quarta-feira, 30 de março de 2011

Natália mergulha na fisioterapia: ‘Se ficasse chorando, o tempo ia passar’

De olho no Pré-Olímpico mundial, em julho, Falavigna encara até oito horas diárias de trabalhos físicos para acelerar o retorno: ‘A superação é no dia a dia’

Por Helena Rebello Rio de Janeiro
A confiança está nos olhos de Natália Falavigna. Pouco mais de um mês após passar por uma cirurgia para reconstrução do ligamento cruzado anterior do joelho direito, a lutadora de taekwondo corre contra o tempo para superar o diagnóstico de seis meses de recuperação e defender o Brasil no Pré-Olímpico Mundial, em julho, no Azerbaijão. E para ter condições de disputar a competição em alto nível, a atleta paranaense não poupa esforços: são pelo menos oito horas por dia dedicadas à recuperação, seja em sessões de fisioterapia ou treinos físicos.
Em vez de lamentar a segunda lesão no mesmo joelho em um ano, Natália só pensa no futuro e encara a maratona de aparelhos e exercícios no centro de treinamento do Time Rio, no complexo Maria Lenk, como mais uma etapa para alcançar a excelência em sua carreira. Com o pensamento fixo nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, a atleta do Fluminense garante que motivação não falta.
- Meu prazer é provar que sou capaz e consigo me superar no dia a dia. Quando tiver oportunidade de lutar por coisas maiores, sei que as pessoas vão olhar e falar: “A Natália está de volta” - afirma.
GLOBOESPORTE.COM: Como você reagiu assim que recebeu a notícia de uma nova lesão, no mesmo joelho, em menos de um ano?
Eu me dei o direito de chorar por meio dia, sentir o golpe, ficar frustrada, ligar para a minha mãe e tudo isso. Mas não tinha muito tempo. Não na data em que aconteceu. Se ficasse chorando, abatida, o tempo ia passar e eu ia continuar ali. Logo depois que assimilei o golpe, comecei a pensar o que poderia fazer e estruturar como seria feito. E preparamos um bom pré-operatório para depois voltar e já sair trabalhando. A confiança vem da capacidade e do sonho de ficar boa e voltar a competir.
Você sente mais confiança agora do que após a operação anterior? O que houve de diferente nos dois procedimentos?
Desta segunda lesão eu sinto uma firmeza no joelho como nunca senti. Tenho muita confiança, não tenho essa insegurança, medo. Isso não me passa, apesar de ser algo que normalmente acontece com o atleta. Sinto meu joelho como estava antes de ter qualquer tipo de lesão. Claro que não está 100% ainda, mas a confiança é muito boa porque me dá segurança. Tenho tranquilidade de saber que esta dando certo, caminhando bem. Da primeira vez, infelizmente as coisas não saíram como gostaríamos, não pela recuperação, mas acontecem coisas que fogem ao alcance dos profissionais que trabalham comigo. Dessa vez o procedimento realmente resolveu. O importante é que detectamos os problemas, o que aconteceu de errado, e agora trabalhamos para me recuperar o mais rápido possível. Agora é trabalhar para ficar bem e voltar a lutar, que é uma coisa que tenho saudade de fazer.
natalia falavigna  taekwondo treino (Foto: Helena Rebello/Globoesporte.com)São pelo menos seis horas de fisioterapia por dia
(Foto: Helena Rebello/Globoesporte.com)
Você trabalha seis dias por semana, com seis ou sete horas de fisioterapia, mais duas de treino físico e natação três vezes por semana. A carga não é muito pesada?
É o que posso fazer. Agradeço a possibilidade de trabalhar com toda a intensidade e ter uma equipe boa para passar por tudo isso comigo. Não tenho o que reclamar. É puxado, mas é o meu objetivo. Eu faço com muito amor, muito carinho e valor. Não reclamo. É um mal necessário e sei que é bom pra mim. Não temos que gostar de tudo. A forma como uma pessoa assimila o que ela não gosta, ou não é tão prazeroso, é que faz a diferença. Vou passar o processo de uma maneira diferente. Amadureci devido à primeira lesão. Tenho passado de uma maneira mais tranquila, vendo com outro olhar. Faço o que deve ser feito, e fico feliz quando acaba e sei que dei o melhor possível.
A natação já fazia parte do seu treinamento? Pretende mantê-la?
A natação faz parte do planejamento neste momento porque me permite fazer um treino aeróbico, mais intervalado, que mexe com a capacidade física sem forçar a minha perna. Nado, simulo corrida. Se vou manter, vai depender muito da recuperação. O que tenho feito com minha equipe é reestruturar o planejamento. Nunca defino nada sozinha. Neste momento, tudo o que posso fazer para não ficar parada é gostoso. Eu gosto de nadar, mas molha o cabelo todo dia, entra água no ouvido (risos)... estou brincando. Mas agradeço a oportunidade de poder nadar. Estou podendo me movimentar, cansar, trabalhar. Se não tivesse água ia ser pior ainda para voltar.
natalia falavigna  taekwondo (Foto: Helena Rebello/Globoesporte.com)
Simpática, Natália sorri bastante durante entrevista
(Foto: Helena Rebello/Globoesporte.com)
Você comentou sobre o cabelo. É muito vaidosa? Não se incomoda com cicatriz?
