Perfil: 'má companhia' quando jovem, Ronaldo Jacaré vira lenda no jiu-jítsu
Lutador brasileiro tem carreira sólida também no MMA e
vai chegando perto de disputar cinturão no UFC. Situações de perigo
fizeram parte da adolescência
Por Ivan Raupp
Rio de Janeiro
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Muito mais do que um simples hobby ou objeto de trabalho, o quimono funcionou por muitos anos para Ronaldo Souza como uma
segunda pele.
Com ele, aliado ao apelido de "Jacaré", vieram inúmeros títulos,
inclusive oito mundiais, sendo três na faixa preta. Antes perdido e
misturado à violência do bairro de Nova Rosa da Penha, em Cariacica-ES, o
capixaba encontrou no jiu-jítsu e em Manaus uma saída para o recomeço.
Hoje fazendo sucesso no MMA, ele vai se aproximando do sonho de disputar
um cinturão no UFC, e usa sua própria história como motivação:
- Eu era uma
má companhia,
na verdade (risos). Era uma companhia muito ruim para as pessoas que
andavam comigo também. E tive problema com um amigo meu. Ele estava
fazendo aniversário de
15 anos
um dia. A gente estava brincando de bilhar, e ele tomou um tiro na
boca. O cara chegou perto e deu um tiro. Eu estava jogando com ele, e o
cara passou do meu lado, não sei como não me viu. Nessa hora eu saí de
perto da situação. Minha mãe ficou desesperada com aquela coisa, pediu
para eu me esconder na casa de uma amiga dela e falou que eu tinha ido
para outro estado - disse ele, em entrevista exclusiva ao
Combate.com.
Com seu antigo cinturão do Strikeforce, lutador faz a 'boca do jacaré' (Foto: André Durão / Globoesporte.com)
Jacaré contou esse e outros detalhes do passado em sua casa, no Recreio
dos Bandeirantes, no Rio de Janeiro, na companhia da esposa, Larissa, e
dos filhos, Enzo Gabriel e Ryan. À vontade e orgulhoso de seu antigo
cinturão do extinto Strikeforce, ele falou sobre a difícil transição do
jiu-jítsu para o MMA. Apesar dos 34
anos de vida e da larga experiência, o capixaba admite que sente a pressão do octógono.
Acho que é muita prepotência dizer 'o melhor', mas fui um
bom competidor, ganhei muitos campeonatos com o pouco peso que eu tinha época, e isso me credencia a estar entre os melhores"
Jacaré, sobre ser o melhor do jiu-jítsu
- (...) É uma pressão muito grande. Em outros eventos, você entra e vê a torcida
em cima.
No UFC, você entra e parece que a torcida te esmaga. Quando entra no
octógono e vê o Bruce Buffer gritando, seu coração vai a mil por hora.
Quase que eu mando: "Cala a boca, Bruce Buffer, que eu estou nervoso,
cara" (risos). (...) Tem muita câmera, são muitas luzes... O Bruce
Buffer é um ícone, e ele grita ali o seu nome, com aquela voz dele...
Mas eu gosto de pressão, das coisas difíceis. Toda vez que você me der
um grande desafio, pode apostar que não vou decepcionar. Vou chegar lá e
mandar ver - declarou ele.
Terceiro colocado do ranking oficial da categoria dos médios (até
83,9kg), Jacaré vai enfrentar o francês Francis Carmont neste sábado, no
"UFC Fight Night: Machida x Mousasi", na Arena Jaraguá, em Jaraguá do
Sul-SC. O rival, por sinal, não vai conseguir repetir a "amarração" que
vem sendo seu ponto característico, se depender do brasileiro. O canal
Combate fará a transmissão do evento ao vivo, a partir das 22h (de
Brasília), e também da pesagem, na sexta-feira, às 16h. O
Combate.com acompanha tudo em Tempo Real.
A seguir, veja a entrevista com Ronaldo Jacaré na íntegra:
Combate.com: O seu início nas lutas foi no jiu-jítsu. De onde surgiu o interesse?
Ronaldo Jacaré: Foi através do meu irmão, quando fui morar em
Manaus. Eu tinha de 16 para 17 anos. Meu irmão mais velho, Reginaldo,
começou a treinar perto de casa, na academia do Henrique. Eu ia vê-lo
treinando e não gostava, achava esquisito aquele negócio de jiu-jítsu.
