terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Lyoto: 'Se tivesse mais 30 segundos de luta eu teria vencido por nocaute'

Peso-médio se diz mais esforçado que talentoso, analisa estilo de Vitor Belfort e e garante que conhece a essência do possível rival pelo cinturão do UFC

Por Rio de Janeiro
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Já passava das 15h quando Lyoto Machida apareceu para a entrevista marcada em um hotel na Zona Sul do Rio de Janeiro. Usando uma camisa de patrocinador, calça jeans e uma bota ortopédica no pé esquerdo, o lutador caminhava com alguma dificuldade, e assim que se sentou para iniciar o bate-papo, pediu um balde de gelo para colocar o pé. Ao retirar a bota, a visão impressionou. O pé de Machida apresentava um grande inchaço e algumas marcas roxas, que davam a impressão de uma fratura. Lyoto mergulhou o pé no balde com gelo com uma leve expressão de dor, que sumiu instantaneamente. Ignorando a água gelada, o peso-médio do UFC conversou com o Combate.com, falando sobre a luta contra Mousasi e analisou seus dois prováveis próximos adversários - Vitor Belfort e Chris Weidman.
Lyoto Machida MMA UFC (Foto: Marcelo Russio)Lyoto Machida diz que conhece o jogo de Vitor Belfort por já terem treinado juntos (Foto: Marcelo Russio)
- O Vitor é um cara muito perigoso, que tem um golpe forte e tem uma boa velocidade e combinação no boxe, e tenta surpreender a cada luta com um golpe diferente, tentando buscar um novo caminho. É um ponto forte dele e que eu tenho que estar atento. Mas eu já treinei com o Vitor, e conheço o jogo dele. Sei que ele mudou de lá pra cá, mas a essência dele eu sei qual é, e o conheço um pouco mais. O Weidman é um cara novo que apareceu e que se destacou. Tenho acompanhado desde a luta contra o Demian Maia, e vi que ele é um cara forte, consistente, que tem um wrestling muito bem definido, um chão muito bom, mas vejo muitos buracos no jogo dele em pé. Ele é completo de MMA, mas não é um especialista na luta em pé. O meu estilo de luta não muda para enfrentá-lo, mas a estratégia muda. Se eu tenho que chutar mais, socar, chamar para o meu golpe... a estratégia muda, mas o estilo, não.
Lyoto também revelou um momento importante em sua vida como lutador: a primeira vez que venceu o irmão Chinzô, tido por ele mesmo como o mais talentoso dos três filhos de Yoshizo Machida dentro da arte marcial do caratê.
- Acho que o Chinzô é o mais habilidoso dos irmãos, porque ele ganhou muito mais no caratê do que eu. Eu sempre tentei vencê-lo através do esforço, mas não conseguia ganhar. Até que um dia deu um estalo e eu consegui. A partir daquele dia tudo mudou, e as coisas já não eram mais como antes. Aquilo mexeu comigo, pelo ganho de confiança, e pode ter mexido com ele na perda de confiança, não sei. Dentro da arte marcial o Chinzô tem mais habilidade, e eu consegui me esforçar para buscar essa distância.
Confira em tópicos a enrevista completa de Lyoto Machida:
Gegard Mousasi Lyoto Machida UFC Jaraguá do Sul (Foto: Rodrigo Malinverni)Gegard Mousasi e Lyoto Machida se enfrentaram no
UFC em Jaraguá do Sul (Foto: Rodrigo Malinverni)
Luta contra Mousasi em Jaraguá do Sul

