Bate-bola em família: polêmicas e sucesso entre pais e filhos jogadores
Depois de episódio com Marcelo Moreno, empresários
revelam formas de evitar problemas, e gestor da carreira de Neymar
exalta postura do pai
Por Janir Júnior
Rio de Janeiro
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Moreno teve que responder sobre o pai na sua
apresentação. (Foto: Alexandre Vidal/Fla Imagem)
Não basta ser pai, tem que participar. Mas, às vezes, atrapalha. A
atuação de pais na gestão da carreira ou, simplesmente, no dia a dia de
filhos jogadores de futebol tem casos de sucesso - como o de Neymar -, e
outros que causam problemas, como aconteceu com Marcelo Moreno. Na sua
chegada ao Flamengo, o atacante colocou um ponto final nas polêmicas
declarações de seu pai sobre o Rubro-Negro. Agir com a emoção acima da
razão, instinto de defesa e despreparo são algumas das explicações para
casos que vão desde "cornetadas" até declarações que prejudicam
negociações de suas crias.
Fabiano Farah é o empresário de Marcelo Moreno e precisou ter jogo de
cintura para conduzir a situação quando Mauro Martins, pai do atacante,
classificou Flamengo e Palmeiras como “equipes fracassadas”, justamente
durante negociações do jogador para deixar o Grêmio. Farah assumiu a
frente no episódio e aproveitou o bom trânsito de bastidores para
conversar com dirigentes de ambos os clubes e contornar a situação,
evitando um desgaste maior.
O empresário - que cuidou da carreira de Ronaldo durante dez anos,
trabalhou com Fórmula 1 e tem cursos e mestrado na Europa - não se
estende sobre o assunto, mas aponta uma fórmula para que a relação entre
jogador, pai, empresários e clubes tenha sucesso:
- É extremamente necessária uma gestão de carreira qualificada. O mais
importante no relacionamento entre gestor de carreira, cliente, no caso o
atleta, e família (pai, irmão, sogro empresários) é ter a sabedoria e
disciplina de sempre evitar situações de miopia, que impedem de enxergar
o que realmente pode ser feito, o que é melhor, o que é necessário para
a solução do problema. É de suma importância na execução de soluções e
ações durante uma gerência de crise ou de interesse.
Na sua apresentação ao Flamengo, na última sexta-feira, Moreno pediu
que separem sua imagem da do pai, mais um torcedor do que um gestor da
carreira do atacante.
- Temos que separar um pouco. Se quiserem saber alguma notícia, eu
estou aqui para esclarecer, para responder e saber onde eu quero jogar.
Em momento algum, vocês ouviram da minha parte eu falar a respeito dos
times que meu pai citou. Ele é tipo um torcedor. Não tem que confundir
isso - afirmou Moreno.
Mauro Martins mora na Bolívia e costuma ligar a metralhadora giratória
quando procurado por jornalistas. No último contato com o
GLOBOESPORTE.COM, durante a negociação do filho com Grêmio e Flamengo,
ele chegou a dizer que o filho ficaria em Porto Alegre e disparou:
- Jornalista escreve muita mentira.
Durante a crise de relação entre Moreno e o Grêmio, o clube gaúcho
chegou a colocar declarações do pai do jogador - que chamou a equipe de
"timinho" - como um dos problemas, deixando claro o prejuízo que a
polêmica provocou e também a associação entre família e futebol.
Por fim, o atleta conseguiu chegar a um acordo com seu ex-time para
receber o que lhe era devido e acertou com o Rubro-Negro, que tampouco
recebeu bem as declarações do pai. No fim, com a intervenção de Fabiano
Farah, o desfecho foi positivo, e os ânimos, serenados.
Emocional x Profissional
Entre agentes e empresários, é denominador comum que desde cedo os pais
devem ser orientados sobre a longa e tortuosa carreira de jogador, dos
possíveis problemas e soluções. E que as escolhas precisam visar a uma
conjunção dos lados pessoal e profissional, além de contar com a
participação de uma pessoa gabaritada no meio do futebol, com
conhecimento de parte comercial e contratual. Excesso de zelo e proteção
ficam fora de campo.
Um dos principais empresários de jogadores de futebol do Brasil, com
cerca de 90 atletas e nomes de ponta como o técnico Mano Menezes, Carlos
Leite diz que é comum a relação pai/jogador influenciar em algumas
decisões e conta como age para evitar problemas.
- Quando um irmão, pai, alguém muito próximo acaba conduzindo a
carreira, eu vejo que a grande maioria toma algumas decisões mais pelo
lado emocional do que o racional, o profissional. É até uma coisa normal
de acontecer. Particularmente, eu nunca tive problema em relação a
isso. Mas, em alguns momentos, você sente que alguns pais acabam tendo
influência sobre o filho. Num geral, acaba o lado emocional tomando
conta. Procuro colocar a questão com os pais, explico o que está
acontecendo para não ter problemas. E colocamos nosso ponto de vista. A
decisão final, quem vai dar rumo à carreira, será sempre o atleta. Temos
que orientar, como “acho melhor isso, dessa forma a gente conduz
melhor” - afirmou o empresário.
Carlos Leite aponta uma relação que deu certo:
- Há casos de sucesso, como o Neymar. Ele (pai de Neymar) consegue
conduzir bem a situação, não está o tempo inteiro falando, as decisões
são tomadas como têm que ser. Não sei se pelo fato de ser o Neymar se
torna mais fácil.
