segunda-feira, 25 de julho de 2016

Depois do TUF: Luiz Besouro se vira entre família, treinos e ponto de moto

Lutador peso-meio-médio pode se dedicar mais ao MMA após passagem pelo UFC, mas ainda se desdobra para cuidar dos filhos, treinar e administrar cooperativa

Por Rio de Janeiro

Quem passa pela Rua Cândido Mendes, na Glória, Zona Sul do Rio de Janeiro, e pega um mototáxi para subir ao tradicional bairro de Santa Teresa não imagina que pode subir na garupa de um lutador de MMA. Pois foi o que aconteceu por alguns anos, até 2013, quando Luiz Jorge Dutra Jr, o Luiz Besouro, pilotou uma das motos da Cooperativa Santur Express. O atleta peso-meio-médio largou a função de motoqueiro após entrar na segunda temporada do reality show The Ultimate Fighter Brasil, em 2013, e assinar um contrato com o UFC. Cortado pela organização há um ano, Besouro voltou parcialmente à rotina pré-fama: não faz mais transporte de passageiros, mas ainda dedica alguns horários para ajudar a administrar a cooperativa.
- Parece uma cooperativa de táxis. Nossa profissão não é regulamentada, então estamos procurando estar o mais próximo possível de alguma regulamentação e organização para oferecer serviço melhor e ter crédito junto à população. Tenho título de mototáxi. Somos 22 mototáxis, tem telefone, CNPJ, tem presidente, diretores, e tenho uma vaga, onde alugo e já me ajuda financeiramente. Minha moto está lá, vai continuar comigo porque é um símbolo de toda minha luta, toda minha trajetória. Passei muitos anos ali, trabalhando, aquilo foi meu sustento - conta Besouro, durante uma tarde no ponto.
Luiz Besouro, TUF Brasil, MMA (Foto: Adriano Albuquerque)Luiz Besouro tem sua camisa do TUF Brasil 2 enquadrada em sua casa no Rio de Janeiro (Foto: Adriano Albuquerque)
Quando entrou no TUF Brasil, a vida de Luiz Besouro mudou... Mas nem tanto. Hoje, o lutador carioca, de 34 anos, mora numa casa um pouco melhor, pode se dedicar quase que integralmente aos treinos e não pilota mais o mototáxi. Porém, fora do UFC, o atleta perdeu alguns patrocinadores, segue "ralando" com aulas particulares, as demandas da cooperativa e os cuidados com a família, continua morando na comunidade. O Combate.comacompanhou um dia no seu cotidiano e viu que Besouro, outrora parado constantemente para fotos e autógrafos e reconhecido como lutador do Ultimate, voltou a ser apenas o Luiz Jorge nas ruas, querido e admirado pelos colegas e amigos, mas cheio de vontade de fazer valer os últimos anos de seu auge físico e conquistar títulos no MMA (Veja no vídeo acima o cotidiano de Besouro).
- Vi a grandiosidade que estava tomando (o MMA), a proporção do evento, o esporte como cresceu, acho que foi a partir dali que comecei a me tornar atleta mesmo. Até então, trabalhava como mototáxi, comia besteira pra caramba, (era) trabalhador normal, né? Eu era um motoboy que lutava, tinha uma diferença. Me desdobrava em 20 para ir à academia. Hoje em dia, não, tenho meu patrocinador, tenho minhas coisas, tenho médico, toda uma equipe por trás, fisioterapeuta, psicólogo, meu médico, meu preparador físico. Passei a me cuidar mais, fazer treinos inteligentes. Até então, eu era lutador, hoje sou atleta e lutador, tem uma diferença. Tem que se cuidar mais, não sou mais nenhum garoto, tenho 34 anos. Me programei, acho que tenho mais três anos de treino e luta dura. Quero me aposentar, tenho que fazer outras coisas ainda, e esses três anos estou me dedicando ao máximo que posso, fazendo tudo, e colhendo os frutos agora - explica.
Talvez Besouro não se desdobre mais em 20, mas ainda se divide em pelo menos três: o microempresário que investe no ponto de mototáxi, o lutador que treina diariamente na RFT e em outros pontos do Rio de Janeiro, e o homem de família, que tem quatro filhos - três dele, todos de mulheres diferentes, e um enteado. Este é sempre o primeiro a trabalhar: Besouro acorda cedo para arrumar Lucas, de oito anos, e Luiz Eduardo, de 10, para levá-los à escola. Os dois mais velhos - Luiz Guilherme, de 17, e Luiz Henrique, de 14 - são mais velhos e não moram com ele. No dia que o Combate.com acompanhou, apenas Lucas estava em casa, e o lutador fez as vezes de "paizão": deu café, arrumou a roupa, o cabelo, até escovou os dentes.
Luiz Besouro, ponto de mototáxi, TUF Brasil, UFC, MMA (Foto: Adriano Albuquerque)Luiz Besouro posa entre os amigos na cooperativa de mototáxi que ajuda a administrar (Foto: Adriano Albuquerque)