Sou bastante vaidosa. Agora o foco principal está todo voltado no joelho, em conseguir obter o máximo de informações de treino durante o dia. Gosto de me arrumar, ter um dia de descanso. Mas nesse momento não é a prioridade e nem o que tenho feito. A cicatriz até ficou pequena comparada à outra. Vai sair, e faz parte do meu trabalho. Bom é  poder olhar e saber que a cirurgia ficou boa, e que vou voltar.
Essa maratona de fisioterapia é para o Pré-Olímpico Mundial, em julho. Você acredita que vai conseguir se preparar em um prazo menor do que o médico estipulou?
Normalmente são seis meses de recuperação. Existe uma possibilidade de quatro a nove meses em estudos científicos. Se tem essa possibilidade de quatro meses, é nela que eu me agarro e nela que eu trabalho. O "não" eu já tenho. O "sim", estou batalhando para que consiga tê-lo. Procuro cuidar de cada detalhe da minha recuperação, desde a minha alimentação, o horário que eu vou dormir, para que esteja 100% quando tiver o aval médico para voltar a competir.
Ficar fora do Mundial, agora em maio, foi o golpe mais duro?
Com a lesão eu perco a oportunidade e infelizmente não vou poder buscar uma segunda medalha de ouro no Mundial. Mas eu tenho um objetivo maior, que é chegar nos Jogos Olímpicos de 2012. E hoje eu tenho objetivo maior ainda que é ficar bem para poder batalhar pra isso. Tenho meus sonhos, mas são degraus, e nesse momento o único em que tenho que pensar é na recuperação. As coisas vão acontecer naturalmente. Ainda não sei se vou poder ir ao Pan porque depende de como a confederação vai definir esses processos seletivos. A competição em que eu puder ir e me sentir confiante, vou querer participar. Quando tiver oportunidade de lutar por coisas maiores, sei que as pessoas vão olhar e falar “A Natália está de volta”.
Natalia Falavigna Taekwondo (Foto: Helena Rebello/Globoesporte.com)Com a preparadora física Lilian Barazetti: mais 2 horas de trabalho (Foto:Helena Rebello/Globoesporte.com)
Há uma equipe grande te dando suporte. O Fluminense também te ofereceu estrutura para a recuperação?
Tenho tantas pessoas que estão ao meu lado e passam por isso junto comigo que a carga diminui muito. A superação é um trabalho de confiança. No processo de diluir isso com os outros integrantes da equipe, caminhamos juntos, desde que haja um objetivo em mente e todo mundo trabalhe com o coração focando nesse objetivo. O Fluminense me deu todo o apoio, mas eu já tinha a estrutura do Time Brasil e fica mais fácil situar todo o tratamento no mesmo lugar, já que eu já tenho que ir de tempo em tempo a São Paulo (fazer a revisão com o cirurgião Wagner Castropil). Mas tanto o Fluminense quanto todos os meus parceiros continuam me dando suporte para o que for preciso. Nesse período em que estou inativa, meus profissionais têm tranquilidade porque estão recebendo. Faz diferença nesse ponto. Espero retribuir o que eles têm acreditado e me dado respaldo para ficar bem.
E o trabalho com a escolhinha de taekwondo no Fluminense? Chegou a começar ou a lesão impediu? Qual seria exatamente o seu papel?
Eu daria um apoio pedagógico assim como fazia na minha academia no Paraná. Tem aula para crianças a partir dos 3 anos já. Lá em Londrina eu treinava e coordenava, com outros profissionais me ajudando. Até hoje quando vou lá e passo na academia acompanho um pouco. Da escolinha se faz uma peneira com o tempo, e o clube pode dar um suporte e redirecionar, dar um respaldo para a criança evoluir como atleta. Acabamos adiando minha participação para que eu possa focar no processo de recuperação, pelo menos nessa primeira fase. Até porque, por estar no início do projeto, é melhor que eu possa estar mais presente, o que não seria possível agora.
Que lição você tira desse processo de recuperação?
natalia falavigna  taekwondo (Foto: Helena Rebello/Globoesporte.com)Natália ouve a explicação do fisioterapeuta com
atenção (Foto: Helena Rebello/Globoesporte.com)
A superação é no dia a dia. Quando as pessoas não acreditam em você, tem que ouvir os críticos, pessoas de dentro da modalidade que tendem a criticar e querer que você não chegue e não consiga crescer. Não pensam no bem maior do esporte. Meu prazer é provar o contrário, que eu sou capaz e consigo me superar no dia a dia. O momento de uma competição, uma conquista, é um pedacinho no todo. Acredito que nada é por acaso. Deus não colocou isso na minha vida para que passasse ao acaso. Tudo tem sua razão e seu ensinamento e momento. Minha fé é ter a certeza de que não é à toa e que no momento certo vou entender cada obstáculo que veio na minha carreira. Acabo, com a fé, tendo a tranquilidade e paciência que tenho que vencer dia após dia sem correr demais e frear demais, tem que acordar todo dia como a mesma disposição como se fosse treinar. Esse período é mais difícil que treinar. Treinar cansa o corpo, a cabeça, mas é extremamente prazeroso. A fisioterapia, a dificuldade, entre aspas, da volta, isso é o que exige da gente querer voltar e provar para si mesmo que é possível. Pra mim a fé é conquistar o impossível.

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