quarta-feira, 4 de abril de 2012

Jael foge da fama de bad boy, mas diz: 'Não me arrependo de nada'

Em busca de espaço no Sport, atacante afirma que Fla lhe deve salários e lembra soco em dirigente do Bahia: 'Muita gente sonhava fazer'

Por Lula Moraes Recife
Criciúma, Bahia, Portuguesa, Atlético-MG, Goiás, Kalmar (Suécia) e agora Sport. Esses são alguns dos clubes por onde o atacante Jael Ferreira Vieira, de 23 anos, jogou como profissional. Conhecido no meio do futebol como “Jael, o Cruel”, apelido que ganhou durante sua passagem por Salvador, o atleta conversou com o GLOBOESPORTE.COM/PE e negou que seja um bad boy. A fama de “marrento” surgiu após confusões no Bahia e na Portuguesa.
No Recife, onde chegou em fevereiro deste ano para defender o Sport, Jael vive um recomeço. A passagem pelo clube rubro-negro é encarada pelo jogador como um renascimento na profissão que abraçou ainda criança. Fora de campo, ele tem seguido à risca o script de afastar a fama de encrenqueiro. As únicas referências a uma possível “marra” são o vestuário e as tatuagens pelo corpo (uma delas é um leão, coincidentemente, o mascote do atual time). Fora isso, Jael não tem nada de cruel e mostra-se educado, tranquilo e paciente nas entrevistas.
No quesito futebol propriamente dito, Jael ainda precisa fazer mais para conquistar a torcida do Sport. Contratado com o status de “bomba”, o camisa 9 da equipe rubro-negra pernambucana fez apenas quatro gols no Estadual (bem atrás do artilheiro da competição, o companheiro de time Marcelinho Paraíba, que balançou a rede 12 vezes). O último gol do atacante ocorreu no dia 31 de março (vídeo acima) e foi celebrado em meio a lágrimas. O choro foi o desabafo de um atacante que quebrava um jejum de cinco jogos sem marcar e de um jovem que luta para não deixar mais uma chance escorrer pelas mãos – ou melhor, pelos pés.
Jael - Sport (Foto: Aldo Carneiro)Jael e o leão: jogador busca identificação com a torcida do Sport (Foto: Aldo Carneiro)
Como teve início o seu sonho em ser jogador de futebol? Você era mais um garoto pobre que sonhava em mudar de vida a partir da profissão?
Isso! Não fujo do padrão boleiro, vim lá de baixo. Meu pai e minha mãe sempre me deram apoio e tudo que consegui na vida foi por causa deles. Nunca passei fome, sempre tivemos as coisas lá em casa, mas éramos humildes. Meu pai era mestre de obra e sempre apostou em mim para jogar futebol. Por ser organizador de um time de várzea chamado Real Madrid, lá em Cuiabá, meu pai foi me estimulando, até eu conseguir um lugar nas categorias de base do Cuiabá, em 2005.
Jael gol Bahia (Foto: Ag. Estado)Apelido de Cruel surgiu no Bahia, time no qual
viveu melhor fase (Foto: Ag. Estado)
Como você foi descoberto?
Teve uma peneira do Juventude-RS em Cuiabá. Meu pai voltava de uma obra quando passou em frente do campo onde estavam acontecendo os testes. Conversa vai, conversa vem, ele acabou conhecendo dois olheiros do Fluminense e falou de mim. Eles disseram que queriam me ver e meu pai saiu correndo para me chamar em casa. Quando chegou, eu estava dormindo, não queria levantar. Lembro bem que disse: "Deixa pra lá, eu não quero saber de teste, já sou quase profissional, o que eu vou fazer por lá?". Não queria, estava com uma preguiça danada. Ele me puxou, me convenceu a conhecer os caras, que gostaram e me levaram para o Fluminense.
Antes de estourar pelo Bahia, em 2010, você rodou bastante para um jogador de 23 anos. O que houve?
Eu não tive tantas oportunidades. No Flumimense, não tive espaço, aí me profissionalizei para valer no Criciúma. Tive uma boa passagem por lá, na Série B de 2007, fiz meus gols. Devo muito ao Criciúma. Me destaquei e acabei indo para o Atlético-MG. Pelo Galo joguei 27 jogos no Brasileiro. Desses 13 partidas como titular, só que o time deu uma queda. Pelo menos conseguimos uma vaga na Sul-Americana. Não demorei porque tive uns pepinos contratuais por lá. Mas mostrei o meu valor, não é à toa que o Cruzeiro me contratou. Não dei sorte também na Raposa porque fiquei dois meses parado, contudido, num time que tinha Wellington Paulista e Kléber e foi vice-campeão da Libertadores em 2009. Não ia jogar, então fui para o Goiás, que tinha Fernandão como ídolo máximo e Felipe fazendo um monte de gol. Aí surgiu a proposta do Bahia.
