Thiago Silva: 'Não estamos
na Seleção de sacanagem'
Capitão da equipe de Mano revela que atuou machucado pelo Brasil e diz
'que a torcida brasileira era mal acostumada e por isso vaia o grupo atual'
Por Márcio Iannacca
Rio de Janeiro
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Com 15 minutos de jogo (final olímpica) eu senti uma lesão e ainda joguei contra a Suécia, logo após as Olimpíadas"
Thiago Silva, sobre problema na coxa direita na final dos Jogos Olímpicos
Pressão. A palavra mais citada atualmente para definir o momento da Seleção e do técnico
Mano Menezes. Homem de confiança do treinador,
Thiago Silva
pede calma. Capitão e valorizado com a transferência do Milan para o
Paris Saint-Germain por R$ 110 milhões, o zagueiro acabou ficando fora
das partidas contra África do Sul, em São Paulo, e China, no Recife, por
causa de uma lesão muscular sofrida na final olímpica e que só foi
curada após os amistosos. Da França, viu o Brasil vencer sendo vaiado em
casa e teve que explicar aos novos companheiros o motivo de tantas
críticas. Mais: a cobrança em cima de Neymar tem preocupado o atleta,
que teme pelo fim da alegria do camisa 11 do Santos.
- Falei que a torcida brasileira era mal acostumada e por isso vaiava o
grupo atual. Um craque nasce a cada dez anos ou mais. Não se nasce um
Pelé, um Romário ou um Ronaldo todo ano. Tivemos todos esses craques e,
agora, nós temos o Neymar. E é muito triste quando se vaia o nosso
melhor jogador. Ele faz de tudo para dar alegria ao povo, é um cara
alegre e temos que passar isso para ele também. Ele pode perder a
alegria de jogar futebol.
Logo aos 15 minutos do primeiro tempo da final das Olimpíadas de
Londres, contra o México, em Wembley, Thiago sentiu um problema
muscular. Mesmo assim, o defensor seguiu em campo e concluiu os 90
minutos do duelo que culminou com a derrota da seleção brasileira por 2 a
1 e a perda da medalha de ouro. Quatro dias depois, mesmo com dores na
coxa direita, ele voltou a defender a seleção brasileira em amistoso
contra a Suécia, em Estocolmo, e agravou o problema. Mas por que se
arriscar em um jogo que não valia três pontos? O “Monstro” tem a
resposta na ponta da língua: pressão sobre a Seleção, ameaças de
demissão a Mano e criticas de todos os lados.
Fluminense, Milan, PSG e Seleção: Thiago Silva se consolida entre os melhores do mundo (Fotos: Agências)
Por conta da situação complicada, a estreia do zagueiro pelo PSG só
ocorreu no dia 18 de setembro, pela Liga dos Campeões, um mês após o
duelo contra os suecos. No confronto diante do Dínamo de Kiev, no Parc
des Princes, triunfo por 4 a 1, com um gol do "Monstro" ainda no
primeiro tempo.
- Com 15 minutos de jogo eu senti uma lesão e ainda joguei uma partida
contra a Suécia, logo após as Olimpíadas. Vi que o pessoal estava
precisando de mim e me propus a fazer esse sacrifício. Logo após a
derrota para o México, a pressão em cima do grupo era grande. Não
poderia falar que não queria jogar... Foi tudo pensando no grupo, não
deixaria os meus companheiros na mão e muito menos o treinador - disse.
Apesar de não ter participado dos amistosos contra a África do Sul e
China, Thiago Silva acompanhou o desempenho da Seleção. No primeiro
duelo, vitória por 1 a 0 e vaias dos torcedores no Morumbi. Na outra
partida, triunfo por 8 a 0 sobre os asiáticos. Mas foi o apupo dos
paulistanos que incomodou o capitão do time canarinho.
- Fico triste porque temos feito tudo com prazer, com a maior
disposição. Não estamos ali de sacanagem ou por dinheiro. Estamos ali
porque amamos a nossa Seleção, o nosso país - desabafou o zagueiro.
Durante a entrevista, Thiago Silva também falou do retorno de Kaká, com
quem atuou no Milan por vários anos, à seleção brasileira e da difícil
adaptação à capital francesa. Acostumado a Milão, o jogador ainda tem
sofrido em Paris, principalmente com o idioma. Confira abaixo os
principais trechos do bate-papo com defensor brasileiro.
Não estamos ali (na Seleção) de sacanagem ou por dinheiro"
Thiago Silva
GLOBOESPORTE.COM: Como você vê o retorno de Kaká à Seleção?
THIAGO SILVA: É um jogador diferenciado, fez história no
futebol. Não foi o melhor do mundo à toa, já mostrou toda a sua
qualidade dentro de campo. Será mais um jogador para dividir a
responsabilidade. A pressão é grande, ele é experiente e vai nos ajudar
muito. Não tem jogado muito pelo Real, mas se foi convocado é porque a
comissão técnica confia no trabalho dele. Com essa convocação espero que
ele tenha mais oportunidades no Real. O último jogo dele foi contra a
Holanda, na Copa de 2010, onde fomos derrotados. É um cara do bem, e
espero que nesse retorno ele nos ajude na caminhada rumo ao Mundial.
Como viu as vaias dos torcedores paulistanos para a Seleção durante o amistoso contra a África do Sul, em setembro?
Fico triste porque temos feito tudo com prazer, com a maior disposição.
Não estamos ali de sacanagem ou por dinheiro. Estamos ali porque amamos
a nossa Seleção, o nosso país. Quando jogamos na Europa,
independentemente se somos brasileiros ou não, ganhamos o apoio de todas
as partes. Ficamos chateados com isso, mas só vai mudar com vitórias.