Certo dia ele se machucou. Aí peguei o quimono dele e fui treinar no
lugar dele. Nunca mais deixei de treinar. Tomei uma "sova" tão grande na
primeira vez que subi no tatame... E sou muito competitivo. Pensei
comigo: "Tenho que voltar". Voltava todos os dias, e apanhava sempre.
naquela ânsia de aprender, consegui rapidamente aprender muita coisa. Aí
comecei a ficar bom no jiu-jítsu. Na segunda semana já fui morar na
academia, e morei lá até receber a faixa preta. Essa foi minha
trajetória.
Quantos anos você morou na academia?
Eu entrei em 1997 e peguei a faixa preta em 2003. Foram seis anos.
Ronaldo Jacaré com a esposa, os filhos e a cadela (Foto: André Durão / Globoesporte.com)
Muita gente acha que você é manauara por ter começado no
jiu-jítsu lá, mas na realidade você é capixaba. Conte um pouco da sua
infância. Chegou a passar dificuldade?
Nunca faltou comida na minha família. Meu pai, Seu Otávio, e minha mãe,
Dona Antônia, sempre foram batalhadores, e nunca faltou nada. A gente
que, quando é menino ou adolescente, sempre quer as coisas demais. Era
bem humilde, mas a gente se divertia muito.
Por que você saiu do Espírito Santo e foi para Manaus?
Foi por causa da violência mesmo. Era um bairro muito perigoso, e eu
comecei a andar com más companhias. Eu era uma má companhia, na verdade
(risos). Era uma companhia muito ruim para as pessoas que andavam comigo
também. E tive problema com um
amigo meu. Ele estava fazendo aniversário de 15 anos um dia. A gente estava brincando
de bilhar,
e ele tomou um tiro na boca. O cara chegou perto e deu um tiro. Eu
estava jogando com ele, e o cara passou do meu lado, não sei como não me
viu. Nessa hora eu saí
de perto
da situação. Minha mãe ficou desesperada com aquela coisa, pediu para
eu me esconder na casa de uma amiga dela e falou que eu tinha ido para
outro estado. Eu estava para fazer 15 anos. Quando ela me botou na casa
da amiga e disse que eu tinha ido para Belo Horizonte, ela já estava
conversando com meu irmão para eu ir para Manaus morar com ele. Resolvi
obedecer e fui morar com meu irmão. Fiz 15 anos dentro do avião, indo
embora do Espírito Santo para Manaus.
Era coisa de gangue ou algo assim?
Era coisa tipo violência mesmo. A gente era má companhia, aprontava.
Não é nem que a gente brigava, porque no meu bairro não tinha briga.
Tinha tiro mesmo, facada, essas coisas assim. Era um bairro muito
violento. Praticamente não tenho mais amigos de infância. São poucos.
Mas o esporte me salvou, Deus me salvou. Hoje tenho minha esposa
maravilhosa, dois filhos lindos e saudáveis, sou um homem de Deus.
Jacaré (Foto: André Durão / Globoesporte.com)
Lembra de algum outro perrengue que passou nesse período?
Ah, eu sempre fui muito protegido, porque toda vez que eu saía,
acontecia alguma coisa com meus amigos. Tomavam tiro, iam presos. Sempre
acontecia alguma coisa, e eu em casa. Tive muita sorte, posso dizer
assim.
Em Manaus você se tornou uma lenda do jiu-jítsu. Você se considera um dos melhores da história?
Por tudo que conquistei, sem sombra de dúvida sim.
Talvez o melhor?
Acho que é muita prepotência dizer "o melhor", mas fui um bom
competidor, ganhei muitos campeonatos com o pouco peso que eu tinha
época, e isso me credencia a estar entre os melhores.
Depois de Manaus você foi para o Rio de Janeiro...
Resolvi sair de Manaus realmente para viver minha vida. Eu já era
faixa-preta há muitos anos, já era reconhecido, e não tinha nenhuma
remuneração. Eu já era campeão mundial e ainda vigiava carros alguma
vezes. Quando eu saí de Manaus, decidi rodar os EUA. A convite do Randy
Couture eu treinei na academia dele. Já estava no MMA.
O que motivou essa transição do jiu-jítsu para o MMA?
Eu mesmo, pela minha vontade. Fui eu que introduzi o MMA na academia
onde eu treinava, onde eu comecei no jiu-jítsu. Meu professor não
queria, mas pela minha insistência consegui introduzir o MMA lá. Aí fui
fazer minha primeira luta de MMA e perdi para o (Jorge Patino) Macaco.
Depois eu ficava muito tempo sem lutar. Eu ia lutar, e a luta caía.