Essas mudanças fizeram você repensar se queria seguir na carreira?
Nunca pensei abandonar a minha carreira de jogador. É o que eu sei fazer, é a minha vida.
Finalmente você chegou ao Bahia, numa passagem marcante. Foi o momento mais importante da sua carreira?
É normal sair, não vejo problema nenhum. Qual é o mal do jogador dar uma volta, se divertir, tomar uma cerveja? Acho que tem que fazer no momento certo, numa folga"
Jael
O Bahia já estava me sondando desde 2008. Ajudei o time a escapar do rebaixamento para a Série B , no melhor momento da minha carreira. Fiz gols importantes por lá. O Bahia foi muito importante para mim. Conheci pessoas que ligam para mim para saber como estou e quase todos os dias tem torcedor pedindo para eu voltar. Ganhei o reconhecimento da torcida. Foi no Bahia que ganhei o apelido de Cruel pelos meus gols. Só não me lembro exatamente em que momento isso aconteceu. Houve algumas coisinhas que mancharam um pouco minha passagem por lá, não gosto nem de lembrar (em referência ao soco que deu no gerente de futebol André Araújo) .
Você citou o problema extracampo... como foi? Você se arrepende?
Não me incomoda nem um pouco, não tenho remorso, foi uma coisa que aconteceu. Não me arrependo porque era uma coisa que muita gente sonhava fazer e acabou que eu realizei. Dizem que ele é sacana, não sei. Se dizem, deve ser. Até pedi desculpas na época, mas não quero falar sobre isso (em outra entrevista, Jael chegou a classificar o cartola como mau caráter) .
Você se acha um cara impulsivo ou inconsequente?
Já fui muito impulsivo, era expulso toda hora, mas minha vida mudou com o nascimento da minha filha, no final de 2010. Depois disso, fui revendo as minhas atitudes. Em campo, por exemplo, passei muito tempo sem tomar cartão. No Flamengo, foram 22 jogos sem receber um cartão amarelo. A pessoa muda naturalmente, é o crescimento. O cara vai vendo pessoas diferentes, conhecendo outros hábitos. Mas repito: não me arrependo de nada do eu que fiz.
Jael do Bahia com a filha (Foto: Arquivo Pessoal)O nascimento da filha ajudou Jael a repensar as
atitudes em campo (Foto: Arquivo Pessoal)
O fato de você ter vivido um dos melhores momentos da carreira no Bahia faz com que você tenha uma identificação com Salvador maior do que com outras cidades por onde passou?
Onde eu chego, seja em São Paulo ou no Rio de Janeiro, todo mundo me pergunta "Como está a Bahia?". Aconteceu isso aqui, no Sport. Não tenho sotaque, talvez seja a fisionomia, o biotipo, morei em Salvador e explodi no Bahia. Se eu tivesse surgido em São Paulo, pensariam que eu era paulista. Sou matogrossense, de ficar muito tempo no mato, curtindo a natureza de lá, raramente me veem na cidade. Quando estou de férias, minha vida é ficar pescando, na tranquilidade. Não tenho nada de baiano, apesar de admirar o povo de lá.
Voltando às questões extracampo, você teve outro problema na Portuguesa por conta de uma cotovelada em um jogador adversário?
Aconteceu contra o Paraná, na primeira rodada. Foi um caso isolado na Portuguesa, isso não acontece mais. Fiz mais do que isso por lá. Ajudei a classificar a Lusa para a semifinal do Paulista, depois de fazer um golaço contra o Paulista. Lembro dessas coisas.
Por que você acha que não deu certo no Flamengo?
Não tive a sequência que queria. Jogava uma partida aqui, outra ali e não deu. Esperava uma oportunidade maior este ano. Fiquei no Rio de Janeiro com o grupo reserva, enquanto os tiutlares foram para Bolívia, visando à Libertadores. Comecei bem, fiz dois gols na estreia do Carioca, contra o Bonsucesso, estive bem contra o Macaé. Já tinha sido sondado pelo Sport, mas preferi segurar um pouco. Nos juntamos aos titulares na Bolívia e vi que não ia ser aproveitado (a contratação de Vágner Love eliminou as chances de Jael no clube)
Jael comemora gol do Flamengo (Foto: Nina Lima / Vipcomm)Para Jael, faltou mais oportunidade no time do
Flamengo (Foto: Nina Lima / Vipcomm)
Você chegou a questionar o técnico Vanderlei Luxemburgo sobre essa falta de oportunidade?