Staff por trás de Neymar. E do pai
Neymar, pai e filho, união que deu certo no futebol
(Foto: Reprodução / Instagram)
Neymar da Silva Santos, pai e responsável pela carreira do jogador,
dita a regra e tem uma meta principal: deixar Neymar livre para jogar
futebol. Gerenciar a vida do astro mais badalado do Brasil é seu
trabalho, que conta com a ajuda de 22 funcionários, divididos entre
Santos, NR Sports, empresa da família, e o Instituto Neymar JR. O
empresário Wagner Ribeiro também teve papel fundamental na consolidação
da carreira do craque santista.
Eduardo Musa, principal gestor, é o homem colado em Neymar durante
quase todo o tempo e responsável por fazer a agenda do atacante. Ele diz
que Neymar, o pai, sabe enxergar o lado profissional e pessoal sem que
haja uma mistura explosiva e emocional, mas sim uma soma de fatores que
mostra que o resultado dá certo.
- A soma disso é uma estrutura profissional administrada por um
conceito familiar. Nem sempre se consegue, mas ele (Neymar pai) tenta
separar a questão do pai e do empresário. Uma das coisas que faz dar
certo é isso. Uma forma profissional, mas com a cabeça pensando na
família - afirmou.
Eduardo Musa acrescenta que a missão dos profissionais também é deixar o
pai de Neymar informado sobre tudo. Segundo ele, o fato de ter sido
jogador ajuda na condução de todo o processo:
- Os profissionais em volta dele vão municiando de informações, e ele
decide de acordo com a vontade do filho e da família. Ele foi jogador de
futebol. Com os erros que cometeu, aprendeu, passou por tudo isso e
sabe onde o filho pode chegar.
As cornetas de Romário e o pai de Kaká
Em defesa dos filhos, os pais também soam as cornetas e causam
situações embaraçosas. Em fevereiro, ao cobrar mais oportunidades para
Romarinho no Brasiliense,
o Baixinho deu de bico e chamou o técnico Márcio Fernandes de "burro".
- Como um cara que jogou por vinte e poucos anos, eu acho que o
Romarinho teria tranquilamente vaga no time e poderia estar servindo o
Brasiliense muito mais do que vem fazendo. Mas eu também já tive
treinador assim, burro, que não conhece futebol e não coloca aqueles
jogadores que são os melhores - disparou Romário.
Após a polêmica, Romarinho discordou do pai e pediu o fim das críticas.
O melhor jogador da Copa do Mundo de 1994 já havia criticado o técnico
dos juniores do Vasco, Sorato, quando seu filho trocou o clube de São
Januário pelo Brasiliense.
- O atual treinador, Sorato, nunca jogou p... nenhuma. Sempre foi um
jogador medíocre. Como nunca teve personalidade como jogador, hoje é um
mandado pelo presidente do clube.
Kaká, do Real Madrid, usa a mesma fórmula de Neymar. Seu pai, Bosco
Leite, é também seu empresário. Em 2009, na transferência do Milan para o
Real Madrid, que pagou a quantia de 65 milhões de euros (cerca de R$
178 milhões) na contratação, pelo menos 10% - cerca de R$ 17,8 milhões -
seriam destinados a Bosco a título de comissão.
Diego, do Wolfsburg, é outro que tem o pai como agente. Djair Ribas
cuida dos interesses e transferências do filho desde 2004, quando ele
trocou o Santos pelo Porto.
Assis: problema com Flamengo e nova postura no Galo
Assis concede coletiva ao lado de Ronaldinho
(Foto: Alexandre Durão / Globoesporte.com)
Além dos pais, amigos e irmãos também gerenciam carreiras de jogadores.
Assis cuida de Ronaldinho Gaúcho. Quando o jogador, que perdeu o pai
ainda criança e viu o irmão assumir a função paterna, saiu do Milan para
voltar ao Brasil, o empresário foi criticado pelo leilão que teria
feito entre Palmeiras, Grêmio e Flamengo, que acabou sendo seu destino
em 2011.
Na relação de pouco mais de um ano com o Rubro-Negro, Assis passou a
ter trânsito livre em todos os setores do clube e, com o atraso dos
pagamentos de Ronaldinho, passou a travar uma guerra fria com os
dirigentes da época, que culminou na saída do camisa 10, após colocar o
clube na Justiça.
No Atlético-MG, Assis tem atuação bem mais discreta e sempre respeitosa com o presidente Alexandre Kalil.
O ex-diretor do Barcelona Ferran Soriano, autor do livro "A Bola Não
Entra Por Acaso", conta, entre muitas outras histórias, a relação com
Roberto de Assis Moreira. Soriano relatou que Assis pedia reuniões
frequentes para discutir a remuneração de seu irmão agenciado. Foi assim
até 2008, quando o jogador deixou o clube.
A "bomba" de seu Juarez, pai de Fred
Fred teve nome envolvido em polêmica devido à
declaração do pai (Rossana Fraga / Photocamera)
No ano passado, Juarez Pinheiro, pai de Fred, do Fluminense, também
causou rebuliço ao dar declarações públicas sobre o filho. Ele revelou
que que o atacante
simulara lesão
para não servir à seleção brasileira comandada por Mano Menezes em
amistoso contra a Argentina. Juarez afirmou que o jogador pediu para os
médicos do Tricolor ligarem para os da Seleção dizendo que ele estava
com dores musculares. Três dias depois da partida do Brasil, Fred atuou
os 90 minutos do jogo contra o Bahia, pelo Campeonato Brasileiro.
O caso ganhou proporções e gerou mal-estar. O Fluminense divulgou nota
oficial para explicar a situação de Fred, que orientou o pai para não
dar declarações para a imprensa.
- Meu pai fala as coisas muito no calor. Ele também fala que eu sou
melhor do que o Messi. E ai? É verdade também? Não - disse Fred, à
época.