Então, passava o tempo muito sem lutar e também sem competir no
jiu-jítsu. Eu já tinha falado que não ia mais competir no jiu-jítsu. Com
o tempo aquilo foi me saturando. Eu queria ter uma família. Já conhecia
minha atual esposa, Larissa, e resolvi sair. Foi aí que minha vida
começou a virar. Lutei no Dream, cheguei à final do evento e disputei o
cinturão. Foi um "no contest" (contra Jason Miller), mas na minha
concepção meu adversário tinha de ser desclassificado e eu deveria ficar
com o cinturão. Fiquei chateado com o Dream e não quis mais lutar no
evento. Fui para o Strikeforce, onde me sagrei campeão. Defendi meu
cinturão (contra Robbie Lawler) e depois perdi de uma forma muito
contestada (para Luke Rockhold), porque quem realmente conhece luta e vê
aquela luta do início ao fim sabe que ganhei. Aí entrei no UFC, fiz
duas grandes apresentações (vitórias sobre Chris Camozzi e Yushin Okami)
e agora estou nas cabeças da minha categoria. E batalhando para chegar
nesta próxima luta, fazer meu trabalho e dar um passo a mais rumo ao meu
objetivo, que é o cinturão.
Se o jiu-jítsu tivesse uma melhor remuneração, você teria
pensado duas vezes antes de ir para o MMA? Poderia estar no jiu-jítsu
até hoje?
Não pensei nisso. Fui para o MMA, e na época nem era financeiro. Eu
queria mesmo lutar MMA pelo fato de eu ter me chateado muito com o
Carlinhos Gracie (Carlos Gracie Jr., criador da Confederação Brasileira
de Jiu-Jítsu) e com a confederação também. Resolvi parar de lutar
(jiu-jítsu), e foi uma promessa que até hoje cumpro. Realmente desde
2005 não luto mais. É uma coisa da qual sinto muita falta, pelo fato de
eu ter lutado muito pouco na faixa preta. Lutei dois anos certinhos.
Essa luta me passa na cabeça sempre, porque os fãs não me deixam
esquecer, graças a Deus. Naquela época eu tinha apenas a luta. Eu comia,
bebia, entrava no tatame e saía. Minha vida
todinha era isso"
Sobre ter vencido Roger Gracie lesionado
A sua rivalidade com o Roger Gracie é a maior da história do jiu-jítsu?
Não sei, mas era uma rivalidade bem legal, né? Todo mundo que via aquela coisa sabia que era uma rivalidade bem forte (risos).
Nota da redação: considerados provavelmente os dois melhores de sua
geração, Jacaré e Roger se enfrentaram cinco vezes até hoje, incluindo
campeonatos de jiu-jítsu e de grappling (luta agarrada). O Gracie leva
pequena vantagem no confronto: 3 a 2.
E quem foi melhor no jiu-jítsu: você ou o Roger Gracie?
Acho que isso fica a cargo dos fãs. Nós fizemos grandes batalhas, já
provamos tudo que tínhamos que provar. Nossa raça e nosso suor ficaram
lá dentro do tatame. Os fãs decidem.
Você até venceu o Roger uma vez com o braço aparentemente quebrado. O que lembra dessa luta?
Essa luta me passa na cabeça sempre, porque os fãs não me deixam
esquecer, graças a Deus. Não tem um dia que eu passe num lugar e alguém
não se lembre desse episódio do meu braço quebrado. Naquela época eu
tinha apenas a luta. Eu comia, bebia, entrava no tatame e saía. Minha
vida todinha era isso. Então, quando entrei naquele tatame, só me lembro
de vir na cabeça assim: "Vou vencer, vou vencer, vou vencer.". E acho
que essa minha vontade de vencer foi o que me fez aguentar aquilo ali.
Foi uma coisa natural, que aconteceu, e que sinceramente acho que não
consigo fazer de novo.
Nota da redação: essa luta foi a final da categoria de peso absoluto do
Mundial de jiu-jítsu de 2004. Jacaré teve o braço aparentemente
quebrado durante uma chave de braço de Roger Gracie, mas levou a
vantagem de 4 a 0 até o fim e se sagrou campeão.
Jacaré acerta direita para nocautear Yushin Okami no UFC em Belo Horizonte (Foto: Rodrigo Malinverni)
De acordo com as regras do jiu-jítsu, você teria perdido aquela luta se tivessem percebido que você estava com o braço quebrado.
