domingo, 9 de setembro de 2012


Diferentes gerações: Yamasaki encontra árbitro do primeiro UFC

Personagens com trajetórias distintas no octógono analisam as regras atuais em contraste com o passado e destacam a ética nas artes marciais

Por SporTV.comRio de Janeiro
Comente agora
Mario Yamasaki e João Alberto Barreto viveram realidades distintas no UFC, mas chegaram ao centro do octógono atraídos por uma paixão em comum: a arbitragem. O primeiro possui quase 14 anos de experiência no Ultimate, enquanto o outro arbitrou nada menos que o primeiro evento da organização, em 1993. A convite do Sensei, os integrantes das duas gerações se encontraram na academia de Rodrigo Minotauro, no Rio de Janeiro, e analisaram os momentos marcantes de suas trajetórias, a evolução das regras do MMA e aquilo que consideram ser a essência de toda arte marcial: a ética.
- Hoje eles (organizadores) querem luta mais dinâmica. Antigamente, a gente deixava um pouquinho mais no chão. Não mudaram tanto as regras, mas querem que levante mais rápido as pessoas. Se está na grade, não querem que fique enrolando a luta – opina Yamasaki, paulista de 48 anos.
Conhecido carinhosamente por Barretão, João Alberto Barreto faz parte da primeira geração de árbitros do Ultimate. Ao lado de Helio Vigio, foi árbitro do UFC 1, evendo que deu o ponta pé inicial do Ultimate - disputado em novembro de 1993, nos Estados Unidos, e vencido, após três combates exaustivos, pelo ícone do jiu-jítsu Royce Gracie (filho de Hélio Gracie). Do encontro com Yamasaki, que ocorreria quatro anos depois, o carioca lembra o primeiro ensinamento que transmitiu: tanto melhor é o árbitro quanto menos ele for notado.
- Está separado da pessoa dele, não é a pessoa que está ali, ela está no papel de árbitro. Então, tem que ser julgado e avaliado como árbitro e não como pessoa – diz Barretão.
Repórter Felipe Awi entrevista Yamazaki e Barretão (Foto: Michel Siqueira)Repórter Felipe Awi entrevista Yamazaki e Barretão
(Foto: Michel Siqueira)
Yamasaki é atualmente um dos principais árbitros do UFC, tendo arbitrado pela primeira vez em 1999 (UFC 20). O contato com Barreto veio a partir do Universal Vale-Tudo, evento promovido pelo primeiro entre 1997 e 1998. Aos 48 anos, ele carrega um currículo de mais de 180 lutas, arbitradas em eventos como o Pride, Strikeforce, WEC e EliteXC,
- Foi o princípio nosso de estar no octógno, foi muito importante diferenciar o público, porque o nosso vale-tudo foi dentro da academia. Quando começaram eventos, que vemos torcida, xingando, eu entrei no primeiro UFC já sabendo arbitrar – diz.
A trajetória de Barretão até o octógono foi bem diferente. Discípulo de Hélio Gracie, do qual recebeu a faixa vermelha de jiu-jítsu, João Alberto foi um dos melhores lutadores da arte suave e vale-tudo nos anos 50 e 60.
- Eu fui, eu acho, o único lutador do mundo que lutava toda segunda-feira. Como lutador, eu me lembro bem que, para mim, o ringue era minha casa – diz João Alberto.
Barretão já era pai e estava formado em psicologia quando recebeu de Hélio o convite para trabalhar no evento americano organizado pelo filho mais velho do mestre, Rorion Gracie. Naquele ano de 1993, recorda, tudo ocorreu na base do improviso.
- As regras praticamente não eram estabelecidas, não eram escritas. Eram regras em que não valiam as coisas negativas: puxar cabelo, dedo no olho, mordida, quer dizer, as regras se baseavam nisso, nas infrações consideradas não éticas. Eram transferência das regras do vale-tudo no Brasil – diz.
Yamazaki, Minotauro, Barretão e Fábio Maldonado (Foto: Reprodução SporTV)Yamasaki, Minotauro, Barretão e Fábio Maldonado na academia de MMA (Foto: Reprodução SporTV)
