terça-feira, 8 de julho de 2014

De Pelé a Ronaldo, abalos marcam a trajetória do Brasil em Copas: relembre

Fratura do craque Neymar é o mais novo drama da Seleção ao longo de 20 edições do Mundial. Em alguns casos, como em 1962 e 2002, superação levou ao título

Por Belo Horizonte
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Neymar contusão brasil e Colombia arena Castelão (Foto: Agência Reuters)Neymar se contorce de dor após joelhada de Zúñiga: mais um drama na história (Foto: Agência Reuters)
O Brasil ficou em choque com a notícia de que Neymar está fora da Copa do Mundo. Minutos depois da suada classificação contra a Colômbia para as semifinais, não houve sequer tempo de comemorar. Mais do que a parte técnica, a seleção brasileira havia acabado de perder sua referência dentro e fora dos gramados. É difícil mensurar a representatividade do camisa 10 para o time de Felipão. Um baque emocional. Um abalo.

Apesar de chocante, a lesão de Neymar não é o primeiro grande trauma que a seleção brasileira sofre às vésperas ou durante Copas do Mundo. Alguns chegam a ser apontados como motivos de eliminações. O pênalti desperdiçado por Zico, em 1986, e a convulsão de Ronaldo horas antes da final da Copa da França, em 1998, são exemplos.
Por vezes, no entanto, o Brasil conseguiu superar os problemas e imprevistos, sagrando-se campeão em seguida. Foi assim quando perdeu o capitão Emerson na véspera da estreia na Copa de 2002 ou, em caso semelhante ao de Neymar, quando Pelé sofreu uma lesão e ficou fora do Mundial de 1962, no Chile.
O fato é que as lágrimas de Neymar, o craque na ambulância, e as imagens dele deixando a Granja Comary imobilizado em um helicóptero potencializam ainda mais o cenário dramático. O Brasil chorou e sofreu com seu ídolo, que não terá mais a chance única de jogar uma final de Copa do Mundo no Maracanã, seu "quintal de casa", como o próprio definiu. Salvo uma grande falha individual, a lesão do camisa 10 dificilmente deixará de ser apontada como a principal responsável em caso de derrota para a Alemanha, nesta terça-feira, no Mineirão - a TV Globo, o SporTV e o GloboEsporte.com transmitem ao vivo, e o site acompanha também em Tempo Real.
A seleção brasileira, no entanto, tem exemplos de outras gerações. Quando tudo parecia perdido, o Brasil trilhou um caminho diferente, muitas vezes o oposto do que era esperado, mas chegou ao título mundial.  Basta se espelhar nos craques do passado.
1962 - a lesão de pelé
Aos 21 anos, Pelé chegou ao Chile, em 1962, como o dono da bola. Campeão mundial em 1958, era o camisa 10 e principal jogador da Seleção. No entanto, na segunda partida do Brasil, contra a antiga Tchecoslováquia, o Rei sofreu um estiramento muscular que o impediu de voltar aos gramados durante a Copa.
O trauma, no entanto, começou a ser desfeito já na partida seguinte. Amarildo, atacante do Botafogo bem menos badalado que Pelé, encaixou como uma luva na equipe. Já no jogo seguinte, o Possesso marcou os dois gols do triunfo sobre a Espanha e classificou o Brasil para as quartas de final.
Com grandes atuações ao lado Garrincha, seu companheiro de ataque também no Botafogo, Amarildo foi um dos protagonistas na conquista do bi. Na final, novamente contra os tchecos, ele voltou a deixar sua marca.
1986 - indisciplina na véspera do embarque
Às vésperas do embarque para o México, Renato Gaúcho e Leandro ignoraram o horário da reapresentação e estenderam a noitada. O atacante foi sumariamente cortado, mas o lateral, perdoado. No dia da viagem, Leandro não apareceu no aeroporto Internacional do Rio de Janeiro. Abalado com o desligamento do amigo, ele decidiu não disputar a Copa de 1986 em solidariedade a Renato.
