sexta-feira, 31 de julho de 2015

Britânico rebate brasucas sobre lobby: "Eles não têm mais vantagem na Baía"

Nick Dempsey afirma que raia de 2016 é a mais poluída em que já competiu, mas diz que prefere manter disputa na Guanabara. Campanha pró-Búzios divide velejadores

Por Rio de Janeiro
Nick Dempsey (Foto: Getty Images)Nick Dempsey critica qualidade da água, mas quer velejar na Baía de Guanabara (Foto: Getty Images)
Cada divulgação de estudos sobre a poluição na Baía de Guanabara significa uma nova sabatina para os atletas. Os temas das entrevistas deixam de ser sobre a preparação, as expectativas por resultados e passam a ser dominados por análises do palco da vela nos Jogos de 2016. Se os brasileiros de modo geral veem o lobby estrangeiro para levar a competição para mar aberto ou até para Búzios como uma estratégia técnica, um astro britânico afirma que, apesar de a Baía ser o lugar mais sujo em que já velejou, prefere que a disputa seja mantida onde está. Para Nick Dempsey, a vantagem dos anfitriões na Guanabara é coisa do passado. 
Bicampeão mundial e prata em Londres 2012 na classe RS:X, Dempsey veio velejar no Brasil pela primeira vez há dez anos. Desde então, soma 10 viagens ao país, seja para treinar ou competir. Nesta reta final para os Jogos de 2016, os intercâmbios passaram a acontecer três vezes por ano. Como o British Sailing Team vem sempre com equipe completa, com meteorologistas e estudiosos de marés e correntes, a equipe acumulou um grande banco de dados para munir seus atletas com o maior número de informações possíveis. 
Apesar de Federação Britânica ser apontada como uma das que fizeram lobby junto à Federação Internacional de Vela (Isaf, na sigla em inglês) para retirar a competição da Baía, o britânico não vê nenhuma intenção além da preocupação com a poluição. Ele acredita que essa bagagem adquirida tanto pela coleta de dados quanto pelos treinos in loco põe seu país em patamar de igualdade com os brasileiros. 
- É uma bobagem (que os estrangeiros queiram tirar a competição da Baía por razões que não sejam a poluição). Os brasileiros não têm mais vantagem dentro da Baía. Talvez tivessem da primeira vez que viemos, mas não mais. Posso falar pelo time britânico. Estamos há muito tempo aprendendo sobre as correntes e os ventos, temos uma estrutura muito boa. Não acredito que os brasileiros tenham essa vantagem recentemente. Estamos velejando cada vez melhor. Prefiro competir na Baía. As Olimpíadas são no Rio, e se há onde velejar no Rio, devemos velejar no Rio.  
Nick Dempsey Vela (Foto: Getty Images)Dempsey revela cuidados: não mergulha nem abre a boca quando está na Baía (Foto: Getty Images)
Apesar da confiança no domínio do mar, Dempsey admite que todos os britânicos seguem uma espécie de cartilha para evitar eventuais contaminações. Mesmo assim, não se intimida com a sujeira. 
- Está poluído, não há nada que se possa fazer agora. Nunca velejei em um lugar mais poluído, mas também não tenho medo. Eu não me sinto inseguro. Todos tomamos precauções, lavamos nossas roupas assim que saímos da água. Nós não mergulhamos e mantemos nossas bocas fechadas, lavamos tudo, fazemos o possível para nos mantermos saudáveis. Há preocupação sobre a Baía, então fazemos o possível para nos mantermos limpos e higiênicos.  
POSSIBILIDADE DE LEVAR A VELA PARA BÚZIOS DIVIDE ATLETAS
Recém-sagrada bicampeã pan-americana, Patrícia Freitas treina atualmente em Búzios e acompanha o movimento que a Associação de Hotéis, a Associação Comercial e o Convention Bureau de Búzios estão fazendo para tentar receber a disputa da vela. Apesar de morar na cidade, a velejadora da classe RS:X prefere que a competição seja mantida na Baía de Guanabara e lista motivos que transcendem a qualidade das regatas.
Patrícia Freitas ganhou medalha de ouro na classe RS:x (Foto: Nathan Denette/Canadian Press via AP)Patrícia Freitas é bicampeã pan-americana (Foto: Nathan Denette/Canadian Press via AP)
- Prefiro mil vezes que fique aqui (na Baía). Já estou acostumada com a Baía, conheço como a palma da minha mão. E é a primeira vez em muito tempo que a vela vai ficar na mesma cidade sede dos Jogos, e é um prestígio que a gente não pode abrir mão. Toda a equipe de mídia que vai acompanhar, estar na atmosfera olímpica, isso não tem preço.
Sem conhecer pessoalmente nenhum atleta que tenha ficado doente por causa da qualidade da água, Paty garante que a percepção dos atletas em geral sobre a Baía não é tão ruim quanto a imprensa retrata: 