Nem deu tempo de conversar com Luxembrugo. Quando decidi sair do Flamengo e rescindi o contrato, ninguém sabia de nada por lá. O vice-presidente não tinha conhecimento, apesar de o Sport ter acertado com o Flamengo. A presidente Patrícia Amorim não queria que eu fosse e passei duas semanas treinando na Ilha do Retiro sem conseguir a minha liberação, que estava travada.
O Flamengo deixou alguma má impressão para você?
Joguei pouco no Flamengo, mas há um histórico de desorganização. Todo mundo fala e escuta sobre isso. É ruim para a imagem do Flamengo. Vim para o Sport porque todo mundo me disse que eu poderia aceitar de olhos fechados, pois não atrasava salário, bicho e o que prometessem iriam cumprir. Na Portuguesa, a mesma coisa. Aí, no Flamengo, pego atraso salarial. Eles estão me devendo dois meses, é complicado.
Jael atacante da Portuguesa (Foto: Marcos Guerra / Globoesporte.com)Na Portuguesa, passagem marcada por uma
agressão (Foto: Marcos Guerra / Globoesporte.com)
Como foi jogar ao lado de Ronaldinho Gaúcho?
Foi um sonho. Quando era adolescente, querendo ser jogador de futebol, meu armário era cheio de pôster. Tinha de Ronaldinho, Zidane, Henry.... Cheguei ao Flamengo e quem veio falar comigo? O cara que tinha sido duas vezes o melhor do mundo, pentacampeão mundial, o jogador do pôster do meu armário veio à minha direção, teve essa humildade. Ele me recepcionou, perguntou se eu precisava de alguma coisa e me deu apoio. Foi incrível. No gramado, seus fundamentos são de alto nível. É um iluminado do futebol, um dos melhores da história.
No Rio de Janeiro, saiu muito com Ronaldinho para a balada?
Ele é um cara que não tem quem fale mal dele. É normal sair, não vejo problema nenhum. Qual é o mal de o jogador dar uma volta, se divertir, tomar uma cerveja? Acho que tem que fazer no momento certo, numa folga. Não é porque a gente é atleta que se pode proibir isso. É um direito de todo mundo. Fico vendo os torcedores criticando porque o jogador está no bar, mas só eles podem e a gente não? Tomo a minha cerveja e isso nunca me atrapalhou. Torcedor só quer saber do cara dentro de campo, mas eu tenho vida pessoal.
Você não tem receio de falar o que vem à cabeça. Isso já lhe rendeu algum problema?
Existe muita hipocrisia, falo sim, mas não sou bad boy como pensam. Por todos os lugares onde passei, as pessoas gostam de mim, têm carinho, e trato todo mundo da mesma forma. Existe o momento certo para se falar.
O Sport é um novo começo?
Vim para o Sport um pouco acima do peso e felizmente consegui alcançar o desejado (Jael chegou com 97 kg e agora está com 91 kg). O pessoal da fisiologia pediu para eu ficar tranquilo, que eu iria recuperar a minha movimentação, meu fôlego. Quero ser ídolo no Sport, mas, para isso, tenho que conquistar títulos, a começar pelo Pernambucano.
Jael - Sport (Foto: Divulgação/Sport)Jael tem suado a camisa no Sport para entrar em forma (Foto: Divulgação/Sport)

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