Ao serem alertados sobre a vontade de Leandro, Zico e Júnior deixaram o aeroporto e foram até a casa do amigo. Irredutível, o lateral bateu o pé e não viajou. Sentia-se culpado pelo corte de Renato e também não gostava mais de atuar em sua posição de origem, uma vez que já exercia a função de zagueiro no Flamengo. O camisa 10 deixou a casa de Leandro com os olhos inchados e admitiu ter chorado na conversa.
Sem Leandro, Josimar, do Botafogo, foi convocado. Pouco badalado, o lateral surpreendeu e ganhou a posição de Edson na terceira partida. Fez golaços gols contra Irlanda do Norte e Polônia, sendo um dos destaques do Brasil no México.
1986 - triste despedida de zico
Melhor jogador brasileiro da década de 80, Zico lutou muito para disputar sua última Copa, em 1986. Por causa de uma desleal entrada de Márcio Nunes, em uma partida contra o Bangu, o Galinho teve que se desdobrar para acelerar a recuperação a tempo de embarcar para o México. O próprio craque reconhece que não se sentia pronto para disputar o Mundial, mas topou o desafio pela insistência do técnico Telê Santana. Talvez, pelo desejo de compensar a dolorida eliminação de 1982.
Zico recebeu a camisa 10, mas não foi titular. Sem condições, não disputou sequer um minuto dos dois primeiros jogos. Ainda não estava bem. Nas partidas contra Irlanda do Norte e Polônia, esta pelas oitavas de final, entrou por alguns minutos quando a vitória já estava encaminhada.
O jogo-chave, porém, foi em 21 de junho de 1986: Brasil x França no Estádio Jalisco, em Guadalajara, no México. Debaixo de muito sol e calor, o jogo era tenso e equilibrado. A Seleção saiu logo na frente, com um gol de Careca, mas desperdiçou várias chances em seguida e não soube matar a partida. Michel Platini empatou ainda na etapa inicial.
Aos 25 minutos do segundo tempo, Zico entrou para mudar a história do jogo. Com dois minutos em campo, o camisa 10 fez um lançamento longo para Branco. O lateral entrou na área e foi derrubado por Bats. Pênalti que Zico bateu, e o goleiro defendeu.
A partida foi para a prorrogação. Ninguém mais fez gol, e a decisão ficou para a disputa de pênaltis. Zico marcou na série, mas Sócrates e Júlio César erraram. O Brasil deu adeus nas quartas de final e, de casa, viu a Argentina, comandada por Maradona, sagrar-se bicampeã mundial.
1994 - cotovelada de leonardo
O desafio já não era fácil. Apesar da pouca tradição no futebol, a seleção dos Estados Unidos estava arrumada e fazia uma boa Copa do Mundo. Jogando em casa, debaixo de um sol escaldante, no Stanford Stadium, na California, os americanos queriam construir sua história no "soccer" naquele 4 de julho de 1994, dia da independência do país.
A mobilização no país era grande e, apesar de o Brasil ser favorito, os Estados Unidos criavam dificuldades. Foi então que, ainda no primeiro tempo, o lateral Leonardo acertou em cheio uma cotovelada no rosto de Tab Ramos. O brasileiro foi prontamente expulso, e a Seleção passou a jogar com dez. O que já estava complicado ficou ainda mais difícil.
A salvação do Brasil se deu na etapa final. Com a dupla de ataque afiada, a Seleção construiu a vitória por 1 a 0 após grande jogada de Romário para o gol de Bebeto. Dias depois, a Fifa anunciou a punição de quatro jogos de suspensão para Leonardo, o que o deixou fora do restante da Copa.
A perda foi grande, mas o destino voltou a ser generoso dessa vez. Muito criticado antes da Copa, Branco assumiu a titularidade e marcou, em cobrança de falta, o gol que selou a difícil vitória por 3 a 2 sobre a Holanda, nas quartas de final, depois de a Seleção abrir 2 a 0 e ceder o empate. No fim, depois de passar por Suécia e Itália, o Brasil voltou a conquistar um título mundial após 24 anos de espera.
1998 - o corte do baixinho