- Todos lastimam a qualidade da água, mas ninguém fica revoltado, não existe esse estardalhaço todo entre os atletas. Nunca ninguém reclamou, os gringos adoram velejar aqui. Existe um certo sensacionalismo da parte da mídia. Existem duas coisas. A água está suja, é nojenta, deveriam ter tomado uma atitude. Outra coisa é trazer esse conflito para dentro das Olimpíadas. Isso não vai acontecer. A gente não vai sofrer por causa da água. É suja, nojenta, mas não vai atrapalhar as Olimpíadas. Os velejadores de modo geral adoram, o visual é incrível, adoram a geografia, as montanhas...
O espanhol Iván Pastor concorda com a brasileira sobre as boas condições gerais de navegabilidade, mas suas experiências na Guanabara o fazem acreditar que competir em Búzios seria melhor. Ex-companheiro de treinos de Ricardo Winicki, o Bimba, na Região dos Lagos do estado, ele afirma ter pegado uma infecção após um período de treinos no Rio de Janeiro em 2013 e relata um acidente com um tapete há duas semanas.
Ivan Pastor Vela (Foto: Getty Images)Iván Pastor gosta de velejar na Baía, mas teme que poluição prejudique disputas olímpicas (Foto: Getty Images)
- Eu acho a raia da Baía muito boa, tem muito jogo de correntes, os ventos são melhores do que fora. Mas que tem poluição, tem. Fiquei muito tempo treinando no Brasil com o Bimba, e a gente acaba se acostumando. Mas na semana retrasada catapultei ao bater em um tapete, já aconteceram muitas vezes essas coisas comigo. Você não fica mais tão chateado depois de algum tempo, mas se acontecer nas Olimpíadas... Desculpa a palavra, mas vou ficar p... Esses anos aqui não tivemos tantos problemas, mas imagina se a gente pega uma infecção ano que vem? A gente está treinando por quatro anos, na verdade a vida inteira... Imagina ficar doente uma semana antes das Olimpíadas? Se a decisão coubesse a mim, eu iria para Búzios - disse Iván.
O programa dos Jogos de 2016 prevê cinco raias de competição para a vela: Ponte Rio-Niterói, Escola Naval, Niterói, Copacabana e Praia do Flamengo, local da medal race. Nesta quinta-feira, um estudo divulgado pela agência de notícias Associated Press afirmou que as águas na Marina da Glória, nas praias de Copacabana e Ipanema e na Lagoa Rodrigo de Freitas estão contaminadas por fezes humanas que ofereceriam ricos aos atletas de contraírem alguma doença e não poderem concluir as provas.
No entanto, para o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), os competidores estão seguros. Com exceção da Marina da Glória, o Inea garante que a qualidade da água está dentro dos padrões internacionais. Através de nota oficial, o Comitê Organizador Rio 2016 afirmou confiar nos padrões do Inea e garantiu que não há hipótese de tirar a competição da Baía de Guanabara.
NA PRÁTICA, BIMBA VAI MELHOR DO QUE DEMPSEY
Apesar do discurso de Nick Dempsey, o primeiro dia da disputa da classe RS:X na 28ª Semana Internacional de Vela do Rio de Janeiro teve Brasil na frente da Grã-Bretanha. Após um sétimo lugar na regata de abertura, Bimba venceu as duas provas seguintes e fechou o dia na segunda colocação geral com 9 pontos. O chinês Wang Alchen, com 8 pontos, ocupa o primeiro lugar, enquanto Iván Pastor está em terceiro. Dempsey chegou em 8°, 3° e 4° nas regatas e está em quinto no geral.
Bimba valorizou sua experiência na Baía e comemorou o resultado do que considera um "treino de luxo" após o Pan, mas sabe que não deve menosprezar o potencial do britânico.
- Realmente, os britânicos têm um investimento e estudo da Baía impressionantes. Não só eles, mas holandeses, franceses. Mas no papel é uma coisa e velejando é outra. Esse resultado, na verdade, não significa nada. No último campeonato aqui, um inglês ganhou. Ninguém vai se esforçar, dar o máximo. Não sei o material que ele (Dempsey) está usando, mas o meu é o terceiro reserva. Não teve nada especial, mas sempre tira da manga uma pranchinha. Tem que respeitar o investimento dele. Recentemente, a Confederação de Vela tinha três botes, enquanto os ingleses tinham 75 - afirmou Bimba.
No feminino, Paty Freitas somou 10°, 8° e 20° lugares nas três regatas, fechando o dia na 13a colocação geral. Em primeiro está a britânica Isobel Hamilton, que venceu duas das três provas e soma 8 pontos. As chinesas Chen Pei e Sun Jiali estão em segundo e terceiro lugares, respectivamente.

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