As regras mudaram depois disso. Fiz as regras mudarem duas vezes e
"expulsei" dois juízes. A regra mudou depois que aconteceu esse
episódio. Mas no judô, nas Olimpíadas, o cara lutou com o ombro
deslocado. E na verdade meu braço não quebrou, ele saiu do lugar. Mas aí
foi pior do que ter quebrado, porque tive problemas no músculo,
estiramento ligamentar... Muitas coisas aconteceram. O primeiro árbitro
que "expulsei", o do braço quebrado, foi o Fredson Alves, que na minha
concepção foi muito casca-grossa porque, na época, todas as finais eram
feitas só num tatame, exatamente no tatame onde ficava a área dos
Gracies. Acho que isso é errado. você está no Mundial, o tatame tem que
ser no centro. Não tem que puxar para nenhum lado, então ali ficava toda
a pressão daquela família toda, o que não é pouco. O Fredson Alves
nunca mais foi juiz de nenhum evento da CBJJ. Mudaram a regra, aí
botaram mais três juízes, o que deveriam ter feito há muito tempo. Eles
esperam eles mesmos se ferrarem para mudar uma regra. E a segunda regra
foi com o (Alexandre) Baraúna, que marcou os dois pontos de uma queda
que dei no Roger, e realmente foi queda, não tem como fugir. Ele passou
um bom tempo sem arbitrar.
Nota da redação: Alexandre Baraúna indicou dois pontos para Jacaré por
conta de uma queda em Roger Gracie no finzinho da final do Mundial de
jiu-jítsu de 2005, o que deu o bicampeonato ao capixaba. A queda de
Roger foi polêmica, pois ele estava encostado numa placa publicitária. O
membro da família Gracie reclamou da decisão e inclusive se ausentou do
pódio, em forma de protesto. O árbitro foi bastante criticado na
ocasião.
Qual é o seu maior sonho hoje em dia? É o cinturão do UFC ou tem outra coisa?
Não, meu maior sonho eu já realizei. Sou um homem de Deus. O cinturão é
um objetivo que quero alcançar e, se Deus permitir, não vou medir
esforços para chegar lá.
Lutador brinca com o filho mais novo, Ryan
(Foto: André Durão / Globoesporte.com)
Muitos lutadores de jiu-jítsu, na transição para o MMA, têm
dificuldade de aprender a levar soco na cara. Para você foi tranquilo?
Não foi tranquilo. É difícil. Eu nunca tive medo de tomar soco na cara.
Meu negócio foi aprender a hora certa de usar o boxe, a hora certa de
usar as quedas, aprender mais em pé, derrubar no momento certo... A
maior dificuldade foi fazer um mix mesmo.
E qual foi a importância do treinador Josuel Distak, que vem do boxe, nesse processo?
Ele foi extremamente importante. Depois que comecei a treinar com o
Distak, a minha evolução foi nítida. É um professor que tem uma
experiência fora do comum. Muitos não dão o crédito que ele realmente
merece, mas os resultados estão aí. Todo mundo que ele treina luta bem, é
campeão. Não vai ser diferente comigo. Vou mostrar o potencial que o
Distak tem como professor.
Você está no mesmo card do Gegard Mousasi, que te nocauteou em
2008 com uma pedalada. Você sente que deu uma bobeira muito grande? Tem
vontade de fazer uma revanche contra ele por conta daquilo?
Acho que muitas coisas podem acontecer na luta, e ele foi feliz. Deu um
golpe que realmente acho que não foi sorte. Foi uma coisa que
aconteceu. Vontade de lutar com ele? Só se o Ultimate pedir. Acho que a
gente anda para a frente. Se ele estiver na minha frente, é uma luta que
pode acontecer naturalmente. Mas não é uma luta que pretendo fazer por
causa do que aconteceu lá atrás. É simples, profissionalismo.
O Luke Rockhold está atrás de você no ranking, mas por conta
daquela derrota polêmica no Strikeforce, essa é uma revanche que você
gostaria de fazer.?
Também não. Ele está atrás de mim e tem que ficar lá atrás. Se ele
conseguir remar e ficar do meu lado ou na minha frente, pretendo lutar
contra ele normalmente.
Para mim é uma coisa normal. Acho que o Lyoto realmente merece lutar
pelo cinturão. Ele vem da categoria de cima, foi campeão lá, tem uma
bagagem maior no UFC. Eu estou
chegando agora, é apenas
minha terceira luta no UFC"
Sobre Dana colocar Lyoto à sua frente na fila
O Dana White disse que, se o Lyoto Machida vencer o Mousasi,
pode ir direto para o cinturão contra o vencedor de Chris Weidman x
Vitor Belfort, mas não mencionou o seu nome. Como recebeu isso?
