasca)
Todos os 12 se dizem inocentes. Um jovem de 17 anos, identificado
apenas como H.A.M., assumiu a autoria do crime, mas nada foi alterado no
processo. Ele depôs na Vara da Infância e no Consulado da Bolívia em
São Paulo, mas ainda aguarda o julgamento do caso em liberdade.
Devido à morte de Kevin, o Corinthians sofreu uma punição da Conmebol. O
time chegou a jogar uma partida da Libertadores com os portões fechados
e não pôde contar com sua torcida nos jogos como visitante. No início
de julho, a Conmebol voltou atrás e permitiu a presença de corintianos
no Morumbi, para a primeira decisão da Recopa, contra o São Paulo.
Livre de qualquer pena esportiva, o clube alvinegro, na figura de seu
presidente, Mário Gobbi, acompanhou de perto a situação dos torcedores
presos, trabalhando em parceria com o Ministério da Justiça. Na sexta,
com a informação da liberação dos corintianos, o Timão emitiu nota
oficial comparando a felicidade com a conquista de um título. À família
de Kevin Espada, o Corinthians doou US$ 50 mil.
Leonardo Silva é recepcionado por outros torcedores do Corinthians (Foto: Maria Clara Ciasca)