sábado, 23 de julho de 2016

Tamanho é documento? Saiba por que os baixinhos dominam a ginástica

Menor atleta da Rio 2016, Flávia Saraiva é exemplo de que ginastas baixos levam a melhor; coordenadora explica: "Precisa ter centro de gravidade mais próximo da terra"

Por São Paulo
Flavia Saraiva trave evento-teste de ginástica rio 2016 - prata (Foto: RICARDO BUFOLIN/CBG)Com 1,38m de altura, Flavinha é a ginasta mais jovem garantida nos Jogos do Rio 
(Foto: Ricardo Bufolin/CBG)
É difícil não se encantar com Flávia Saraiva. O carisma da ginasta de 16 anos arrebata fãs, que se impressionam com os movimentos difíceis e precisos. Como pode uma garota de apenas 1,33m e 31kg voar em piruetas e mortais? É justamente a baixa estatura um ponto forte da Pequena Notável. Na ginástica artística, tamanho é documento, e quem é menor leva a melhor. Mesmo que haja perfis de biotipos variados nessa modalidade, há duas regras básicas: ser magro e ser baixo.
- É o esporte dos mais baixos. Precisa ter o centro de gravidade mais próximo da terra. Isso faz com que os baixinhos tenham mais equilíbrio. Um cara do basquete é mais desengonçado. Imagina um cara daquela altura fazendo ginástica? Para ele rodar no ar seria muito mais difícil. Você tem mais massa corporal para girar. Então é um esporte em que pessoas mais baixas têm mais habilidade. Hoje, mesmo entre os mais baixos se vê um biotipo mais diferenciado. Agora, gordura? Nem pensar. É sempre magrinha e com uma musculatura bem definida - explica Georgette Vidor, coordenadora da seleção brasileira feminina de ginástica artística.
Atleta mais baixa do Time Brasil, Flavinha é o exemplo máximo de que ginastas mais baixos levam vantagem. Com 5m de comprimento e apenas 10cm de largura, a trave de equilíbrio parece maior para ela do que para ginastas altas - a jovem é candidata ao pódio no aparelho. Há mais espaço e segurança para a brasileira fazer sequências de mortais, com um elevado controle corporal justamente por ter baixo centro de gravidade.
Simone Biles, Mundial de Ginastica (Foto: Ricardo Bufolin/CBG)Baixinha e potente, Simone Biles é a número 1 da ginástica na atualidade (Foto: Ricardo Bufolin/CBG)
A Pequena Notável puxa para baixo a média de altura da equipe feminina de ginástica do Brasil, que tem 1,48m de estatura média - a média nacional para mulheres é 1,61m. O grupo segue a tendência internacional. A maioria das ginastas na Rio 2016 tem entre 1,48m e 1,55m. Dona de 10 ouros e 14 medalhas nos três mundiais deste ciclo olímpico, Simone Biles figura como maior estrela da modalidade e é favorita a cinco dos seis títulos femininos nos Jogos. A altura de 1,45m também é um trunfo da americana de 19 anos, que chama a atenção pela potência muscular especialmente no solo e no salto.
- Agora com os especialistas, ficou um pouco diferente. No salto, você já vê meninas mais parrudas, como a Simone e a Giulia (Steingruber, suíça). Nas paralelas temos dois biotipos: o das inglesas, que são grandes e mais fortes, e as chinesas, muito magrinhas - contou Georgette.
Entre os homens, a regra é a mesma: ginastas baixos, magros e com musculaturas bem definidas. A maioria dos ginastas já garantidos tem entre 1,58m e 1,68m - a média da equipe brasileira é 1,66m de altura, enquanto a média nacional para homens é 1,73m.
- Lógico que não pode ser um atleta muito alto e tem que ser magro. Hoje já vê alguns de estatura mediana. São atletas com pernas leves e ombros largos. Nas décadas de 70 e 80 eram ainda mais baixos. Agora está mais variado, mas não pode ter mais de 1,73m. Fica mais difícil - contou Renato Araújo, técnico-chefe da seleção masculina brasileira de ginástica artística.
Alexander Shatilovo nos Jogos Europeus (Foto: Getty Images)Alexander Shatilov é o ginasta mais alto dos Jogos, com 1,83m de altura (Foto: Getty Images)
O japonês Kohei Uchimura, dono de dez títulos mundiais e invicto no individual geral desde 2009, está dentro do padrão, com 1,60m de altura e 55kg. Há exceções, como o israelense Alexander Shatilov, que mesmo com 1,83m de altura tem dois bronzes do solo em Mundiais do último ciclo olímpico e voltou a figurar entre os candidatos ao pódio desse aparelho no Rio, em que atletas com potência muscular se sobressaem. Ginastas mais altos costumam ter menos dificuldade no cavalo com alças - atual campeão olímpico, o húngaro Krisztián Berki tem 1,78m, mas se aposentou depois de Londres.
Zanetti ouro argolas copa do mundo de ginástica sp (Foto: Vini Marins)Arthur Zanetti tem 1,56m de altura, 1,65m de envergadura e 61kg (Foto: Vini Marins)
- Você vê um cara que não tem bumbum bom no cavalo. Tem um biotipo muito característico para as argolas também - contou Georgette.
Para o aparelho em que Arthur Zanetti defende o título olímpico, ser baixo também é importante, mas porque indica que uma envergadura menor - a do brasileiro é 1,65m. Quanto maior a distância entre as mãos nas posições de força, maior a dificuldade para o ginasta manter a estabilidade. Simetria corporal e imensa força nos braços e ombros também são características indispensáveis nas argolas - boa parte da massa corporal do brasileiro está concentrada nos membros superiores. Atual campeão mundial do aparelho, o grego Eleftherios Petrounias é um pouco mais alto que Zanetti - tem 1,64m e 62kg contra 1,56m e 61kg do campeão olímpico -, ainda assim não tem estatura elevada.
Envergadura Arthur Zanetti (Foto: Reprodução/TV Globo)Envergadura menor de Arthur Zanetti ajuda para movimentos de força nas argolas (Foto: Reprodução/TV Globo)
A regra de ser baixinho criou um mito de que a ginástica artística prejudicava no crescimento de crianças e adolescentes. No entanto, muitos estudos científicos comprovaram o que técnicos há anos afirmam: não é a ginástica que deixa o atleta baixo, e sim o atleta baixo que tem maior espaço na modalidade.
Por isso, treinadores observam os pais dos ginastas para identificar possíveis campeões. Jovens com pais altos ou com histórico de obesidade na família têm menos chances de suportar as exigências do esporte de alto rendimento. Ginastas que crescem muito não raras vezes migram para outros esportes. É o caso da brasileira Fabiana Murer (1,72m) e da russa Yelena Isinbayeva (1,74m), campeãs mundiais do salto com vara. (veja abaixo o especial sobre Fabiana Murer do Jornal Nacional).


