Pôquer, pizza e alegria: unidos por tragédia, Neto, Ruschel e Follmann celebram a vida
Às vésperas do encontro de Chapeconse e Atlético Nacional pela Recopa, reuniões descontraídas fazem parte da rotina dos sobreviventes, que exaltam coisas simples do cotidiano
Leia com atenção as palavras a seguir. Antes, levante, caminhe, mesmo que por três ou quatro passos. Abrace quem você gosta e está perto de você. Coisas simples, não é? Coisas que há quatro meses valem muito mais para Neto, Alan Ruschel e Follmann. Às vésperas do encontro de Chapecoense e Atlético Nacional pela Recopa, o trio de sobreviventes da tragédia de 29 de novembro deseja passar somente uma mensagem: celebrem a vida. Mesmo que na simplicidade de uma roda de pôquer regada a pizza que une suas famílias em clima descontraído no longo e bem-sucedido processo de recuperação.
Alan e Follmann são amigos desde as categorias de base do Juventude. Sempre foram unha e carne. O sorriso fácil do lateral encontrou no violão e senso de humor do goleiro um parceiro de mais de uma década. Coube ao acidente aproximar Neto dessa roda de amigos. Mais do que a rotina dolorosa de fisioterapia, os encontros fora do ambiente da Arena Condá se tornaram uma constante. O zagueirão sério e de fala mansa se revela brincalhão. Provocações surgem de parte a parte, sempre com um sorriso que teima em não sair do rosto dos três. Ainda bem!
- Quando o cara coloca a senha do Wi-Fi com o nome do irmão dela (a noiva), olha... - brinca Neto com Alan Ruschel pouco depois de dizer que "a bermuda do Follmann está parecendo quadrinhos, gibi da Turma da Mônica" - Depois de tudo que aconteceu, impossível não criar um vínculo mais do que já tinha. O Alan e o Follmann são brincalhões, gente boa. Gente como a gente.
Descontração do mesmo Neto que falou as palavras que direcionam a vida de cada um dos três desde aquela madrugada. Ainda no leito do hospital, prestes a deixar Medellín, o zagueiro foi ao encontro para um recado que não sai da cabeça de Follmann:
- Uma coisa que não sai da minha cabeça, no último dia que estava na Colômbia, foi que o Neto chegou para mim e disse: "Comemore sua vida. Celebre sua vida!". São essas palavras que quero passar, vamos comemorar a vida. Realmente, foi um milagre. Deus nos pegou no colo, fomos os escolhidos para essa segunda chance, e essa recuperação está sendo positiva aos olhos das pessoas de fora. Poder acrescentar um pouco a elas, nos deixa muito felizes.
Felizes como os encontros semanais. Por mais que não tenham o mesmo talento para o carteado como Alan, Neto e Follmann fazem questão de estar juntos com seus familiares. Momento que o goleiro confessa ser mais do que somente descontração. Naturalmente, é algo que faz parte do processo de recuperação:
- Sabemos que precisamos um do outro. Damos força uma para o outro. Isso é muito bacana. Nos vemos todos os dias, conversamos bastante e isso nos acrescenta. Precisamos estar juntos.
Passados quatro meses e dois dias do acidente, o trio faz questão de valorizar cada conquista diária. Adaptado às próteses, Follmann já caminha com desenvoltura, sem necessidade nem mesmo do apoio de muletas. Neto já recuperou a massa muscular e está na reta final de fisioterapia para voltar aos gramados. E Alan Ruschel é quem está mais próximo da chamada "concretização do milagre".
Primeiro sobrevivente a ter alta, o lateral já está entregue ao departamento de preparação física, voltou para rotina de treinamentos com o elenco no CT Água Amarela e até trabalha com bola. Ainda há preocupação em evitar impacto por conta da lesão na coluna, mas a rotina de atleta profissional está restabelecida. Conquista que vai muito além de si próprio:
- Não temos noção da dimensão do que representamos hoje, mas, de alguma forma, tentamos mostrar para o mundo que estamos nos superando depois de tudo que passamos. O Follmann feliz só pelo fato de voltar a caminhar, o Neto também, vimos a alegria só por trotar em volta do campo. Eu também por poder treinar. São coisas que não têm como explicar.
Presença certa na série de homenagens prevista para a final da Recopa, terça-feira, às 19h15 (de Brasília), na Arena Condá, contra o Atlético Nacional, o trio de sobreviventes tem a consciência de que tudo que aconteceu em Medellín fará parte de seu dia a dia. Memórias que estimulam o futuro:
- Agora, é o momento de olhar para frente, tocar a vida e celebrar. Temos muita coisa bacana e positiva na terra ainda! - definiu Follmann.
Bacana, positiva e simples. Como caminhar ou abraçar quem está próximo para celebrar a vida.
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