Temos que acreditar em nosso potencial, escutar o que falam de bom. O
que falam de ruim deve entrar por um ouvido e sair pelo outro. Teremos
uma prévia de tudo na Copa das Confederações e precisamos saber lidar
com tudo isso.
Os atletas de outros países que atuam com você na França acham estranho a seleção brasileira ser vaiada dentro de casa?É
o que fico mais chateado. As pessoas que não têm nada a ver com a
gente, que não tem nada a ver com o Brasil, gostam de nós. Quando
jogamos no país deles, tudo muda. Na cidade do Ibrahimovic, em Malmo, e
na Polônia, seremos bem recebidos. Quando achamos que seremos bem
recebidos no Brasil, somos criticados, vaiados, chamados de pipoqueiros.
Não gostamos, mas temos que saber lidar com isso. Jogadores de outras
nacionalidades acham tudo isso muito estranho.
É preciso mais paciência por conta da renovação da Seleção?A
nossa seleção tem qualidade apesar de ter vários jogadores jovens. A
pressão é grande porque a reformulação é grande. Mudamos quase um time
inteiro da Copa do Mundo para cá. Temos que ter paciência. Falei aos
meus companheiros de clube (PSG) que a torcida brasileira era mal
acostumada e por isso vaiava o grupo atual. Um craque nasce a cada dez
anos ou mais. Não se nasce um Pelé, um Romário ou um Ronaldo todo ano.
Tivemos todos esses craques e, agora, nós temos o Neymar. E é muito
triste quando se vaia o nosso melhor jogador. Ele faz de tudo para dar
alegria ao povo, é um cara alegre e temos que passar isso para ele
também. Ele pode perder a alegria de jogar futebol.
Thiago Silva durante treino do PSG (Foto: Ag. AP)
Durante a execução do hino nacional brasileiro no confronto a
China, em Pernambuco, os jogadores ficaram abraçados o tempo todo. O que
achou daquela atitude do grupo naquele momento?Foi um
negócio legal, interessante, até pelo que eles passaram. O que passamos,
me incluo nisso, foi um momento triste de jogar em nosso país e ser
vaiado. Foi bacana mudar de cidade e ser bem recebido, ver todos
cantando o hino... O grupo deve ter conversado de ficar mais junto, mais
próximo, de estar mais focado. Nem sempre a vitória por 1 a 0 está boa
para o nosso povo. Querem espetáculo, toque de letra, bicicleta, mas no
futebol de hoje não é tão fácil. Hoje em dia, se você piscar é
derrotado, surpreendido. Temos que acreditar mais em nós, escutar menos
os que não acreditam em nosso trabalho.
Na final das Olimpíadas, você sentiu um problema muscular e, mesmo assim, seguiu em campo. Por que tomou tal atitude?Com
15 minutos de jogo eu senti uma lesão e ainda joguei uma partida contra
a Suécia, logo após as Olimpíadas. Vi que o pessoal estava precisando
de mim e me propus a fazer esse sacrifício. Logo após a derrota para o
México, a pressão em cima do grupo era grande. Não poderia falar que não
queria jogar... Foi tudo pensando no grupo, não deixaria os meus
companheiros na mão e muito menos o treinador, que sempre me deixou à
vontade para expressar a minha opinião. Eu me sinto um líder dessa
Seleção em função do respaldo que o Mano tem me dado. Não poderia
deixá-lo na mão. Sabemos que a pressão sobre o treinador era grande
naquele momento e fiz de tudo para ajudar
Saindo da Seleção para o PSG, você marcou um gol logo em sua estreia pelo clube. Foi melhor do que esperava?Não
esperava que fosse dessa forma, muito menos fazendo gol. É difícil para
um zagueiro fazer gols. e logo na estreia eu fiz um. Foi melhor do que
eu imaginava.
Como está a sua adaptação em Paris?Vou ser bem
sincero. É complicado. Não estou bem ambientando na cidade ainda. Não
achei casa. Essa semana é que eu vi uma que eu gostei, minha esposa
gostou. Estamos estudando uma proposta para fazer ao proprietário para
ver se essa questão se resolver o mais rápido possível. É uma cidade bem
bonita, mas é bem difícil a vida em Paris.
E o idioma?Não temos tradutor até porque não
precisamos muito. Quase todo o elenco fala italiano. Muitos vieram da
Itália. Com os outros, a comunicação, às vezes, é por mímica. Estou
fazendo aula para aprender um pouco mais, para pedir uma comida.
Brinquei com o pessoal essa semana porque estou comendo sempre a mesma
coisa no hotel. Quando eu saio, não passo fome, mas não como o que eu
quero (risos). Está sendo bem interessante. Espero que daqui para frente
seja ainda melhor.
Seu contrato vale até 2016. Depois, volta ao Flu?
- Se falar que eu não penso, vou estar dando uma de mentiroso. Não sei
se vai ser logo após o fim de meu contrato aqui. Se vou renovar ou não,
se vou para outro lugar ou não. Já falei algumas coisas com o meu
empresário, disse que o pensamento é encerrar a carreira onde tudo
começou para o futebol. Depois da doença, o Fluminense foi o clube que
me deu respaldo para eu jogar (
NR: Thiago teve tuberculose quando defendeu o Dínamo de Moscou, antes de ser contratado pelo Tricolor, em 2006).
Thiago exibe a camisa das Olimpíadas: capitão e homem de confiança de Mano (Foto: Rafael Ribeiro/CBF)