Flexibilidade, coordenação e capacidade anaeróbica também são características físicas fundamentais para os ginastas. Em um esporte de precisão, mente boa também é indispensável para minimizar falhas, sobressaindo atletas com controle emocional, perseverança e autoconfiança.
ESPORTE DE JOVENS?
Oksana Chusovitina no evento-teste (Foto: Ricardo Bufolin/CBG)Aos 41 anos, Oksana Chusovitina vai disputar sua sétima Olimpíada (Foto: Ricardo Bufolin/CBG)
Além de liderar rankings de atletas mais leves e mais baixos dos Jogos, a ginástica artística também costuma figurar entre as modalidades com atletas mais jovens. Há uma idade mínima de 16 anos para mulheres e 18 anos para homens - idade considerada em 31 de dezembro. Os jovens têm mais energia para a carga pesada de treinamentos e elevada exigência física da ginástica, por isso, especialmente no feminino, é comum medalhistas de ouro com menos de 20 anos.
Essa tendência, porém, vem sendo desconstruída. A evolução da ciência desportiva e dos aparelhos de ginástica, os atletas conseguem preservar mais o corpo, se mantendo por mais tempo no alto rendimento. A uzbeque Oksana Chusovitina é o ícone dessa mudança. Aos 41 anos, ela se classificou para sua sétima Olimpíada. Com um ouro e uma prata no currículo em Jogos, ela continua competitiva no salto e é uma inspiração para outras ginastas que miram a longevidade.
Outro exemplo dessa mudança pode ser encontrado na equipe feminina americana. Por ter um grande número de ginastas competitivas, os Estados Unidos não repetiram nenhuma peça em seus times desde Sydney 2000. As jovens sempre superavam as “veteranas” que tentavam uma segunda participação olímpica - campeã do individual geral em Pequim, Nastia Liukin buscou a classificação para Londres, mas não conseguiu vaga na equipe americana, que acabou com o título de 2012. No entanto, para o Rio de Janeiro, as americanas contam com duas remanescentes da última Olimpíada: Gabby Douglas (atual campeã do individual geral) e Aly Raisman (atual campeã do solo).
Gabby Douglas ginástica artística (Foto: Getty Images)Aos 20 anos, a campeã olímpica Gabby Douglas já é veterana no time americano (Foto: Getty Images)

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