Depois de deixar o menino no colégio, é voltar ao Pereirão, na Zona Sul do Rio, pegar a moto e partir para a maratona de treinos. Besouro não está mais no UFC, mas está lutando na Ásia - venceu uma luta no Pancrase, no Japão, em março, e foi derrotado em junho, em ação pelo Rebel FC, na China. Na RFT, o peso-meio-médio é referência e ajuda o mestre Márcio Cromado a ensinar os demais atletas posições-chave. Ele se alterna entre a academia, onde faz a maioria de seus treinamentos, e a Lapa, onde faz sparring de boxe com seu mestre Careca. Para completar a renda, Besouro dá também algumas aulas particulares. Ele se considera abençoado por ainda manter patrocinadores que já tinha antes do TUF - a escola de samba Grande Rio e uma marca de roupas e acessórios esportivos - mas perdeu alguns apoiadores que havia juntado durante sua curta passagem pelo UFC.
- Eles visam o lucro. Logo na minha primeira cirurgia, vários correram. É um trabalho. Eu exponho a marca, eles me dão grana. Os únicos que mantenho relação afetiva são a Black Punch, que é de um amigo meu, e a Grande Rio, que é minha escola de coração. Se eles quiserem parar hoje, está válido, pois já me deram a honra, dignidade e respeito de pagar a pensão dos meus filhos, de ser um homem honrado, de caráter. Dinheiro não é tudo, mas eu não tinha condições de pagar o mínimo pros meus filhos, agora posso pagar o mínimo e um pouco mais.
Besouro ainda teve a sorte de ter passado pelo TUF Brasil, que o tornou conhecido pelo país inteiro. Na maior parte do dia, o lutador anda sossegado pela rua sem ser incomodado. Contudo, de vez em quando, um ou outro transeunte o reconhece e o cumprimenta. Para os amigos, Besouro é um ídolo, que manteve a cabeça no lugar mesmo com a breve fama. No horário de almoço, ele é celebrado e alvo de brincadeiras por parte de garçons. Quando passa no ponto de mototáxi, encontra amigos e admiradores, muitos deles também praticantes de artes marciais, que erguem uma faixa de apoio no local sempre que ele tem uma luta marcada e se juntam para assisti-la, mesmo quando precisam vasculhar a internet por um link de streaming.
Luiz Besouro, TUF Brasil, MMA, RFT (Foto: Adriano Albuquerque)Besouro descansa durante sessão de treino na RFT: lutador quer dar o gás nos últimos anos da carreira (Foto: Adriano Albuquerque)
- Nós marcamos um local para todo mundo se reunir para ver a luta dele. É difícil reunir todo mundo, mas o grupo se junta. Isso é amigo, vale a pena estar torcendo pelo amigo, e são poucos que crescem até certo ponto. E pelo visto, ele ainda vai crescer mais ainda. Ele botou a cara. As pessoas às vezes esquecem o que foram um dia. Elas são o que são hoje em dia porque correram atrás para ser. Tem pessoas que se escondem atrás disso, inventam coisas. Ele botou a cara, "sou isso", pronto, acabou. O que importa é o cara que ele é hoje em dia: Besouro! - diz um amigo da cooperativa.
Pelo menos no momento imediato, outros lutadores brasileiros que sonhem se livrar do trabalho em meio expediente para se dedicar integralmente ao MMA não têm mais o TUF Brasil como saída. O programa, exibido pela Rede Globo entre 2012 e 2015, revelou uma série de lutadores que ainda está no UFC, como Cézar Mutante, Serginho Moraes, Rony Jason, Léo Santos, Thiago Marreta, entre outros. Contudo, a audiência do reality caiu nas duas últimas temporadas, e, apesar de o UFC manter negociações para que o programa retorne na TV a cabo, o TUF Brasil provavelmente não terá uma nova edição em 2016.
Luiz Besouro, contudo, garante que é possível viver de MMA fora do UFC, e torce para que cada vez mais opções surjam no mercado para os lutadores.
- Dá sim. Tenho minha casinha, meu carrinho, minha "motinha", pago minhas contas em dia, não devo nada a ninguém. Dou o necessário para minha mulher e estou batalhando para dar muito mais. Não pode é desistir. O UFC não é maior que o MMA. O UFC foi de bom grado, mas foi o Pride que deu essa alavancada no esporte. O Pride, na época, era muito mais conhecido que o UFC, que inclusive cedeu atletas para competir lá. Existem outros eventos grandes fora, como o Bellator e o Pancrase, existem dois eventos gigantescos na Europa como o Akhmat e o KSW, que está dando um show e paga muito bem. Tem o One Championship na Ásia, o Rizin, que é o antigo Pride e voltou com força total. O Bellator está dando um show, em termos de público, de evento, e bolsa. A tendência é o esporte crescer. Rezo a Deus para que o UFC se mantenha no mesmo padrão, e que os outros eventos alcancem o mesmo padrão para termos um show muito maior - analisou o lutador.

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