"Eu achei que foi uma luta técnica, mas que teve os dois buscando em certos momentos. Eu tentei conectar e ele também, no estilo dele, tentando buscar uma definição. Foi uma luta técnica, mas uma luta forte, em que nós dois nos machucamos um pouco buscando o nocaute ou a finalização. Eu acho que se tivesse mais 30 segundos de luta eu teria ganho por nocaute. No fim da luta eu encaixei um golpe de cima para baixo e ele sentiu, ficou de quatro, meio que se protegendo e pedindo pra parar. Mas ali soou o gongo e a luta acabou naquele exato momento, me tirando a chance de finalizar o combate. Mas diante um lutador no nível em que nós dois nos encontramos nem sempre dá para vencer por nocaute. Foi uma luta muito dura, que todo mundo estudou para chegar ali e definir."
Ufc Jaraguá treino aberto Gerard Mousasi (Foto: Rodrigo Malinverni)Gegard Mousasi mostrou frieza durante sua estada
em Jaraguá do Sul (Foto: Rodrigo Malinverni)
Frieza de Mousasi
"Aquele é o jeito dele. O Mousasi mostra muita tranquilidade e frieza. Ele é um autêntico lutador profissional, um cara que se prepara para lutar sem se importar com quem irá enfrentar e não faz show. Ele se preocupa em ganhar a luta e mostrar o melhor dele. Nesse quesito eu pareço um pouco com ele. Eu quero fazer o meu trabalho e acabou, não me preocupo em dar show ou em provocar, falar do adversário. Senti ele neutro quanto a isso."
 
"Roubo" do boné na entrada para o octógono
"Eu nunca esperava que fossem pegar o boné, porque nunca havia acontecido isso comigo (risos). Já tinha acontecido com o Minotauro até, mas comigo não. Eu passei rápido para entrar no octógono e, quando senti arrancarem o boné da minha cabeça, eu disse pro cara devolver, porque eu precisava dar uma satisfação ali. O cara jogou o boné de volta, porque deve ter se sentido constrangido. O show ia parar ali por causa dele. Eu não podia entrar sem o boné, e fiz o sinal pra ele devolver. Isso eu nunca tinha visto na minha vida (risos)."
Confirmação da disputa do cinturão
"Nada foi falado claramente, mas é lógico que eu quero uma disputa de cinturão. Mas não posso viver em função disso, dar cada passo na minha vida pensando nisso. Se eu fizer isso, vou deixar de viver esperando uma resposta dos outros, e não minha. Eu tenho que dar a minha resposta, que é fazer o meu caminho. Se tiver que fazer mais uma luta, eu faço, porque ela vai me deixar mais tarimbado para a disputa do cinturão. Eu estou em um bom ritmo, lutando a cada três ou quatro meses no máximo, e isso é importante para esperar a chance de lutar pelo cinturão."
Lyoto Machida banheira de gelo treino mma ufc  (Foto: Reprodução)Lyoto Machida sofre durante um mergulho na banheira
de gelo após os treinos nos EUA (Foto: Reprodução)
Talentoso ou esforçado?
"Eu sou mais esforçado. Desde quando comecei a minha carreira, eu busquei muito os resultados porque eu sempre achei que esse era o meu meio de vida. Meu pai me ensinou isso. Se eu quisesse ser um lutador profissional, eu teria que estar pronto para lutar a qualquer momento, sempre estar treinando. Poderia não estar pronto para a minha melhor performance naquele dia específico, mas sempre estar me movimentando, sabendo que um desafio pode aparecer a qualquer hora. E o desafio, às vezes, pode aparecer fora do octógono mesmo, como um desafio emocional, psicológico, que te faça enfrentar situações. A arte marcial te dá essa base para ter autoconfiança e autoestima para saber a resposta certa no momento certo. Pensando nesses valores, eu me considero um cara muito esforçado, buscando uma melhor qualidade de vida no lado profissional e pessoal."
Decisão de morar nos EUA
"Morar nos EUA foi uma decisão tomada dentro de um período que eu queria passar lá, e eu acabei ficando. Mas eu me adaptei muito bem, e resolvi ficar. O plano inicial era passar três meses me preparando para uma luta, e eu gostei de ficar lá porque eu senti que teria um foco melhor, me afastar das pessoas que eu gosto para poder render e explorar mais do Lyoto lutador. Talvez, em um outro momento, eu não conseguisse explorar esse lado, e tirar só 30% do que eu poderia. Hoje eu consigo tirar mais, porque o foco é muito maior. Não sei explicar bem o porquê, mas é maior."
Lyoto Machida pé inchado MMA UFC (Foto: Marcelo Russio)Lyoto Machida mostra o pé esquerdo muito inchado
após a luta contra Mousasi (Foto: Marcelo Russio)
Lesão no pé esquerdo
"A lesão aconteceu no terceiro round, quando eu chutei a perna do Mousasi e ele levantou o joelho, e isso machucou o meu pé. Depois eu machuquei ele também em um chute que eu bloqueei, e ele parou de chutar. Não ficou tão ruim quanto eu imaginava, já estou andando melhor. Depois da luta estava muito inchado, eu não conseguia andar. Ainda não vi a luta novamente, mas acho que foi parecido com o bloqueio que o Weidman fez e que causou a fratura no Anderson, porque assim que eu chutei e pegou no joelho dele, o local inchou. Quando eu fui para o intervalo, eu sentei no córner e vi que tinha um calombo em cima, e eu achei que tinha machucado."
Inspirações como lutador
"Quando jovem, eu analisava muito a família Gracie e os caras que tinham sucesso e eram grandes lutadores, como o Fedor Emelianenko, Minotauro e outros que me inspiravam. Hoje eu busco essa inspiração dentro de mim mesmo, analisando as minhas lutas e o que eu tenho que melhorar. Eu já estou no topo da minha carreira, e vou ter que parar de lutar daqui a uns três ou quatro anos, dependendo de como o meu corpo vai reagir."
Lutaria pelo Japão?
"Eu já lutei por um escritório no Japão, mas ninguém nunca me chamou para representar o Japão, até porque eu não iria. Não seria justo. Eu tenho um pouco do meu sangue japonês, agradeço a cultura que eu aprendi através do meu pai, mas eu sou brasileiro e não tenho porque defender uma outra nação. Não preciso disso."
Carreira como treinador
"Depois dessa carreira de lutador é uma tendência ser treinador, ensinar. Não sei exatamente se formar atletas, mas faz parte da minha característica. Eu sou formado em educação física e gosto de ensinar. Não sei ainda se eu formaria atletas ou se seria um educador para ajudar as pessoas a buscar um outro lado da arte marcial que nós não conseguimos enxergar. No esporte de alto rendimento nós só vemos o lado do atleta, do resultado. Mas no lado pessoal a arte marcial tem muito mais a oferecer do que isso. Imagina você conseguir fazer uma pessoa superar um problema e dar respostas positivas dentro da vida dela. Acho que isso pode ser muito mais gratificante do que formar um atleta."
Chinzô Machida (Foto: Adriano Albuquerque)Chinzô Machida, irmão e treinador de Lyoto Machida, é
tido como o mais habilidoso(Foto: Adriano Albuquerque)
Atuação do irmão Chinzô na sua carreira
"Meu irmão sempre me acompanhou muito nos treinamentos. Hoje, comigo morando nos EUA, ele vai para lá de vez em quando passar uma temporada lá, não necessariamente perto da luta. Nessa, por exemplo, ele não foi para lá próximo da luta contra o Mousasi, mas como ele já conhece todo o meu jogo, em uma semana a gente consegue desenvolver uma estratégia para cada luta."
 

Quem é o mais habilidoso entre os Machida?
"Acho que o Chinzô é o mais habilidoso dos irmãos, porque ele ganhou muito mais no caratê do que eu. Eu sempre tentei vencê-lo através do esforço, mas não conseguia ganhar. Até que um dia deu um estalo e eu consegui. A partir daquele dia tudo mudou, e as coisas já não eram mais como antes. Aquilo mexeu comigo, pelo ganho de confiança, e pode ter mexido com ele na perda de confiança, não sei. Dentro da arte marcial o Chinzô tem mais habilidade, e eu consegui me esforçar para buscar essa distância."
Participação do pai na preparação para as lutas
"Meu pai até fala, mas quando você tem uma essência formada, uma característica marcante dentro do seu estilo, é muito fácil de fazer uma modificação na sua área. Não é necessário um mês de treinos para você poder atuar. Aquele chute que eu dei no Randy Couture, por exemplo, eu e o meu pai juntos treinamos por três ou quatro semanas, três horas por semana. Não só aquele chute, como também técnicas parecidas, e na hora da luta o golpe saiu. Não precisei de seis meses para aprimorar aquele golpe. Na semana da luta meu pai analisa, me vê fazendo o movimento e me diz para corrigir uma coisa ou outra. Em minutos eu consigo melhorar, porque está dentro da essência."

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