Para mim é uma coisa normal. Acho que o Lyoto realmente merece lutar
pelo cinturão. Ele vem da categoria de cima, foi campeão lá, tem uma
bagagem maior no UFC. Eu estou chegando agora, é apenas minha terceira
luta no UFC. O que tenho que fazer é arrebentar nesta luta, dar o meu
máximo, conseguir fazer uma grande apresentação e dar um passo a mais na
carreira. O cinturão é um objetivo que vou alcançar com a graça de Deus
e se Ele permitir. Se for agora ou depois, tanto faz. Vou andando e
andando para a frente até chegar minha hora.
Seu próximo adversário, Francis Carmont, está invicto no UFC,
mas tem um estilo criticado de amarrar as lutas. O que você está
preparando para ele?
Estou treinando bastante. O que preparei para ele? Muito treino, muito
cardio, muito mix. Pretendo fazer uma bela apresentação, esse é o
principal objetivo. Vou chegar lá, dar meu máximo, fazer uma luta boa.
Não vou deixar ele amarrar. Esse é meu objetivo.
Você está gostando desse negócio de nocautear os outros?
É bom você ganhar antes de acabar o tempo, né? Quando você nocauteia
antes de acabar o tempo é maravilhoso. Quando finaliza também. Estou
buscando essa linha de acabar a luta antes dos três rounds de cinco
minutos.
Finalizar é uma coisa normal para você, e agora você tem nocauteado também. O que é mais gostoso: finalizar ou nocautear?
É a mesma coisa, de verdade mesmo. Não muda nada. Tudo dá o bônus da
noite, tudo acaba a luta antes, minha esposa fica mais tranquila em
casa. Posso chegar em casa praticamente inteiro, sem nenhuma lesão.
Então, quando acaba antes, independentemente se via nocaute ou via
finalização, é bom. É até melhor vir a finalização, que aí não machuca a
mão quando bate (risos).
Ronaldo Jacaré veste o quimono para dar um seminário de jiu-jítsu no Amazonas (Foto: Isabella Pina)
Como é sua relação com o Dana White?
Sinceramente eu não tenho muito contato com ele, mas acho que é boa,
porque eu cumpro todos os meus compromissos. Eu estou fazendo um bom
trabalho no UFC. Sempre quando recebo e-mail do UFC, não é nenhum puxão
de orelha. Então, tenho certeza que ele gosta do funcionário que faz o
trabalho certo, que tem boa postura e que representa bem o UFC. Eu tenho
uma postura boa, represento bem o UFC, não falo palavrão, sou um cara
de família, não saio à noite. Acho que não tem por que nossa relação ser
ruim.
Por que você demorou tanto a ir para o UFC? Foi a burocracia? O
próprio UFC? Ou foi opção sua mesmo, por estar se sentindo bem no
Strikeforce?
Foi uma decisão minha principalmente, porque eu decido as coisas, e da
minha equipe. A gente resolveu ficar no Strikeforce por mais tempo.
Acredito que foi bom, porque o tempo de Deus é um tempo diferente do
tempo que a gente quer. Foi uma boa decisão, até pelo fato de eu ter
pegado uma experiência maior. Isso prova que muitas pessoas entram muito
cedo no UFC e têm problemas, porque é uma pressão muito grande. Em
outros eventos, você entra e vê a torcida em cima. No UFC, você entra e
parece que a torcida te esmaga. Quando entra no octógono e vê o Bruce
Buffer gritando, seu coração vai a mil por hora. Quase que eu mando:
"Cala a boca, Bruce Buffer, que eu estou nervoso, cara" (risos).
Mesmo com toda a sua experiência, sempre vai sentir esse nervosismo?
Não é sempre, é que o UFC é uma pressão muito grande. A diferença é o
UFC mesmo. Tem muita câmera, são muitas luzes... O Bruce Buffer é um
ícone, e ele grita ali o seu nome, com aquela voz dele... Mas eu gosto
de pressão, das coisas difíceis. Toda vez que você me der um grande
desafio, pode apostar que não vou decepcionar. Vou chegar lá e mandar
ver.
Muita gente critica a perda de peso no MMA. Acha que a pesagem deveria ser no dia da luta ou está confortável dessa maneira?