A seleção brasileira chegou à Copa do Mundo de 1998 com uma certeza: o time seria Romário, Ronaldo e mais nove. Nas vezes que esteve em campo, a dupla Rô-Rô encantou com gols. A junção do herói do Mundial anterior com o novo fenômeno do futebol mundial tinha tudo para dar certo. Tinha...
Romário se apresentou à Seleção com uma lesão na panturrilha, sentida em uma partida do Flamengo contra o Friburguense, no Campeonato Carioca. Em um primeiro momento, o problema não preocupava. O Baixinho, porém, ficou fora do amistoso de preparação contra o Athletic Bilbao. Novos exames foram realizados para saber o motivo da demora da cicatrização da lesão, e os médicos diagnosticaram algo mais grave: o jogador precisaria de um mês de recuperação.
O anúncio do corte foi feito pelo médico Lídio Toledo, pelo coordenador técnico Zico e pelo treinador Zagallo, que chamou o volante Emerson para a vaga do camisa 11. Em seguida, Romário concedeu entrevista coletiva. Visivelmente contrariado, o Baixinho chorou, afirmou que seu corte faria muita gente feliz dentro da Seleção e disse que seu ciclo com a camisa amarela não estava encerrado.
Apesar do corte de um de seus principais jogadores, a Seleção não se abalou e chegou à decisão da Copa de 1998, quando o novo trauma, esse sim apontado como vilão da derrota, ocorreria...
1998 - o drama de ronaldo

A derrota na final da Copa de 1998 é creditada a outro fato. Horas antes da decisão contra a França, os jogadores descansavam em seus quartos após o almoço, quando Ronaldo, enquanto dormia, teve uma crise nervosa. De acordo com o médico da CBF na ocasião, Lídio Toledo, o craque sofreu uma convulsão.

Companheiro de quarto do Fenômeno, Roberto Carlos presenciou a cena e gritou pelos companheiros no corredor do hotel. César Sampaio, Leonardo e Edmundo foram os primeiros a chegar. Após o primeiro atendimento, o atacante voltou a dormir.
Quando acordou, Ronaldo foi alertado sobre o que havia acontecido e seguiu com os médicos para uma clínica em Paris. O assunto ainda não havia vazado para os jornalistas. Tanto que quando a Fifa divulgou as escalações houve um choque: Edmundo estava escalado no lugar de Ronaldo, então o melhor jogador do mundo.
A correria foi grande para conseguir informações. Todas, porém, desencontradas. Enquanto isso, Ronaldo passava por uma bateria de exames clínicos e neurológicos. Nada grave foi diagnosticado. O Fenômeno queria jogar.
Com Edmundo escalado para a final, Ronaldo chegou ao vestiário do Stade de France se dizendo pronto para a partida. Houve uma indecisão, mas, após conversar com o atacante, Zagallo decidiu escalá-lo. Em campo, o que se viu foi um Brasil apático, e um baile da França, que conquistou sua primeira Copa com uma vitória por 3 a 0. Diversas teorias de conspiração foram ligadas ao caso - nenhuma nunca foi comprovada.
2002 - capitão fora
Era para ser apenas um treino de reconhecimento, no Estádio Munsu, em Ulsan, na Coreia do Sul. Em 2 de junho, véspera da estreia do Brasil na Copa do Mundo de 2002, os jogadores realizavam o popular "rachão". Não havia mais ajustes a serem feitos. Estava tudo pronto para a partida contra a Turquia no dia seguinte. Tanto que os goleiros jogavam na linha, enquanto jogadores se arriscavam no gol.
O problema se deu aí. Ao tentar defender um chute de Rivaldo, Emerson, que fazia as vezes de goleiro no recreativo, saltou, mas caiu de mau jeito, sobre o braço. Todos logo perceberam a gravidade do lance. O capitão da seleção brasileira havia sofrido uma luxação no ombro direito.
A Seleção deixou o estádio cabisbaixa, mas o corte ainda não havia sido oficializado. Afinal, uma troca de jogadores, a 24 horas da estreia, dependia do aval da Fifa. De volta à concentração, o médico José Luiz Runco concedeu uma entrevista coletiva improvisada para anunciar o desligamento de Emerson. Nomes como César Sampaio, Juninho Pernambucano e Mauro Silva foram especulados pelos jornalistas. O mistério, porém, durou pouco. Minutos depois, com o aval da Fifa, Ricardinho, que nunca havia recebido chances com Felipão, foi convocado.
O resto da história é bastante conhecido. Gilberto Silva herdou a titularidade, o Brasil não se abalou com a perda de Emerson, e Cafu assumiu a braçadeira de capitão. Após sete jogos e sete vitórias, a seleção brasileira conquistou o penta em 2002.

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