Enquanto arbitrava lutas que se tornaram histórias, como a primeira de Royce Gracie no UFC, contra o americano Art Jimmerson, João Alberto não sabia que estava sendo observado atentamente por Yamasaki que, entre o final dos anos 80 e inicio dos 90, já vivia nos Estados Unidos. Faixa preta de judô e jiu-jítsu, Yamasaki respira artes marciais desde pequeno.
- Nasci no tatame, meu pai é oitavo dan de judô, ele teve 14 academias em São Paulo, então vivi minha vida dentro da academia – afirma o paulista.
Em 1989, Mário abriu uma academia de jiu-jítsu nos EUA que não deu certo. Era um tempo em que os americanos esnobavam a luta no chão. A sua vida mudou ao assistir ao primeiro UFC, onde viu de perto Barretão.
Nasci no tatame, meu pai é oitavo dan de judô, ele teve 14 academias em SP, então vivi minha vida dentro da academia"
Yamazaki
- Tive que trabalhar em outras coisas, fui ser garçom, dirigir caminhão, trabalhar em hotel. Em 93, quando a gente estava assistindo ao primeiro UFC, eu falei: “Está aí a minha chance de abrir outra academia, que foi em 94, que explodiu o jiu-jítsu nos EUA e eu não perdi mais nenhum episódio do UFC. Pensei em lutar, porque na época estava ativo, mas os Gracies não deixavam nenhum lutador de jiu-jítsu entrar, era só eles – recorda Mario.
Yamasaki chegou a empresariar lutadores como Dan Severn e Don Frye. Em 1998, ajudou a organizar o primeiro UFC no Brasil, em São Paulo. Foi quando fez uma pergunta simples ao mais famoso árbitro do evento, o americano John McCarthy.
- Eu perguntei para o John: “Por que você é o único árbitro do UFC?”. Ele falou: “Estou procurando alguém para me ajudar”. Eu me ofereci e e aqui estou – explica.
Desde o seu primeiro UFC, Yamasaki tem defendido a ética como a essência das artes marcias. Barretão defende o mesmo princípio.
- Eu acho que é a ética, porque a arte já veio do meu pai. Aprendi com o meu pai que o judô tem muita disciplina, e então passei para o jiu-jítsu - afirma.
- Acho que o grande juiz não é aquele que permite a infração. Ele tem que interferir porque ele não é o dono da regra, ele é o cumpridor da regra, então a presença dele é fundamental no campo ético – diz Barretão.
Diploma de graduação de João Alberto Barreto (Foto: Arquivo Pessoal)Diploma de graduação de João Alberto Barreto pela
academia Gracie (Foto: Arquivo Pessoal)
O apego ao que chamam de ética das artes marciais já criou problemas para ambos. Depois do UFC 1, João Alberto foi repreendido por Rorion, que não queria a interferência do árbitro na luta.
- O Rorion não gostou da primeira luta daquele lutador Teila Tuli, cujo adversário deu pontapé e, inclusive, tirou um dente dele. Naquela época, eu como juiz, árbitro, tive que parar a luta, para saber se ele estava em condições de continuar. E eu disse “Rorion, cada um pensa como quer, minha maneira de arbitrar é essa, não tem outra, compreendeu?” Quer dizer, fui muito claro – conta João Alberto.
Yamasaki já foi criticado por tomar decisões contrárias a lutadores brasileiros, como quando penalizou o capixaba Erick Silva no UFC Rio II e não deu a vitória a Vanderlei Silva contra Rich Franklin, no fim do segundo round, pelo UFC 147.
Barretão mediando luta do UFC 1, entre Royce e Jimmerson (Foto: Arquivo Pessoal)Barretão mediando luta do UFC 1, entre Royce e Jimmerson (Foto: Arquivo Pessoal)
- Não é que eu pego no pé dos brasileiros, eu tento seguir a regra. Tive que penalizar o Erick ano passado, no Brasil, porque ele cometeu uma imprudência. Não podia parar a luta com o Wanderlei porque tenho ética, aprendi a ética com os mestres – diz Mario.

Anfitrião no encontro, Minotauro afirma confiar na decisão dos árbitros do UFC ao longo das evoluções pelas quais passou o evento.
- O UFC mudou um pouco, mas a maneira de pensar é a mesma, eles veem a luta, a arte marcial. São dois faixas pretas e veem da mesma maneira. É com honra que a gente vê essas duas gerações de árbitros – diz o peso-pesado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário