domingo, 23 de junho de 2013

Felipão e Murtosa: 'irmãos' após empurrões, bronca e desconfiança

Amizade entre técnico da Seleção e seu braço direito completa 30 anos, mas início foi conturbado: ‘Faz a sua que eu faço a minha’, disse Scolari

Por Alexandre Lozetti Salvador
É quase impossível dissociar Luiz Felipe Scolari e Flávio Teixeira, o popular Murtosa. Eles parecem um só. A mesma expressão, o mesmo bigode. Fruto de uma cumplicidade de 30 anos entre o técnico da seleção brasileira e seu auxiliar. Mais que isso, seu braço direito. Ou, sem exagero, seu irmão. Mas nem sempre foi assim. Muito pelo contrário.
Felipão e Murtosa trabalharam juntos pela primeira vez em 1983, no Brasil de Pelotas. E a primeira frase do treinador não foi nada simpática:
- Faz a sua que eu faço a minha.
flavio murtosa e luiz felipe scolari felipao brasil caminhada (Foto: Dida Sampaio / Agência Estado)'Irmãos' são companheiros de caminhada (Foto: Dida Sampaio / Agência Estado)
A apresentação foi cercada de desconfiança porque Scolari temia que o colega quisesse derrubá-lo do cargo. O sonho da diretoria era que Murtosa assumisse. Ele era técnico do Farroupilha, também de Pelotas, e recebeu oferta vantajosa para treinar o Brasil. Mas não aceitou porque, para melhorar o time, precisaria dispensar alguns jogadores veteranos, que atuaram ao seu lado quando ele era jogador.
Com uma carreira de técnico de apenas dois anos, Murtosa, aos 29, não comprou a briga, e pediu o mesmo salário para ser preparador físico. O Brasil aceitou, e em seguida contratou um treinador que durou apenas um mês e meio. A pressão para que Murtosa assumisse voltou, e, por meio do capitão Cacau, veio a sugestão: Luiz Felipe Scolari, então no Juventude.
Murtosa confiou na indicação e endossou à diretoria. Até então, ele e Felipão só se conheciam de dentro do campo, quando se enfrentavam pelos clubes do interior gaúcho. Um era atacante, o outro, zagueiro.
- Eu tomava uns empurrões dele (risos) - relembra Murtosa.
Luiz Felipe Scolari e o auxiliar técnico Murtosa (Foto: Reprodução/SporTV)Scolari e Murtosa: amizade de longa data
(Foto: Reprodução/SporTV)
Os dirigentes compraram a ideia, e Felipão chegou ciente de que Murtosa era o nome preferido da cartolagem do Brasil de Pelotas. Por isso, fez questão de impor uma barreira ao colega de comissão técnica. A relação estremecida saltava aos olhos no Brasil de Pelotas. Tanto que um dirigente resolveu se intrometer.
José Rodolfo Azocar, falecido em 2007, indagou Murtosa sobre os problemas com o novo técnico.
- Eu disse que da minha parte não havia problema algum, mas achava que ele não estava muito a fim de trabalhar comigo. Só me dava trancos.
Azocar resolveu levar a dupla para jantar numa galeteria após uma semana de má convivência. Sentados à mesa, resolveram a questão. Felipão questionou Murtosa se ele queria ser técnico ou preparador físico.
- Falei para ele ficar tranquilo porque, se eu quisesse ser técnico, àquela altura eu já seria. Não iria derrubá-lo. E naquele momento ele já me perguntou que mudanças eu achava que deveriam ser feitas. Acabou o problema.
O jantar selou a amizade e uma boa campanha do Brasil de Pelotas, que se sagrou vice-campeão gaúcho, atrás apenas do Grêmio, que seria campeão mundial naquele ano.
Desde então, Felipão e Murtosa se separaram apenas três vezes, e muito rapidamente: em 1997, em 2000 e em 2002, mas só depois de conquistarem o pentacampeonato mundial com a Seleção. Hoje, nos treinos, o técnico e o Baixo, maneira como ele chama seu braço direito, evidenciam a cumplicidade: conversam muito, dividem as tarefas e compartilham segredos sobre a equipe.
- É uma amizade maior que uma irmandade. Raramente passo tanto tempo com um irmão, como passo ao lado dele. Nesses 30 anos tivemos muitas dificuldades, e sempre superamos todas elas juntos – vibra o auxiliar, que foi desafeto por uma semana.

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