Estou confortável. Quem defende muito é quem nunca lutou. Os caras têm
que fazer a promoção. Todo mundo perde peso, e a gente se acostuma com
isso. Eu penso assim.
Jacaré sorri durante entrevista (Foto: André Durão / Globoesporte.com)
Hoje você não treina mais com o Anderson Silva, mas vocês já
treinaram durante bastante tempo. Há uma rivalidade entre vocês? Há uma
amizade? Como descreve essa relação?
Rivalidade não. Não tem por que ter rivalidade, até pelo fato de na época eu lutar no Strikeforce e ele no UFC.
Rivalidade de treino, digamos assim.
Rivalidade de treino? Toda hora! Comigo não tem essa não. Treino é
porrada. Eu treino duro, bem forte. Mas a gente é parceirão. A gente se
ajudou muito. Ele me ensinou para caramba, aprendi muito com ele.
Acredito que é impossível ter uma rivalidade entre nós.
Ele diz que jamais lutaria contra você. Você faz coro?
Com certeza. Para você ter uma ideia, nossa equipe fez de tudo para a
gente não se enfrentar. Foi uma coisa que estava fluindo naturalmente.
Não sei por que o pessoal ficava alimentando essa coisa de a gente poder
se enfrentar, entendeu?
Na sua opinião, o Anderson foi de fato derrotado pelo Chris Weidman nas duas vezes em que eles lutaram?
Essa é uma pergunta em que prefiro ficar calado.
Weidman x Belfort: como você vê essa luta?
Eu quero sentar lá na frente e ficar olhando, porque acho que vai ser
muita porrada. Vejo um certo favoritismo para o Weidman pelo fato de ele
ter vencido o Anderson duas vezes. Poxa, o Anderson é o número 1 do
mundo peso por peso, o campeão dos campeões. Pelo Weidman ter um grande
wrestling, acho que ele tem um certo favoritismo. E também pelo fato da
confiança.
E Lyoto x Mousasi?
Acho uma luta meio complicada de ser dar um prognóstico, pelo fato de o
Lyoto ser aquela fera que é, pode tirar alguma coisa da cartola. Mas o
Mousasi é um cara que sempre inventa alguma coisa para vencer. Eu estava
só analisando e vi ele (Mousasi) falar que estava treinando com muitos
caratecas. Então, acho que ele vem pronto para esta luta. Ele pediu a
luta contra o Lyoto antes, então acho que ele sabia o que estava
fazendo. Vai ser um combate bom.
Filhos brincam com o cinturão do pai (Foto: André Durão / Globoesporte.com)
O topo da categoria dos médios tem Belfort, Lyoto, além do
próprio Anderson. Para você, como é ter de enfrentar brasileiros no UFC?
Sou profissionalismo 100%. Acho natural as coisas acontecerem. O que a
gente pode fazer se é uma potência no MMA? Ninguém pode fazer nada.
Para finalizar: de onde vem esse apelido "Jacaré"?
É porque eu treinava em Manaus, e o símbolo da academia (Asle) era um
jacaré. E eu vivia na academia. Com o tempo comecei a ficar muito bom e
aquela coisa toda, aí meus amigos me apelidaram de jacaré pelo fato de
eu aparecer mais do que o símbolo da academia. Em todos os treinos eu
estava lá. Treinava tudo, fazia tudo, então me apelidaram de jacaré e
pegou. Sempre gostei, nunca tive nada contra. E o apelido se consolidou
mesmo depois que fiquei com a pegada (no quimono) forte. Dizem que o
jacaré, quando segura com a boca, não larga mais.
UFC: Machida x Mousasi
15 de fevereiro de 2014, em Jaraguá do Sul-SC
CARD PRINCIPAL
Peso-médio: Lyoto Machida x Gegard Mousasi
Peso-médio: Ronaldo Jacaré x Francis Carmont
Peso-meio-médio: Erick Silva x Takenori Sato
Peso-meio-médio: Viscardi Andrade x Nicholas Musoke
Peso-pena: Charles do Bronx x Andy Ogle
CARD PRELIMINAR
Peso-leve: Cristiano Marcello x Joe Proctor
Peso-leve: Rodrigo Damm x Ivan Batman
Peso-leve: Francisco Massaranduba x Jesse Ronson
Peso-galo: Iuri Marajó x Wilson Reis
Peso-pena: Felipe Sertanejo X Maximo Blanco
Peso-meio-médio: Ildemar Marajó x Albert Tumenov
Peso-pena: Douglas D'Silva x Zubair Tuhugov